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Iraque: discurso de Blix na ONU amplia fosso entre EUA e Europa

Dólar que sobe, bolsa que cai, pressão sobre o juros. Tudo isso é certo. Mas, depois da apresentação dos inspetores das Nações Unidas ao Conselho de Segurança realizada nesta sexta-feira (14/2), ainda há três dúvidas no ar. Primeira: ainda dá para evitar uma guerra dos Estados Unidos e seus aliados contra o Iraque? Segunda: em […]

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h44.

Dólar que sobe, bolsa que cai, pressão sobre o juros. Tudo isso é certo. Mas, depois da apresentação dos inspetores das Nações Unidas ao Conselho de Segurança realizada nesta sexta-feira (14/2), ainda há três dúvidas no ar. Primeira: ainda dá para evitar uma guerra dos Estados Unidos e seus aliados contra o Iraque? Segunda: em caso negativo, que alcance terá o conflito para a aliança dos países do Ocidente, tão dividido diante da questão? Terceira: qual pode ser o impacto de uma possível guerra sobre os países periféricos como o Brasil?

A resposta à primeira questão passa menos pela possibilidade de uma decisão mais dura do Conselho de Segurança do que pela pura e simples vontade dos Estados Unidos de atacar. Em sua apresentação na ONU no início do mês, o secretário de Estado americano, Colin Powell, exibiu fotos de satélite sugerindo que o Iraque havia esvaziado 30 instalações que produziam armas químicas antes da chegada dos inspetores. Além disso, ele acusou Bagdá de manter laboratórios móveis, armazéns de gases de nervos (como o VX) e laços com a rede terrorista Al-Qaeda.

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Coincidência ou não, a rede de televisão Al-Jazeera, do Catar, levou ao ar esta semana um vídeo em que Osama bin Laden, o líder da Al-Qaeda, exortava muçulmanos de todo o mundo a lutar ao lado do regime de Saddam Hussein contra o inimigo americano. O governo dos Estados Unidos também acusa a rede terrorista de planejar dois ataques para breve, um em território americano e outro na Península Arábica. A CIA elevou esta semana o nível de alerta antiterrorista em território americano.

Por tudo isso, o governo dos Estados Unidos não parece disposto a recuar na decisão de ataque e já tem mais de 150 mil soldados no Golfo à espera da ordem do comandante supremo das Forças Armadas, o presidente George W. Bush. Inglaterra e outros aliados incondicionais têm outros 50 mil homens na região. Só que ainda falta o pretexto para o ataque. E a apresentação em cima do muro do inspetor-chefe da ONU, Hans Blix, não facilitou a vida dos partidários da guerra.

Blix afirmou não ter encontrado nenhum indício de armas de destruição em massa no Iraque, embora tenha informado que um dos mísseis iraquianos, o Al-Samoud 2, excede o alcance limite de 150 km imposto pelas sanções da ONU ao país. "Outra questão, e de grande significado, é que muitas armas banidas e outros itens não foram encontradas. Não se deve concluir que elas existam. Porém tal possibilidade não está excluída", disse Blix ao Conselho de Segurança. "Até hoje não encontramos evidência de atividades nucleares proibidas ou relacionadas no Iraque", afirmou Mohamed ElBaradei, chefe da Agência Internacional de Energia Atômica.

O que traz à tona a segunda questão: se os Estados Unidos resolverem atacar, até que ponto isso complicará ainda mais as já abaladas relações com França, Alemanha, China e Rússia _ países que, até o momento, têm adotado posições mais moderadas (tradução: contrárias) em relação a um ataque ao Iraque? O primeiro ponto a lembrar é que a oposição dos países europeus à guerra também faz parte de um cálculo político. Com manifestações antiguerra previstas para o fim de semana em quase todos os países da Europa (só em Londres são esperados 700 mil numa passeata), seria extremamente antipopular um alinhamento incondicional dos líderes europeus com as posições americanas.

