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Em dois livros, os métodos de Bolsonaro e Trump

Obras de Thaís Oyama, no Brasil, e de Philip Rucker e Carol Leonnig, nos EUA, mostram o improviso – às vezes sem tutela – dos presidentes mais polêmicos do mundo

BOLSONARO E TRUMP: o brasileiro protege sua prole; o americano se preocupa com a própria pele | Alex Wong/Getty Images /
BOLSONARO E TRUMP: o brasileiro protege sua prole; o americano se preocupa com a própria pele | Alex Wong/Getty Images /
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Sérgio Praça

Publicado em 23 de janeiro de 2020 às, 11h27.

Escrever um livro sobre um governo que não terminou é um desafio imenso. Nenhuma fonte – ministro, deputado, burocrata – tem o distanciamento necessário que o tempo traz. Estão dominados pelos próprios interesses. Querem avançar alguma proposta legislativa e bloquear outras. Em suma: são pouco confiáveis. O jornalista pode optar por comprar a versão de uma fonte muito bem-posicionada, que lhe dará acesso total, em troca da defesa de suas teses na obra. Esse método foi utilizado pelo elogiadíssimo Bob Woodward em quase todos os seus livros sobre política americana.

Dois livros lançados nessa semana tinham enorme potencial para usar a mesma tática. São “Tormenta – o governo Bolsonaro: crises, intrigas e segredos” (Companhia das Letras, 2020), de Thaís Oyama, e “A very stable genius: Donald J. Trump’s testing of America” (Penguin Press, 2020), de Philip Rucker e Carol Leonnig, jornalistas do Washington Post. Felizmente, os autores não recorreram ao método de Woodward. Talvez por competência. E talvez porque algo que Bolsonaro e Trump têm de semelhante é que as agendas de quem são próximos a eles não são suficientemente claras para que um autor compre a versão em troca de acesso. Os dois livros demonstram, também, que esses presidentes agem mais por impulso do que se acreditava até agora – e já era bastante.

No livro de Oyama – que é muito bem-organizado –, um dos principais exemplos disso é o relato sobre como Bolsonaro veio a escolher o PSL para se candidatar à presidência em 2018. O então deputado estava a caminho de uma celebração com o PEN (Partido Ecológico Nacional), a sigla com quem negociara boas condições para sua candidatura. Pouco antes do evento, recebeu uma ligação do então senador Magno Malta (PR), alertando que o PEN estava contestando, no Supremo Tribunal Federal, a prisão após julgamento em segunda instância. O futuro presidente estaria entrando em um partido com posicionamento público favorável a Lula. Bolsonaro pegou o microfone, foi escorregadio e de lá saiu com o trato quebrado.

É um dos poucos casos relatados em “Tormenta” no qual generais não tutelam o presidente. Atuariam, nas palavras do general Alberto Heleno, como um “Poder Moderador”. As piores ideias de Bolsonaro seriam bloqueadas pelo bom senso da tropa do capitão. Mas há uma pedra apelidada de Carluxo no caminho. O ímpeto protetor de Bolsonaro colocou os militares em confronto direto com seu filho. Mas, ao contrário de Trump, nosso presidente parece aprender com alguns de seus erros.

Donald Trump é, no livro de Rucker e Leonnig, um pai menos zeloso. Não defende Donald Trump Jr. das acusações (documentadíssimas) de que tentou comprar informações sobre Hillary Clinton de uma informante do governo russo. Preocupa-se mais com a própria pele. Os jornalistas relatam a dificuldade do presidente para encontrar um advogado que topasse defendê-lo das acusações de conluio com os russos para ganhar a eleição de 2016. Mais do que Bolsonaro, Trump espera lealdade completa de seus subordinados.

Mas aí entra a força das instituições políticas norte-americanas. Surpreendentemente, é uma instituição informal que mais detém os impulsos de Trump: a independência de órgãos burocráticos em relação ao presidente. Isso é uma “instituição informal” porque não é, com frequência, uma independência definida em lei – e sim por um acordo tácito entre os integrantes do jogo político. Trump ficou frustrado com razão. Ele queria demitir o diretor do FBI que não havia demonstrado suficiente lealdade. Foi avisado de que o ato seria considerado absurdo. Demitiu mesmo assim, argumentando que John F. Kennedy tinha até indicado seu irmão, Robert, para ser ministro da Justiça. Pois é, presidente, respondeu um assessor. