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Por que Bolsonaro fala tanto?

Com os pés cada vez mais fora do sistema político tradicional, o presidente recorre ao contato direto com o público

Jair Bolsonaro: os dez pronunciamentos públicos de Bolsonaro até agora são mais do que qualquer outro presidente desde 1988 (NurPhoto/Getty Images)
KM

Karla Mamona

Publicado em 10 de abril de 2020 às 09h58.

Durante os últimos trinta anos, acostumamo-nos com presidentes pouco afeitos a questionamentos de jornalistas durante entrevistas coletivas. FHC, Lula, Dilma e Temer foram mal neste quesito. Bolsonaro também. Sempre que se vê diante de profissionais da imprensa, faz ironias, divaga – e até já levou um comediante para “responder” perguntas do lado de fora do Palácio do Planalto.

Ontem, como em outras nove ocasiões desde que assumiu o cargo, Bolsonaro comunicou-se diretamente com o povo pela televisão. Elogiou o médico Roberto Kalil, que confessou ter tomado cloroquina para se livrar da covid-19, e reafirmou que a preocupação do governo é atacar, ao mesmo tempo, os riscos do vírus para a saúde e a economia. Ao dizer que desemprego também mata, expressou preferência pela estratégia de acabar, rapidamente, com o isolamento social. (Pouco depois, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, decidiu que o governo federal não pode desautorizar medidas desse tipo nos estados e municípios.)

Os dez pronunciamentos públicos de Bolsonaro até agora são mais do que qualquer outro presidente desde 1988 no mesmo período – os quinze primeiros meses de governo. Faz sentido. De acordo com as pesquisadoras Alexandra Cockerham, Amanda Driscoll e Joan Joseph, presidentes que são “outsiders” do sistema político comunicam-se, de fato, de modo mais direto com a população do que aqueles que pertencem ao establishment. (O artigo “Going Public” in Comparative Perspective: Presidents’ Public Appeals under Pure Presidentialism” foi publicado na Presidential Studies Quarterly em 2019.)

Alguns afirmam que comparar a crise da covid-19 a tempos de guerra é um exagero. No período em que a Luftwaffe de Adolf Hitler bombardeou Londres na Segunda Guerra Mundial, o primeiro-ministro inglês, Winston Churchill, fez 17 discursos. Em um deles, poucos meses antes das primeiras bombas, Churchill referiu-se à evacuação de 300 mil soldados britânicos em franceses em Dunkirk com sobriedade: “Guerras não são vencidas por retiradas”.

Desta vez, ele não estaria totalmente certo.

( Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV.)

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Durante os últimos trinta anos, acostumamo-nos com presidentes pouco afeitos a questionamentos de jornalistas durante entrevistas coletivas. FHC, Lula, Dilma e Temer foram mal neste quesito. Bolsonaro também. Sempre que se vê diante de profissionais da imprensa, faz ironias, divaga – e até já levou um comediante para “responder” perguntas do lado de fora do Palácio do Planalto.

Ontem, como em outras nove ocasiões desde que assumiu o cargo, Bolsonaro comunicou-se diretamente com o povo pela televisão. Elogiou o médico Roberto Kalil, que confessou ter tomado cloroquina para se livrar da covid-19, e reafirmou que a preocupação do governo é atacar, ao mesmo tempo, os riscos do vírus para a saúde e a economia. Ao dizer que desemprego também mata, expressou preferência pela estratégia de acabar, rapidamente, com o isolamento social. (Pouco depois, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, decidiu que o governo federal não pode desautorizar medidas desse tipo nos estados e municípios.)

Os dez pronunciamentos públicos de Bolsonaro até agora são mais do que qualquer outro presidente desde 1988 no mesmo período – os quinze primeiros meses de governo. Faz sentido. De acordo com as pesquisadoras Alexandra Cockerham, Amanda Driscoll e Joan Joseph, presidentes que são “outsiders” do sistema político comunicam-se, de fato, de modo mais direto com a população do que aqueles que pertencem ao establishment. (O artigo “Going Public” in Comparative Perspective: Presidents’ Public Appeals under Pure Presidentialism” foi publicado na Presidential Studies Quarterly em 2019.)

Alguns afirmam que comparar a crise da covid-19 a tempos de guerra é um exagero. No período em que a Luftwaffe de Adolf Hitler bombardeou Londres na Segunda Guerra Mundial, o primeiro-ministro inglês, Winston Churchill, fez 17 discursos. Em um deles, poucos meses antes das primeiras bombas, Churchill referiu-se à evacuação de 300 mil soldados britânicos em franceses em Dunkirk com sobriedade: “Guerras não são vencidas por retiradas”.

Desta vez, ele não estaria totalmente certo.

( Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV.)

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