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Por que investir em ações por meio de clubes

Menos impostos, planejamento de herança, autonomia de gestão e intenso aprendizado são as vantagens de montar um grupo de investimentos, dizem especialistas

Jardel Evaristo Behs, representante do clube de investimento Investsap, de Sapiranga (RS) (--- [])
DR

Da Redação

Publicado em 15 de dezembro de 2009 às 10h19.

A ideia de administrar dinheiro em conjunto soa mal aos ouvidos de muita gente. É bastante comum, por exemplo, ouvir impropérios contra os sócios de pessoas cujo negócio próprio naufragou. Por isso, há aqueles quem hesitam na hora de pensar em montar um clube de investimento, que nada mais é do que uma sociedade para abarcar as aplicações financeiras de um grupo de pessoas. Porém, segundo especialistas do mercado de capitais, basta ter um pouco de organização e disciplina para que o relacionamento e a gestão caminhem harmoniosamente.

Fazer negócios entre amigos, familiares ou pessoas que tenham objetivos financeiros semelhantes pode ser um grande aprendizado para os que querem se aventurar no mercado de ações. "É ótimo para quem está começando porque os investidores passam a estudar mais o mercado e trocam muita informação", afirma Thiago Arnold, consultor de investimento da Geração Futuro, a maior corretora de clubes de investimentos do Brasil, com 280 grupos registrados.

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A administração fica a critério do cliente, podendo ser gerido pelo clube (sob a égide de um representante oficial), por um gestor contratado ou até em forma de parceria com uma instituição financeira. É nesta autonomia de decisão que está uma das grandes vantagens do investidor de um clube quando comparado a um fundo de investimentos, segundo o gestor de investimentos pessoa física Marc Olichon. "O cotista pode determinar como quer a composição de sua carteira, colocando uma porcentagem em blue chips (ações das maiores empresas da bolsa), outra em small caps (ações de segunda e terceira linha), derivativos, entre outros", diz Olichon.

Entretanto, diferente dos fundos, onde não há limite para aplicação, nos clubes, um cotista não pode deter mais do que 40% do patrimônio total. Isso acontece para manter o equilíbrio da carteira de ações do grupo.

(Continua)


Vantagem tributária

É consenso entre os gestores de mercado de que o principal benefício tributário dos clubes refere-se aos cotistas que investem mais de 66% de sua carteira em ações. Nesse caso, o Imposto de Renda (IR) só é cobrado no momento do resgate do capital, por uma alíquota de 15% sobre o rendimento da aplicação. Essa é uma grande vantagem em relação aos fundos de investimentos, que pagam IR semestralmente, numa operação conhecida como "come-cotas". Como os clubes só pagarão o IR na data do resgate, o dinheiro continua aplicado - e pode render bons lucros e dividendos.

No entanto, caso as aplicações em ações do clube fiquem abaixo dos 66% do patrimônio, a tributação é exatamente igual à dos fundos. A alíquota vai de 22,5% a 15%, dependendo do tempo de aplicação. O gestor de investimentos pessoa física Valdinei Gotardi explica, no entanto, que se o investidor deseja reduzir o percentual de recursos aplicados em renda variável porque acredita na queda da bolsa, há maneiras de fazer isso sem abrir mão do benefício tributário. O gestor pode, por exemplo, montar posições no mercado futuro, por meio de opções, para travar possíveis perdas na Bovespa - mantendo mais de 66% do patrimônio em renda variável.

Os clubes de investimentos familiares também podem trazer vantagens na hora de transmitir a herança. Gotardi explica que se um pai for o representante do clube e quiser assegurar a herança de seus filhos, ele pode ir repassando o patrimônio, em vida, para as cotas dos herdeiros sem pagar o IR de 4% sobre o valor de mercado do patrimônio. No entanto, no caso de mudança de titularidade do clube de investimento, os cotistas terão de arcar com os custos do inventário.

Clubes no Brasil

As aplicações em bolsa por meio de clubes têm crescido exponencialmente. Nos últimos dez anos, o número de registros na Bovespa passou de 180 clubes para os atuais 2.904, um crescimento equivalente a 1.513%. Somente neste ano, o aumento foi de 120%. Atualmente, o acumulado total do patrimônio líquido dos clubes é de 12,75 bilhões de reais.

De acordo com José Alberto Filho, professor de educação financeira da BM&FBovespa, essa alta incidência dos clubes ocorre por dois fatores fundamentais. Primeiramente, é fruto do intenso trabalho da BM&FBovespa, desde 2002, no sentido de popularizar a bolsa de valores. E, além disso, é reflexo da favorável conjuntura econômica brasileira, principalmente em relação à queda de juros.

O professor também recomenda esse tipo de investimento para quem é iniciante no mercado financeiro. "A participação em um clube acontece de forma bastante didática. Muitas vezes, ele pode ser um passo para que a pessoa, mais para frente, faça uma 'carreira solo'. Depois de formar uma massa crítica, muitos passam a operar sozinhos no home broker", diz Alberto Filho.

