EXAME.com (EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h29.
É comum a tecnologia da informação ser vista como uma força capaz de, num passe de mágica, criar condições para que os projetos imaginados pela direção de uma empresa saiam do papel. A realidade é um bocado mais complicada do que isso. Não é raro ocorrer o inverso: a complexidade da tecnologia retarda ou até inviabiliza algumas iniciativas importantes. Era nessa situação pouco confortável que Luciano Corsini, diretor executivo da Visanet, encontrava-se havia cerca de um ano. A companhia decidira oferecer novos serviços, como recarga de telefones celulares e pagamento de contas em correspondentes bancários, para assim complementar suas atividades principais -- o processamento de transações financeiras de cartões e a administração das redes de estabelecimentos comerciais afiliados. Mas, para isso, teria de mexer nos sistemas existentes na empresa -- e não seria nada fácil. Havia o risco de desestabilizar uma complexa teia de software pela qual passaram seis de cada dez compras feitas com cartão de crédito no Brasil em 2005. Em vez de trazer receitas adicionais, os novos serviços poderiam causar perda de faturamento.
A saída da Visanet veio na forma de três letrinhas: SOA, sigla em inglês para arquitetura orientada a serviços. Trata-se de nova maneira de pensar a estrutura de tecnologia de uma empresa. Em vez de longas e caras implementações de novos sistemas, o SOA oferece uma lógica diferente. Programas grandes e complexos, em geral produzidos por um único fornecedor, são quebrados em pequenos blocos de encaixar, como as peças de um jogo da Lego. Eventuais alterações podem assim ser feitas isoladamente em cada peça, sem afetar o restante do sistema. Com isso, o que antes exigia complicadas e arriscadas adaptações nos software corporativos agora pode ser feito em menos tempo, a um custo muito mais baixo e sem o risco de a empresa tornar-se refém de um determinado padrão tecnológico. Não faltam especialistas que garantam ser essa "a próxima grande coisa" em tecnologia da informação, depois da emergência dos computadores pessoais nos anos 80 e da internet na década seguinte. Mas, diferentemente das anteriores, essa é uma mudança, que não pode ser vista, como a web, ou manuseada, como um tecla do. "É uma revolução silenciosa", afirma Silvio Genesini, que preside a subsidiária nacional da americana Oracle, uma das fornecedoras que apostam pesado na novidade.
Não apenas silenciosa, a mudança parece ser também inevitável, tanto para quem compra como para quem vende software. A consultoria Gartner estima que apenas 5% das grandes companhias americanas tenham mais de um terço de seus programas baseados em SOA atualmente. Em 2010, serão 65%. Os gastos mundiais com serviços baseados em SOA devem crescer 138% neste ano, chegando a 8,6 bilhões de dólares. Em 2010, a consultoria IDC espera que esse número atinja 33,8 bilhões de dólares. Pelas cifras, vê-se que o Lego do software é um jogo de gente grande. A alemã SAP, maior empresa mundial de sistemas de gestão, ou ERP, concentra seus esforços num produto batizado de Netweaver. Com a saturação do mercado de ERPs para grandes corporações, a companhia se vê obrigada a seguir os desejos de seus clientes, que querem agregar novas funções sem ter de incorrer em altos custos de integração -- estima-se que, pelo método tradicional, cada dólar gasto na compra de software implique o desembolso de outros três para implementar e integrar o que foi adquirido. A empresa já criou mais de 300 blocos, ou serviços, e espera chegar ao final do ano com pelo menos 3 000. No ano passado, a gigante alemã faturou mais de 600 milhões de dólares com a nova família de produtos.
A Oracle, principal concorrente da SAP, também criou um pacote de software que funciona como peças de encaixar. Trata-se do sistema Fusion Middleware, que movimentou cerca de 1 bilhão de dólares no último ano fiscal da empresa. "É o nosso negócio que cresce mais rapidamente em todo o mundo", diz Amit Zavery, vice-presidente de gerenciamento de produto da companhia. IBM, Microsoft, BEA Systems e outros fornecedores de tecnologia disputam esse mercado com voracidade e têm as próprias ofertas de serviços para encaixá-los com facilidade nos sistemas já instalados. Além de atender à demanda dos clientes por simplicidade, essas empresas fazem um movimento defensivo. Hoje, quem usa um sistema de determinado fabricante para controlar suas necessidades essenciais, como produção e administração financeira, de certa forma está amarrado aos padrões de quem oferece o produto. Com o SOA, os blocos são intercambiáveis, independentemente do fornecedor. Isso representa uma mudança importante na relação de forças entre compradores e desenvolvedores de software. Haverá mais alternativas e, portanto, melhores condições de negociação. Os preços dos serviços tendem a cair.
Outra promessa dessa nova lógica do software é que funções adicionais poderão, em teoria, ser implementadas pelos próprios gestores das áreas de negócios, sem depender de um interminável vaivém com o departamento de tecnologia. Precisa criar um sistema de aprovação de crédito ou integrar um novo fornecedor na cadeia de suprimentos? No futuro, bastará recombinar os blocos e pronto. É claro que isso ainda é um sonho distante, que será realidade apenas nas empresas mais sofisticadas tecnologicamente. Mas trata-se de um anseio antigo de qualquer companhia: os responsáveis pela área de tecnologia poderão se preocupar menos com as minúcias técnicas e mais com o que realmente importa, os negócios.