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Anatel pode perder eficiência na fiscalização

Para o presidente da agência, Elifas Gurgel, falta de recursos para manter os trabalhos pode comprometer a supervisão das operadoras de telefonia

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h47.

Quarto presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) em quatro anos, o coronel da reserva Elifas Gurgel deixará seu cargo no dia 3 de novembro, caso não seja reconduzido pelo ministro das Comunicações, Hélio Costa. Indicado pelo ex-ministro das Comunicações, Eunício Oliveira, o atual presidente do órgão regulador irritou o governo ao tornar pública a crise vivida pelas agências, quando anunciou o fechamento da central de atendimento telefônico por falta de recursos.

Para ele, problemas como esse não configuram crise no modelo dos órgãos reguladores, mas parte da sua evolução. Ainda assim, admite a existência de problemas com o quadro de pessoal e com orçamento. E os problemas de caixa deverão aumentar no próximo ano. A seguir, os principais trechos da entrevista à EXAME na qual o presidente da Anatel analisa as questões que envolvem o órgão

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Quarto presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) em quatro anos, o coronel da reserva Elifas Gurgel deixará seu cargo no dia 3 de novembro, caso não seja reconduzido pelo ministro das Comunicações, Hélio Costa. Indicado pelo ex-ministro das Comunicações, Eunício Oliveira, o atual presidente do órgão regulador irritou o governo ao tornar pública a crise vivida pelas agências, quando anunciou o fechamento da central de atendimento telefônico por falta de recursos.

Para ele, problemas como esse não configuram crise no modelo dos órgãos reguladores, mas parte da sua evolução. Ainda assim, admite a existência de problemas com o quadro de pessoal e com orçamento. E os problemas de caixa deverão aumentar no próximo ano. A seguir, os principais trechos da entrevista à EXAME na qual o presidente da Anatel analisa as questões que envolvem o órgão

EXAME Há crise nas agências reguladoras?
Elifas Gurgel O modelo das agências não está em crise. Ele passa por um processo de amadurecimento. A fase inicial, que é mais difícil, já passou. O crescimento do setor é irrefutável. Na área de telecomunicações, o Brasil está em uma posição que eu diria boa, mas pode melhorar ainda mais. Esse é um processo que vivemos, próprio do estágio evolutivo das agências. Já estabelecemos um marco regulatório, que vem sendo atualizado e construído à medida da necessidade. Entendo que a agência reguladora tem que regular à medida do necessário, nem menos nem mais. Se for demais pode engessar o setor e se regula pouco pode desorganizá-lo. Como reguladora, a Anatel continua regulando bem e fazendo seu trabalho.

EXAME Como o senhor vê o projeto das agências reguladoras que tramita no Congresso?
Gurgel Estamos acompanhando a proposta que está na Câmara dos Deputados, assim como mais de 600 projetos que tramitam sobre o setor de telecomunicações. A expectativa da lei não tem atrapalhado a atuação da agência, nem inibido investimentos. Os investidores estão mais preocupados com o marco regulatório e sua estabilidade para um período de mais longo prazo. Para o setor, a Lei Geral das Telecomunicações é o marco principal, que dá as diretrizes mestras. Se a lei for aprovada, não muda muita coisa na Anatel.

EXAME Como a Anatel acompanha os problemas de evasão de pessoal qualificado?
Gurgel Alguns técnicos deixarão nossa agência, em virtude da determinação do governo em relação ao contrários temporários. Mas já temos sinalizações de que o quadro pode ser mantido: será por medida provisória. Haverá uma perda significativa se não houver essa prorrogação. Estou apreensivo. Estamos tratando também do segundo concurso público para os quadros da agência. Se fizermos mesmo o concurso público, não poderemos incorporar as pessoas antes do meio do ano que vem. Isso daria um grande hiato no funcionamento da agência. Encontro problemas também nas pessoas concursadas, que fazem vários concursos e se deslocam para onde pagam mais. Os procuradores especializados da AGU (Advocacia Geral da União) estão indo embora. Estamos com uma perda altíssima. Gastamos recursos para treinar os funcionários e eles vão depois embora. Ninguém que passou no último concurso quis assumir Manaus, por exemplo. Por isso, estamos discutindo se fazemos concurso nacional ou regional.

EXAME E a falta de recursos para o órgão regulador?
Gurgel Doeu no osso cortar o call center. A questão orçamentária se agravou profundamente ao longo desse ano. Tínhamos uma expectativa de um orçamento aprovado pelo Congresso de 377 milhões de reais e uma programação vislumbrando esse valor. Ao longo do ano, a gente foi sentindo que haveria restrições e fomos nos adequando. Para se ter uma idéia, entre diárias e passagens, a agência gastou 14 milhões de reais no ano passado e até agora gastamos 3,7 milhões. Houve um corte profundo. Isso reflete viagens internacionais, ações em que a agência tem obrigatoriedade de representar o Brasil lá fora. São coisas importantes. Ações de fiscalização também deixaram de ser realizadas. Em vários momentos, mandei segurar o pessoal na capital. Isso é um prejuízo profundo para a atividade da agência. Mas lembro que, mesmo com o corte do call center, em momento nenhum a agência deixou de receber petições do usuário. Só um meio, o telefone, foi interrompido.