Mas boa parte dos analistas acreditam que desta vez as divergências entre os aliados anglo-saxões e países amigos como França, Alemanha e Rússia traz um ingrediente de gravidade maior. Os líderes francês e alemão, Jacques Chirac e Gerhard Schröder, recentemente receberam o apoio do russo Vladimir Putin na insistência em que seja dado mais tempo aos inspetores da ONU. "Tudo está caindo aos pedaços", declarou o historiador e jornalista alemão Michael Stürmer ao The New York Times. Do tratado de Kyoto, para controlar a emissão de poluentes, ao conflito no Iraque, passando pela questão palestina e mesmo por fóruns mais civilizados como a Organização Mundial do Comércio, aumenta a distância entre as posições americanas e as franco-germânicas.

A questão não é meramente retórica. Desde o 11 de setembro, os Estados Unidos se vêem como uma nação ameaçada pelos terroristas. França e Alemanha, por sua vez, acreditam que os americanos se aproveitaram da ameaça oferecida pela Al-Qaeda para tentar ampliar sua esfera de influência pelo planeta. Primeiro, por meio de um teste estressante a instituições da Guerra Fria como Otan, ONU e a própria União Européia (cuja expansão de 15 para 25 países é posta em xeque pela divergência de seus membros). Segundo, pelo ataque sistemático a países opositores como Afeganistão ou Iraque. Daí a oposição franco-germânica ser também uma tentativa de manter um equilíbrio diplomático que se perdeu com o fim do mundo bipolar.

Por mais ridícula que seja a defesa insistente dos americanos de um ataque rápido, a resistência européia, agora também com apoio da China, acaba de criar um fosso na diplomacia mundial como não se via desde a queda do muro de Berlim. Se a ONU e a Otan não resistirem à tensão e à pressão americana, estará introduzido um fator de desestabilização global que pode gerar ainda mais tensão. Como, então, isso pode afetar o Brasil?

A posição oficial do governo brasileiro é bastante semelhante à de alguns países europeus: contrária à guerra, mas favorável desde que com o aval das Nações Unidas. Mas a questão central é que, havendo ou não guerra, os efeitos já se fazem sentir por aqui. O barril do petróleo do tipo Brent era cotado hoje (14/2) a 33 dólares e o do bruto a 37 dólares depois da apresentação dos inspetores no Conselho de Segurança da ONU. A alta do óleo já levou a sucessivos aumentos no preço dos combustíveis e se reflete nos índices de inflação. O dólar voltou a bater hoje o recorde de cotação este ano e fechou a 3,67 reais, numa alta de 4,12% só neste mês. E o Ibovespa fechou em queda de 0,26%, pouco acima dos 10 mil pontos. A maior parte dos analistas afirma que, na reunião da próxima semana, o Comitê de Política Monetária do Banco Central deverá aumentar mais uma vez os juros.

O humor dos mercados investidores, já não muito entusiasmado com países emergentes, tende a se retrair ainda mais com uma guerra. Isso pode ser extremamente grave para um país que depende de 35 bilhões de dólares de investimentos externos para fechar as contas até o final do ano. Finalmente, não há garantia de que os exportadores brasileiros conseguirão dar o vigor necessário aos resultados da balança comercial diante de uma economia mundial em contração. Se já estava difícil sem guerra, pior com ela. O único cenário que pode amenizar o quadro é se a guerra fosse resolvida em prazo curto, revertendo o humor dos mercados. Só que guerra é como casamento: a gente sabe como começa, mas não como termina.

De que lado eles estão...
Com os EUA Em cima do muro Oponentes
InglaterraOtanFrança
AustráliaJapãoAlemanha
IsraelTurquiaRússia
EspanhaArábia SauditaChina
ItáliaBrasilSíria
Europa Central
Membros permanentes
do Conselho de Segurança da ONU (com poder de veto)
Membros Rotatórios do Conselho
da ONU
Fonte: The Economist
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