Ainda sobre as vantagens do cartão de crédito
No artigo anterior (clique aqui para ver), falei sobre vantagens do cartão de crédito, uma forma de tentar mostrar que ele não é o “vilão” que gostamos de pintar de vez em quando. Quando o artigo foi publicado, eu imaginei (e acabei acertando) que dois pontos em particular iriam gerar alguma polêmica nas redes sociais. O primeiro deles era sobre a questão da responsabilidade individual (usei a metáfora da “pecinha”). […] Leia mais
Publicado em 10 de abril de 2013 às, 10h07.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 09h04.
No artigo anterior (clique aqui para ver), falei sobre vantagens do cartão de crédito, uma forma de tentar mostrar que ele não é o “vilão” que gostamos de pintar de vez em quando.
Quando o artigo foi publicado, eu imaginei (e acabei acertando) que dois pontos em particular iriam gerar alguma polêmica nas redes sociais.
O primeiro deles era sobre a questão da responsabilidade individual (usei a metáfora da “pecinha”). Uma das maiores “brigas” do pessoal que trabalha com finanças pessoais, direito do consumidor, psicologia econômica e afins é a questão da responsabilidade individual versus as pressões do mercado e do “ambiente”. Temos, em um extremo, aqueles que veem as pessoas como vítimas indefesas do “sistema”, que acabam caindo no endividamento e no consumo excessivo porque são induzidas a isso. No outro extremo está o pessoal de visão mais “liberal” (no sentido político) que vê tudo o que acontece com as pessoas como consequência de escolhas que elas tomaram, e que elas devem ser 100% responsáveis por essas consequências. É a visão da “responsabilidade individual extrema”.
Eu mesmo oscilo bastante entre esses dois extremos (sou obrigado a reconhecer). As coisas em finanças pessoais e consumo raramente são tão “preto no branco” quanto gostamos de acreditar; o componente ideológico tem um peso considerável e é sempre difícil formar uma opinião segura, mas no atual momento estou pendendo mais para o lado da responsabilidade individual. Inclusive, explorei bastante essa questão aqui no blog no início do ano (quando falei sobre a “Nova era da responsabilidade individual”) e deverá ser um assunto recorrente em postagens futuras.
O segundo ponto foi quando falei do “crédito grátis”. Todos nós sabemos que crédito grátis não existe nem aqui e nem em lugar algum. O dinheiro tem custo e, se nós não estamos pagando por ele, é porque alguém está subsidiando.
No Brasil, não é usual praticar preços diferenciados para compras feitas com cartão e com outros meios de pagamento. Ao menos em teoria, o nosso Código do Consumidor não permite discriminação de preços e há uma certa controvérsia, inclusive entre as autoridades financeiras, judiciais e de defesa do consumidor, sobre a legalidade ou não da diferenciação de preços. Na dúvida, a prática mais comum é manter os preços iguais para pagamento com cartão e por outros meios. Alguns dão desconto quanto se opta por não usar o cartão, mas normalmente fazem isso de forma discreta.
Vender com cartão de crédito implica em custos para o comerciante e ele precisa inserir esse custo em algum lugar (e esse “algum lugar”, antes que alguém comece a ter ideias, é no preço de venda do produto…). O custo é então repassado ao consumidor e, como todo mundo paga, ao menos em princípio, o mesmo preço pelo produto, todos acabarão pagando pelos custos do cartão de crédito. Só que quem efetivamente paga com o cartão de crédito estará usufruindo dos benefícios, da comodidade e do diferimento do pagamento por até 30 dias (sempre lembrando que o dinheiro tem um valor ao longo do tempo, então, tecnicamente falando, há um pequeno desconto no preço a se considerar – mais uma vantagem para quem usa cartão).
Agora aquele indivíduo que não usa o cartão de crédito também está pagando, mas não usufrui de benefício algum. Ele apenas “banca” a vantagem de quem usa o cartão. Ele está subsidiando o custo financeiro para que outros se beneficiem. Vendo, então, por um ponto de vista estritamente financeiro, NÃO usar cartão de crédito é um péssimo negócio…
Em finanças pessoais, raramente se faz dívida para obter “alavancagem” (usar o dinheiro para gerar mais dinheiro). A esmagadora maioria das dívidas é para consumo; por isso, salvo raríssimas exceções, o endividamento de pessoas físicas é algo nocivo. Mas uma dessas raras exceções (e que por aqui no Brasil está ficando cada vez menos rara) é quando há uma distorção na formação entre os preços “à vista” e “a prazo”.
Quando um produto tem um determinado preço a prazo e seu preço à vista é exatamente igual à soma das parcelas (“mil reais à vista ou dez parcelas de cem reais”), o custo financeiro está embutido no preço do produto, independentemente da forma de pagamento, e quem comprar à vista acabará financiando aqueles que comprarem a prazo. A coisa certa numa situação assim seria que o lojista oferecesse um desconto no valor à vista. Às vezes, isso acontece, mas nem sempre, seja porque o vendedor tem uma política de preços rígida (prática comum em grandes varejistas) ou porque simplesmente não entende o valor do dinheiro ao longo do tempo (algo mais comum entre pequenos comerciantes). Quando é assim, a coisa lógica a fazer é se endividar…
Onde está o perigo? O perigo está no descontrole financeiro e é aí que pelo menos 90% das pessoas “entram pelo cano”. As pessoas compram, convenientemente se “esquecem” que o dinheiro das parcelas já está comprometido com os pagamentos futuros e começam a fazer mais compras e a acumular mais parcelas. Nesse momento, o endividamento “estratégico”, feito para tirar proveito de uma distorção nos preços, acaba virando um endividamento “real”, uma bomba-relógio financeira.