Juros mais baixos ao consumidor? Cuidado!
O mercado financeiro brasileiro vem passando por uma fase muito dinâmica e interessante. Os juros estão caindo, algumas regras de investimento foram mudadas e, do lado do crédito, o governo resolveu dar uma “forcinha” para tentar repassar parte dessa queda de juros para o consumidor, afinal de contas a teimosia e a insistência do nosso PIB em não crescer está deixando muita gente no governo sem dormir direito. As taxas […] Leia mais
Publicado em 11 de junho de 2012 às, 13h24.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 09h25.
O mercado financeiro brasileiro vem passando por uma fase muito dinâmica e interessante. Os juros estão caindo, algumas regras de investimento foram mudadas e, do lado do crédito, o governo resolveu dar uma “forcinha” para tentar repassar parte dessa queda de juros para o consumidor, afinal de contas a teimosia e a insistência do nosso PIB em não crescer está deixando muita gente no governo sem dormir direito.
As taxas começaram a cair, inicialmente por pressão dos bancos ligados ao governo e, logo na sequência, os bancos privados começaram a aderir ao movimento. Os efeitos dessas medidas ainda não estão muito visíveis. Alguns dizem que essas taxas são “para Inglês ver”, que elas são anunciadas, mas, na prática, são oferecidas apenas a clientes selecionados. Outros dizem que o brasileiro, já bastante endividado no momento, está relutante em fazer novas dívidas, talvez um pouco inseguro com as perspectivas da economia e do mercado de trabalho (e esse PIB que insiste em não subir…).
Eu gostaria de acreditar que a segunda possibilidade é verdadeira, que finalmente está “caindo a ficha” nas pessoas, que é preciso dar uma aliviada no consumo e no endividamento, mas na prática não observo isso. Aliás, estes últimos anos, com a grande fartura de crédito (ainda que caríssimo), estão mostrando o quanto nosso povo é despreparado para lidar com dinheiro. O brasileiro médio está se revelando um consumidor imaturo, deslumbrado, que não sabe fazer contas, não sabe o valor do próprio dinheiro e compra qualquer coisa que vê pela frente, contanto que a “parcela” caiba no orçamento.
Esse típico consumir brasileiro dos “tempos modernos” é aquele indivíduo que entra em uma concessionária de automóveis, compra um carro zero quilômetro a um preço altíssimo (se compararmos com o mesmo carro no exterior), paga em prestações (aumentando esse valor ainda mais) e aparentemente está feliz com isso. É aquele cara que hoje se sente milionário, pois agora consegue “viajar de avião pagando em doze vezes no cartão”…
Esse indivíduo provavelmente ainda não entendeu que a redução nas taxas de juros é uma oportunidade de colocar a vida nos eixos novamente, e não um “sinal verde” para sair gastando, consumindo e se endividando ainda mais.
Para esse indivíduo, eu gostaria de dizer que, nos Estados Unidos, a taxa do rotativo de um cartão de crédito oscila entre 10% e 20% ao ano, conforme o emissor e o tipo de cartão (que sonho uma taxa dessas, não?).
Mas vamos observar alguns números a seguir:
2002 1.539.111
2003 1.625.208
2004 1.563.145
2005 2.039.214
2006 597.965
2007 822.590
2008 1.074.225
2009 1.412.838
2010 1.536.799
2011 1.362.847
Esses números mostram, segundo o American Bankruptcy Institute, a quantidade de indivíduos que requereu “falência pessoal” nos EUA nos últimos dez anos. Temos, em média, 1,4 milhão de pessoas “quebrando” por ano nos EUA, ou seja, quase meio por cento de toda população americana (incluindo crianças) vai à falência anualmente.
Aqui no Brasil, não temos números muito precisos sobre a quantidade de pessoas que “quebra”, mas comparar falências aqui com os EUA é um pouco como comparar laranjas e maçãs, pois lá existe um mecanismo mais ou menos claro de falência pessoal. Aqui no Brasil, temos algo chamado “Insolvência Civil”, que é o que existe de mais próximo à falência pessoal, mas é um mecanismo obscuro, desconhecido inclusive de muitos advogados, e que tem um funcionamento um pouco estranho (por isso mesmo não é muito utilizado). Aliás, nossa estrutura judiciária é igualmente estranha no que diz respeito às operações de crédito, pois em alguns aspectos ela superprotege o devedor, mas em outros o deixa completamente desguarnecido (mas isso foge do escopo do artigo atual e vai ficar para uma próxima…).
O que precisamos ter em mente é que, se por um lado taxas mais baixas ao consumidor são positivas (e são mesmo – a economia real agradece…), por outro elas funcionam como um incentivo ao consumo desenfreado e ao superendividamento, levando ao descontrole financeiro às vezes em níveis difíceis de se reverter. Taxas de juros mais baixas também quebram as pessoas. Podem quebrar um pouco mais lentamente, mas quebram…