EXAME Essa falta de recursos vem desde quando?
Gurgel Desde o início venho sinalizando para todas as autoridades o problema das verbas. Do 377 milhões reais aprovados, recebemos 90 milhões de reais. Depois teve uma complementação de 40 milhões de reais e com isso estamos com 130 milhões de reais. Esses 40 milhões de reais serviram para dar continuidade ao trabalho da agência. Em alguns escritórios chegaram a faltar serviços de manutenção do edifício. Agora chegaram mais 20 milhões de reais. Implantei o plano apagão na agência: restrição de energia e água, como ocorreu durante o racionamento. Elevadores desligados e luz em determinadas áreas. Voltei a fazer economia como no tempo do apagão para poder chegar ao final do ano. Limpeza da garagem passou a ser apenas uma vez por semana. Fazemos fiscalização cerrada sobre ligações dos servidores. A verba de comunicação está zerada. Só se faz a publicidade legal. Cortei no osso. Antes de cortar o call center, tomei muitas medidas anteriores.

EXAME E quais foram as conseqüências?
Gurgel Isso representou cerca de 23 mil horas de ações que deixaram de ser realizadas. Por exemplo, fiscalização da parte de radiodifusão, rádios clandestinas - que são um risco para navegação aérea; a fiscalização nas operadoras no interior, na parte de rede. A aferição de equipamentos também deixou de ser feita. Houve uma perda real e agora estamos retomando. Foram 3 247 pedidos de fiscalização que não foram realizados. Contratos de apoio significam empresas que fazem acompanhamento da atividade junto às operadoras. Isso é uma coisa que está perdida. Se tiver dinheiro agora não adianta. Na medida em que as ações tiveram um período muito longo. Alguma coisa pontual pode ter ocorrido, mas não foi sensível.

EXAME Há recursos para tocar o processo de renovação dos contratos das empresas de telefonia?
Gurgel A falta de fiscalização poderia prejudicar a aferição das metas para os contratos, mas para isso deixei reservado o último recurso para esse trabalho. Na escala de prioridades, essas metas são a número um. Os contratos terão de ser assinados de qualquer forma e para isso não pode faltar dinheiro. Guardamos 10 milhões de reais para essas consultorias. Aliado a isso tem a fiscalização para conferir se as metas foram atingidas. Para cálculo do índice de preços (que serve de parâmetro para as tarifas a partir de 2006) fizemos também economia. Estabelecemos um convênio com o IBGE e com isso não fizemos a contratação de uma consultoria que estava praticamente fechada e licitação fechada.

EXAME E como está o orçamento de 2006?
Gurgel Para o ano que vem foram pedidos 507 milhões de reais, sendo que 107 milhões de reais é para pessoal. Ou seja, 400 milhões de reais para as atividades e o dia-a-dia da agência. O que o governo está mandando para o Congresso é 129 milhões de reais. O que nos apavorou foi a previsão para o ano que vem. O ministério nos mandou um ofício do ministro Hélio Costa dizendo que teria que planejar 89 milhões de reais. Eu cheguei a ele e disse que com esse dinheiro não dá. É menos do que recebi esse ano. Posteriormente o ministério do planejamento disse que colocaria mais 40 milhões de reais.

EXAME E como ficará a administração da agência no ano que vem?
Gurgel No ano que vem, a permanecer esse orçamento teremos dificuldade em dar prosseguimento às nossas ações. Vamos ter que sentar com o ministério e explicar o que vamos priorizar e o que vamos deixar de realizar. As ações que deixei de realizar esse ano estavam planejadas para o ano que vem. E com esse orçamento vou ter muitas dificuldades. É provável que no Congresso haja um movimento para dar aportes. A restrição orçamentária está sempre associada a uma perda de eficiência em determinada área. Pode trazer prejuízos para a atividade fim da agência, que é fiscalizar e regular. O número de telefones celulares chegará a 80 milhões no final deste ano. Isso demanda maior eficácia e eficiência, utilização de meios mais eficazes de fiscalização e isso requer investimentos. Vejo que a Anatel poderá perder a eficiência da fiscalização. Na prática significa que a agência vai fiscalizar de forma menos eficaz a verificação dos padrões de qualidade dos serviços prestados. A quantidade de ligações completadas, de quedas que forem observadas em telefone móvel. Outros aspectos, como instalação de linhas que não estejam atendendo as normas da Anatel. Tudo isso exige ações locais e até remotas. Temos que expandir nossa rede de sistema de monitoramento do espectro radioelétrico. Estamos programando o projeto de expansão desse sistema de monitoramento. A ineficácia da fiscalização pode trazer uma piora na qualidade dos serviços. Quando você deixar um carro cair muito e deixa a manutenção de lado, quando você vai retomá-lo, vai se gastar muito mais do que o faria se tivesse feito as manutenções ao longo do tempo

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