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O sonho do diploma

Unip. Uniban. Uni SantAnna. Uninove. Quem mora hoje na região da Vila Guilherme, bairro da zona norte de São Paulo, é atendido por todas essas escolas em cursos de graduação. Em diversas cidades do país, universidades convocando alunos para o vestibular disputam espaço em outdoors e comerciais de TV. No Rio de Janeiro, ficou famosa […]

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h51.

Unip. Uniban. Uni SantAnna. Uninove. Quem mora hoje na região da Vila Guilherme, bairro da zona norte de São Paulo, é atendido por todas essas escolas em cursos de graduação. Em diversas cidades do país, universidades convocando alunos para o vestibular disputam espaço em outdoors e comerciais de TV. No Rio de Janeiro, ficou famosa a guerra de preços entre duas faculdades, a Estácio de Sá e a Universidade Salgado de Oliveira. Ambas -- e também a Unip, do empresário paulista João Carlos Di Genio, fundador do Objetivo -- estão entre as faculdades que mais crescem no Nordeste do Brasil. (A Unip é a maior universidade privada do país, com 85 000 alunos e faturamento de 472 milhões de reais em 2001.) Outros sistemas de ensino também aderiram à criação de faculdades. O COC, de Ribeirão Preto, por exemplo, cultiva um marketing agressivo e divulga sua marca na camisa dos jogadores do COC Ribeirão, vencedor do campeonato paulista de basquete em 2001.

Em 1985, existiam 859 instituições de ensino superior no Brasil. Em 2000, eram 1 180, 60% delas privadas. O número de cursos oferecidos nesse período aumentou 170%. A explosão da oferta aconteceu com a chegada de novos alunos e regras mais flexíveis de abertura de cursos. "Apareceu um pouco de tudo, de escolas boas às de perfil duvidoso", diz Nilson Curti, superintendente do COC. "O resultado é que o próprio mercado passará por uma espécie de seleção natural nos próximos anos." Espera-se que essa seleção seja acelerada, em boa medida, por uma corrida pela qualidade. Um sinal de que poderá ser esse o caminho é que as notas no Exame Nacional de Cursos, o Provão, já se transformaram em peça fundamental no marketing das faculdades pagas. "Ao contrário do que muita gente pensa, a qualidade do ensino superior brasileiro não está piorando por causa da expansão", diz o economista Claudio de Moura Castro, um dos maiores especialistas brasileiros na matéria. "Uma demonstração disso é que os cursos que aparecem pela primeira vez no Provão têm nota acima da média. Quem está entrando no mercado vê que ele está mais competitivo e profissional."

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A expansão está trazendo novidades e desafios para a educação superior. "É aí que tudo está acontecendo, de novas regulamentações a mudanças no perfil dos investidores", diz Oliver Mizne, analista da Ideal Invest. Formado em administração de empresas pela Wharton School, nos Estados Unidos, Mizne criou em 1999 uma área para investimentos de private equity em educação no banco Credit Suisse First Boston Garantia. Trabalhou com Gustavo Borges, engenheiro mecatrônico formado pela USP e com passagem pela Mercedes-Benz. "O projeto avançou pouco porque os valores pedidos nas escolas eram pequenos para o porte do CSFB", diz uma fonte do banco. Há sete meses, Mizne e Borges deixaram o banco para criar a Ideal Invest com outros três colegas. Ambição da turma: provar que investimentos em educação podem ser economicamente atrativos como os de qualquer outro setor. "Queremos criar uma sistemática que, no futuro, leve o capital naturalmente para instituições de ensino", diz Mizne.

A Ideal Invest presta assessoria de gestão a escolas de médio e grande portes e está envolvida em alguns projetos de capital em busca de escola -- ou vice-versa. O fundo TMG Capital Partners, que tem investimentos em saúde e telemarketing, também está atento ao setor. A Investidor Profissional, empresa carioca de administração de recursos, quer investir em empresas de educação que se beneficiam da internet. "É possível que essas experiências estejam um pouco à frente do nosso tempo, mas não tenho dúvida de que caminhamos para isso", diz o ministro Paulo Renato. O obstáculo que esses investidores terão de enfrentar pode ser resumido numa palavra: gestão. As instituições de ensino no país sempre foram operadas mais por educadores-empresários do que por empresários-educadores. "Hoje é praticamente impossível achar um exemplo de governança que encha os olhos", diz o economista Claudio Haddad, ex-Banco Garantia e sócio do Ibmec, escola de negócios sediada em São Paulo. "Profissionalização é fundamental. Simplesmente não vai dar para atender a demanda que vem por aí com o modelo antigo."

Esse é um dos motivos pelos quais o Pitágoras se transformou na grande vedete do momento. Mares Guia foi o primeiro empresário brasileiro a aplicar ao ensino uma lógica empresarial corriqueira nos mais diversos setores da economia: buscar um sócio estratégico para expandir e perpetuar seu negócio. Ele também está sendo o primeiro a apostar no que os especialistas definem como o grande nicho da educação hoje no Brasil: ensino superior, com foco na qualidade, para a massa. "Trata-se de um modelo promissor", diz o ministro Paulo Renato.

