Lemann, Buffet e um novo capitalismo
Nesta fase da minha vida profissional estou em conselhos de grandes e pequenas companhias, ajudo empresas inovadoras e invisto nelas, participo de associações empresariais e de organizações comunitárias sem fins lucrativos. Quando me perguntam como escolho entre as várias propostas que, afortunadamente, me fazem, digo sempre que o primeiro critério é gostar das pessoas que […]
Publicado em 12 de maio de 2016 às, 18h38.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às, 18h11.
Nesta fase da minha vida profissional estou em conselhos de grandes e pequenas companhias, ajudo empresas inovadoras e invisto nelas, participo de associações empresariais e de organizações comunitárias sem fins lucrativos. Quando me perguntam como escolho entre as várias propostas que, afortunadamente, me fazem, digo sempre que o primeiro critério é gostar das pessoas que lideram e estão envolvidas na iniciativa.
Os demais critérios, como quão inovador e desafiador é o projeto, a viabilidade do modelo de negócios, a compatibilidade do assunto com minhas áreas de interesse, se há e quanto é a remuneração, são considerações posteriores à percepção de que estarei junto de gente com quem terei uma relação de amizade. Quando digo isso, muitos interlocutores reagem com certa desconfiança, como se a afirmação fosse apenas politicamente correta.
Eis que recentemente deparo com a conversa que o empresário Jorge Paulo Lemann teve com Jim Collins no encerramento do Brazil Conference da Universidade Harvard e do MIT. O evento foi fartamente noticiado, pelo fato de Lemann ter dito que seu maior sonho é que o Brasil seja um país menos desigual e por tê-lo comparado à Suíça, onde mora. Uma observação óbvia, mas necessária e importante, principalmente por ser dita por um de nossos melhores líderes empresariais e pelo homem mais rico do Brasil.
Mas, sem a mesma repercussão, Jorge Paulo também contou sobre sua parceria com Warren Buffett na compra das fabricantes de alimentos Heinz e Kraft. Como relatado em EXAME Hoje na reportagem “Collins e Lemann: uma conversa”, do jornalista Daniel Barros, disse ele: “Tenho passado muito tempo na companhia do Warren Buffett e uma coisa que ele sempre diz é: ‘Só faço negócios com quem eu gosto’. Já estivemos prestes a fechar um acordo que financeiramente era muito atraente, mas Buffett voltou atrás e disse: ‘Não gosto das pessoas dessa empresa, é melhor não fechar’ ”.
Estou convencido que, muito mais do que um capricho meu e, imodestamente, do terceiro homem mais rico do mundo, essa atitude é característica de um capitalismo em transformação, no qual novos laços sociais e empresariais, mais horizontais e menos hierárquicos, estão se estabelecendo.
Tradicionalmente é comum os manuais de administração defenderem que as relações dentro das organizações sejam impessoais e pautadas por interesses puramente profissionais. Os códigos de ética associam, muitas vezes explicitamente, relações de amizade a potenciais conflitos de interesse. Nada mais falso. Só a devida responsabilização de indivíduos independentes e autônomos, que se entendam e compartilhem princípios vai construir um novo ambiente empresarial essencialmente ético e não apenas impositivamente moralista. Tenhamos isso em conta na reconstrução da reputação das empresas envolvidas nos episódios recentes.
Mas quem está mesmo nos ensinando o caminho para essa nova cultura empresarial são as startups e as empresas inovadoras. São empreendimentos formados, na maioria, por companheiros que misturam o profissional e o pessoal, a diversão e o trabalho de maneira quase imperceptível e com resultados exponencialmente positivos.
Lemann e Buffett não são nada mais do que o reflexo de um capitalismo em transformação: mais social, menos hierárquico, mais inclusivo e feito por profissionais eticamente afinados. Ainda não estamos lá e o caminho pode ser longo, mas é claramente um sonho grande em gestação.