Evolução anual
Período
Número de Clubes
Número de Investidores
Patrimônio    Líquido (em R$)
1996*15432.37379.794.546,07
1997*16262.63497.643.694,99
1998*14967.771101.441.514,81
1999*18055.849276.967.621,38
2000*379115.0871.269.131.601,03
2001*457140.6921.413.286.672,21
2002*473139.5241.404.917.669,62
2003*755113.0283.977.201.180,80
2004*1.016107.9465.726.198.356,07
2005*1.323112.3066.994.750.780,94
2006*1.631131.9699.646.498.656,26
2007*2.160154.10214.782.483.988,96
2008*2.776148.6378.217.149.679,86
2009**2.904139.86012,75 bilhões
*Posição ao final de dezembro
**Posição ao final de Outubro

Registro mensal de novos clubes
Período
Clubes registrados no mês
Clubes em atividade
Cotistas
(em milhares)
Patrimônio Líquido (em R$ Bilhões)
jan/09302.778148,648,3
fev/09112.767147,947,7
mar/09412.789146,388,0
abr/09312.801146,079,3
mai/09202.798145,7510,6
jun/09412.820145,1410,5
jul/09252.820144,1811,2
ago/09572.844143,2611,1
set/09462.865144,0512,3
out/09502.854139,8612,8
**Recorde Histórico Mensal

(Continua)


Na opinião de Sandra Blanco, representante do clube Mulher Investe, criado em 2004 e hoje formado por 104 investidoras, a principal vantagem dos clubes realmente é a interação entre as pessoas e a troca de ideias. "Em nossas reuniões mensais, eu preparo um resumo do que aconteceu no período para discutirmos se nossa estratégia está em linha. As participantes também apresentam o que leram e, dessa forma, acontece uma grande educação financeira. Além de nos dar muito mais segurança", afirma Sandra.

O grupo nasceu com três amigas que sentiam necessidade de aprender mais sobre o mercado. Sandra conta que elas encararam a iniciativa como um desafio, justamente para vencer o medo e as dificuldades da mulher neste segmento predominantemente masculino. Como Sandra já tinha um conhecimento financeiro por ter trabalhado no banco norte-americano Merrill Lynch, ela passou a divulgar o clube exatamente sob o conceito de educação financeira para as mulheres.

E assim as adesões foram crescendo. Hoje, o grupo tem cotistas do Brasil inteiro e já chegou a ter participantes da Espanha, Portugal e até Japão. Elas mesmas são as gestoras do clube. Atualmente, o patrimônio do Mulher Investe tem 100% de seus ativos alocados em ações e possui um patrimônio líquido de 1 milhão de reais. A crise econômica foi responsável por perdas em torno de 200 mil reais ao clube. "A crise serviu de ensinamento para nós. Tínhamos uma estratégia de não aplicar nada se a bolsa registrasse queda maior do que 20%. E ela caiu muito mais e acabamos perdendo dinheiro", conta Sandra.

Do Rio Grande do Sul, da cidade de Sapiranga, há pouco menos de um ano, cinco amigos resolveram formar um clube porque estavam insatisfeitos com o pequeno rendimento da tradicional poupança. "A gente precisava de algo melhor para aplicar a reserva do final do mês", conta Jardel Evaristo Behs, representante do Investsap (sap, de Sapiranga).

A condição primordial para fazer parta do Investsap, que hoje conta com 30 amigos, é ter visão de longo prazo. De acordo com Behs, como a média do grupo é de 30 a 40 anos, todos pensam em fazer o resgate quando o "pé de meia" estiver mais robusto, daqui 10 ou 15 anos, segundo ele. A regra básica estabelecida entre os participantes é de investir no mínimo mil reais ao longo de 12 meses.

Diferente do clube feminino, os amigos - na grande maioria, executivos - não têm tempo e nem expertise para gerir a carteira do clube. Por isso, preferem deixar este trabalho nas mãos de uma corretora. Em geral, as instituições financeiras cobram uma taxa anual de 2% a 4% sobre o patrimônio do clube para o serviço.

Também com 100% da carteira em ações, o Investsap acumulou, até o momento, aproximadamente 250 mil reais. De acordo com o representante Behs, eles estão sempre a procura de novos membros, pois, segundo ele, quanto maior o clube, mais chances de lucrar.

(Continua)


Alguma desvantagem?

Para Maílson Hykavei, sócio diretor da FinPlan, empresa de planejamento financeiro, não existem vantagens e desvantagens específicas, tudo depende do perfil do investidor e do objetivo que ele tem no mercado. O limite de cada integrante de ter até 40% do patrimônio líquido do clube pode ser encarado, por alguns, como uma desvantagem.

Na opinião dos gestores Marc Olichon e Valdinei Gotardi, como é indicado um aporte inicial entre 100.000 a 200.000 reais para fazer um clube, isso pode se tornar um empecilho para o pequeno investidor. Segundo eles, boa parte das corretoras exigem ainda mais - cerca de 500.000 reais para começar um clube.

Mas se você tem condições de reservar um pouco de dinheiro no final do mês, se conhece pessoas com aspirações financeiras semelhantes e tem interesse em aprender a gerir seu capital no mercado de ações e em outros tipos de aplicações, o clube de investimento pode ser uma excelente opção.


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