A descrição do modelo proposto pelo Pitágoras com a Apollo International pode render horas de conversa com o economista Moura Castro. Entusiasta da universalização do acesso ao ensino, é ele a cabeça por trás do projeto pedagógico. Moura Castro estava em Washington, como assessor-chefe para educação do Banco Interamericano para o Desenvolvimento (BID), quando recebeu o convite de Mares Guia para bolar algo novo no Brasil. "Comecei como consultor, visitando escolas nos Estados Unidos", diz Moura Castro. Hoje ele é presidente do conselho consultivo das Faculdades Pitágoras. Também fazem parte do conselho, entre outros, o economista Edmar Bacha, consultor do banco BBA, Rinaldo Campos Soares, presidente da Usiminas, e Ivan Moura Campos, Ph.D. em ciência da computação e ex-pró-reitor de pós-graduação da UFMG.

"Existem hoje duas tendências fortes e contraditórias no Brasil", afirma Moura Castro. "Uma, por diploma. A outra, nova, por competência. É esta que vamos atacar." Em suas andanças pelos Estados Unidos, ele encontrou dois modelos de inspiração: o Middlebury College, uma pequena escola de elite no estado de Vermont, e a Universidade de Phoenix, maior e mais polêmico negócio do grupo Apollo. O Middlebury, com seu campus bucólico, é uma escola no estilo batizado de liberal arts. Tem um currículo denso em literatura inglesa, história, filosofia e ciências políticas. A Phoenix, com suas salas de aula em edifícios comerciais, está voltada para o mercado de trabalho e para o aprimoramento profissional dos alunos. Para ser aceitos, eles precisam ter no mínimo 23 anos de idade e estar empregados.

O projeto do Pitágoras procura unir um pouco desses dois mundos. Os dois primeiros anos do curso na faculdade tratam do desenvolvimento de habilidades básicas, como comunicação oral e escrita, e do estudo de livros clássicos. O currículo dos dois anos seguintes é profissionalizante, com foco na formação específica. As disciplinas práticas, ligadas ao universo da administração de empresas, serão dadas por professores com experiência no mercado de trabalho.

O desafio do Pitágoras é expandir esse modelo levando em consideração a existência de uma enorme concorrência e o fato de que os alunos que estão chegando ao ensino superior têm renda mais baixa. É principalmente nesse ponto que o grupo pretende se espelhar no modelo da Universidade de Phoenix. O grande diferencial da Phoenix em relação às outras escolas americanas é a padronização do ensino. Seus cursos são feitos por uma equipe central que cuida do planejamento de cada disciplina nos mínimos detalhes. Os professores são treinados para transmitir esse conhecimento da forma mais uniforme possível -- uma aula sobre finanças será a mesma em Milwaukee e em San Diego -- de acordo com padrões rígidos de controle da qualidade.

O Pitágoras resolveu entregar a tarefa de criação de seus cursos a uma equipe de notáveis. Dela fazem parte o escritor Affonso Romano de SantAnna e o historiador José Murillo de Carvalho. "O modelo altamente sistematizado permite expandir o negócio com qualidade e com o custo mais baixo possível", diz Klor de Alva. O investimento inicial do programa, que é alto, não precisa ser refeito cada vez que uma nova faculdade é aberta. E a padronização das aulas não limita a estratégia à oferta de professores de altíssimo nível, que dificilmente seriam encontrados em cantos remotos do país.

O projeto ainda está no início. Atualmente a faculdade tem 680 alunos, cerca de 50 em Curitiba, cidade onde o ensino é praticamente dominado pelo grupo Positivo, e o restante em Belo Horizonte. A meta é chegar a 100 000 alunos em 50 campi até 2010. O foco são cidades de aproximadamente 200 000 habitantes com uma renda média capaz de suportar anuidades de cerca de 4 000 reais.

Em São Paulo, famílias de 526 alunos desembolsam, todo mês, 1 320 reais nos cursos de graduação em administração de empresas e economia do Ibmec. A escola é reconhecida como uma butique de excelência. Muitos de seus professores têm Ph.D. e dedicação exclusiva à escola. Esse é um modelo que não permite escala, muito mais para Middlebury do que para Phoenix. Há cerca de dois anos, porém, o economista Paulo Guedes, sócio de Haddad e colunista de EXAME, resolveu apostar também na educação de massa. Desde então, Guedes vem se dedicando a dar forma ao Instituto Brasileiro de Tecnologia Educacional (Ibtec), que deverá ser lançado em junho deste ano. O Ibtec será uma consultoria que vai vender o know-how de gestão e a qualidade pedagógica do Ibmec para outras instituições de ensino. "Elas pagarão um percentual da mensalidade dos alunos para ter acesso a nosso conteúdo, material didático, programa de treinamento e de avaliação de professores", diz Guedes.

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