O filme do Oscar 2017 que você não deveria ter perdido
Embora traga um enredo que não é exatamente uma novidade, "A Qualquer Custo" é um faroeste moderno e arguto, mas que foi quase que desprezado no Brasil
Publicado em 10 de março de 2017 às, 06h00.
Última atualização em 10 de março de 2017 às, 18h22.
No Texas dos cowboys rudes, dos policiais justiceiros e homens fora-da-lei, quem é o mocinho e quem é o vilão?
Isso é relativo, como mostra “A Qualquer Custo” ("Hell or High Water"), dirigido por David Mackenzie e estrelado por Jeff Bridges, Chris Pine e Ben Foster. O filme capta como poucos o mau humor com os financistas pós-crise de 2008 e conseguiu quatro indicações para o Oscar 2017 (melhor filme, melhor ator coadjuvante, melhor roteiro original e melhor edição), mas mesmo assim passou quase despercebido por aqui. Vai entender...
Pine e Foster fazem Toby e Tanner, dois irmãos que cresceram na pobreza e donos de temperamentos totalmente diferentes. Enquanto o primeiro é um pai de família centrado, racional, mas desesperado para conseguir dar uma vida melhor para seus filhos, o segundo é um ex-presidiário impulsivo e violento.
E é o próprio Toby que bola um plano ousado e perigoso: roubar dinheiro das agências de um banco que atua nos limites do estado para evitar que esse mesmo banco tome a propriedade da família, um rancho árido, à primeira vista sem graça.
Com a ajuda de seu irmão, que adiciona a essa empreitada a loucura ultra-armada que ela merece, ele percorre a região invadindo as filiais e roubando pequenas quantias de dinheiro. Aqui, Mackenzie já exige que você lide com a insegurança dos seus sentimentos: de que lado você está?
Corta.
Quantias pequenas para o FBI, mas não para os dispostos Texas Rangers, a lendária divisão especial da polícia texana da qual fazem parte Marcus Hamilton e Alberto Parker, personificados por Bridges e Gil Birmingham, respectivamente.
Hamilton é um policial que está prestes a se aposentar, é boca suja e cheio de piadinhas racistas sobre a ascendência indígena/mexicana de seu parceiro. Impressionado com a ousadia dos assaltantes, vê no caso uma oportunidade de encerrar a carreira de forma triunfal.
Como se pode perceber, o embate entre esses fora-da-lei e os defensores da justiça se torna, aos poucos, inevitável.
“A Qualquer Custo” conta uma história que não é uma novidade, mas é muito bem amarrada graças ao roteiro impecável de Taylor Sheridan (o nome por trás de outro ótimo filme, “Sicario – Terra de Ninguém”). Embora tenha traços de drama, carrega um senso de humor afiado e bons momentos de ação daqueles que tensionam o pescoço.
Os personagens são complexos, interessantes, se conectam com o espectador de forma ambígua e suas ações trazem à tona um questionamento inevitável: o que é certo, é justo? Difícil responder, mas Mackenzie trabalha esse dilema com maestria.
Ainda que não seja inovador no enredo, “A Qualquer Custo” é um faroeste moderno, em dia com o zeitgeist americano pós-crise de 2008, no qual o modus operandi dos bancos é colocado constantemente em xeque pela sociedade.
Impossível escapar dessa reflexão e da discussão sobre o que acontece com a ponta mais fraca dessa corda: as pessoas físicas. Só em 2016, mais de 900 mil propriedades entraram no processo de “foreclosure”, onde o emprestador tenta recuperar o dinheiro com a garantia do empréstimo. No mundo fictício, o rancho dos irmãos Toby e Tanner seria uma delas.
O longa estreou na primeira semana de fevereiro no Brasil, às vésperas do Oscar 2017, e registrou uma bilheteria pífia ante outros filmes como “Moonlight: Sob a Luz do Luar” ou o musical “La La Land – Cantando Estações”. Sequer figurou entre os dez filmes mais vistos pelos brasileiros no mês passado, mesmo com aval quase que unânime da crítica. Uma pena!
É possível encontrar esse filme nos cinemas do Brasil? Olha, segundo a página oficial da distribuidora (California Filmes), ele ainda consta em cartaz. Fiz uma breve busca em São Paulo e não encontrei nada que indicasse isso. O jeito, talvez, tenha que ser se satisfazer com o trailer até que o longa esteja disponível em serviços de streaming ou DVD/Blu-Ray.
Então, enquanto isso...