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Curitiba

A nova onda da bicampeã

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h59.

Esqueça aquela Curitiba fria, sisuda, fechada e quase provinciana. Nos últimos três anos, a cidade está passando por outra metamorfose, depois que o parque automotivo se instalou nas vizinhanças e guindou a região ao posto de segundo pólo do setor no país. Essa segunda onda de transformações pode ser observada nos bares, happy hours, casas de show e restaurantes sempre abarrotados de executivos engravatados e profissionais liberais de várias partes do Brasil e do mundo. Pode parecer pouco. Mas, para Curitiba, tanto movimento, além de revolucionar os costumes, está ajudando a fazer florescer os negócios. "Antes, se tivéssemos duas boates, uma quebraria. Não havia público", diz o promotor de eventos Riad Omairi. "Hoje temos várias e todas vão bem."

As noites mais agitadas constituem apenas o começo das novidades da capital paranaense, que, pelo segundo ano consecutivo, conquistou o título de campeã entre as melhores cidades para fazer negócios no Brasil, segundo pesquisa da Simonsen Associados, encomendada por EXAME. Seu potencial de consumo é de 8,2 bilhões de dólares por ano, contra a média de 1,2 bilhão das 234 cidades brasileiras pesquisadas. Juntas, as famílias das classes A e B respondem por 74% desse potencial. Em Curitiba, o consumo per capita, de 5,2 mil dólares, é mais do que o dobro da média nacional e só perde para o de Porto Alegre.

Não são apenas os donos de boates, bares, restaurantes e agitadores da noite como Omairi que estão se dando bem. A elevada capacidade aquisitiva, reforçada pelos cerca de 70 mil postos de trabalho surgidos nos últimos cinco anos, em boa parte ocupados por profissionais altamente qualificados e bem pagos, também vem beneficiando o comércio local. Acaba de ser aberta na cidade a primeira loja de confecção masculina especializada em grifes internacionais, como Ermenegildo Zegna, Versace Classic e Tommy Hilfiger. A Capoani Uomo, que ocupa um casarão restaurado do século 19 de 500 metros quadrados, está sendo chamada de "a Daslu Homem de Curitiba", numa referência a um dos endereços mais caros de São Paulo. A Capoani Uomo abriu suas portas no coração do Batel, bairro nobre onde existe a maior concentração de BMW e Audi por metro quadrado da cidade.

O setor de serviços, que sozinho responde por 51,2% das atividades geradoras de renda de Curitiba, também está aproveitando as novas oportunidades. O grupo carioca Multiplan, por exemplo, dono do maior complexo de shopping centers do país, com um faturamento de 900 milhões de dólares no ano passado, já fincou suas bases em Curitiba. O Multiplan pretende instalar o que será o maior shopping da região, o ParkShopping Barigüi. Serão 44 mil metros quadrados de área construída num empreendimento orçado em 200 milhões de reais. O shopping será entregue em 2003 baseado no conceito de multiuso, unindo lojas, cinemas, centros de ginástica e alimentação num só lugar. O ParkShopping vai fazer da maior área verde da cidade, o Parque Barigüi, seu jardim. Isso, por sinal, provocou a reação das entidades ambientalistas locais, que entraram com ações na Justiça tentando embargar as obras. Instalado a poucos metros do parque, no bairro de Ecoville, um dos novos redutos de prédios de luxo de Curitiba, o shopping vai abusar dos vidros e garantir a visão da paisagem a seus freqüentadores. "Olhamos sempre para onde a cidade cresce, entramos com nossos empreendimentos e ajudamos a desenvolver a região", diz José Isaac Peres, presidente do Multiplan.

Em meio à profusão de novos espaços, a prefeitura de Curitiba vem apostando num centro de entretenimento que promete tirar o bolor de uma antiga área industrial da cidade, desativada há 30 anos. No bairro do Rebouças, um velho moinho está se transformando num centro de eventos capaz de abrigar tanto exposições de arte, festas, convenções e teatro como competições de esportes radicais. A idéia da prefeitura é transformar a área revitalizada do Rebouças num pólo para empresas de tecnologia da informação. Uma delas é a subsidiária brasileira da Microsoft, que já anunciou a intenção de instalar-se na região. A idéia é erguer ali seu primeiro centro na América Latina, voltado especificamente para capacitar profissionais na linguagem XML, uma ferramenta de última geração destinada ao mundo virtual e ao e-government. Será o terceiro centro de capacitação da Microsoft fora de Seattle, nos Estados Unidos - os outros dois estão localizados na Irlanda e na Índia. "Outras quatro ou cinco cidades no Brasil estão solicitando centros como esse, mas Curitiba será a primeira com o compromisso de aperfeiçoar um modelo que pode ser replicado em outros centros", diz Marcelo Simões, gerente da Microsoft para o Paraná e Santa Catarina. No primeiro ano, cerca de 500 profissionais serão treinados no centro. O centro de capacitação da Microsoft vai se juntar a exemplos de sucesso do que está sendo chamado de sociedade do conhecimento, em formação no estado. São cerca de 700 empresas, boa parte delas na região metropolitana, que fazem do Paraná o segundo pólo de produção de softwares do país, atrás apenas de São Paulo.

Responsável pela primeira onda de crescimento recente e mesmo sem exibir o dinamismo de outras épocas, o setor automotivo continua mantendo sua importância para a economia da capital do Paraná. O fechamento da fábrica da Chrysler, que produzia a picape Dakota em Campo Largo, seguramente causou impacto negativo. Mas há pelo menos duas boas notícias para contrabalançar os estragos. A primeira: a japonesa Nissan vai inaugurar em dezembro sua linha de utilitários, compartilhada com a sócia controladora, a francesa Renault. Com capacidade para produzir 50 mil unidades por ano, sairão dali as picapes Nissan Frontier e Renault Master. A segunda: a VW/Audi, que instalou na região uma de suas mais modernas fábricas para produzir os modelos Audi A3 e Golf destinados a exportação, está acenando com a possibilidade de transferir para a unidade a produção de um de seus modelos populares.

Tudo indica que a economia da região liderada por Curitiba continuará crescendo nos próximos anos. Há razões para isso. A capital e arredores devem receber cerca da 90% dos 2 bilhões de reais de investimentos captados pelo programa "Paraná Mais Empregos", do governo estadual. Entre eles figuram uma fábrica de vidros planos da americana Guardian, que aplicará 290 milhões de reais, e a ampliação da fábrica de autopeças da alemã Bosch, ao custo de 340 milhões de reais. Os investimentos, ao mesmo tempo que geram oportunidades de negócios, trazem consigo algumas mazelas. Uma delas é o inchaço da região metropolitana, cuja população vem crescendo à taxa média de 3,8% ao ano, mais que o dobro da média brasileira. Dona de indicadores sociais privilegiados, como um dos mais baixos índices de mortalidade infantil (14,9 mortes por mil nascidos vivos, praticamente a metade da média do país), Curitiba se ressente também do aumento da violência: o índice de mortes violentas é quatro vezes superior ao da média dos 234 municípios pesquisados pela Simonsen Associados. Isso não impede que continue admirada como um modelo de urbanismo e de qualidade de vida, aqui e lá fora.

Nos últimos meses, no entanto, Curitiba foi abalada por uma nota sombria, capaz de tisnar sua imagem de sucesso. Pesa sobre o grupo do atual prefeito, Cássio Taniguchi, do PFL, a suspeita de manipulação de caixa dois na campanha eleitoral do ano passado. O valor do caixa dois, cuja existência está sendo investigada pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, seria dez vezes maior que os 3,1 milhões de reais declarados na prestação de contas de campanha ao Tribunal Regional Eleitoral. O prefeito tem negado sistematicamente a existência da irregularidade.

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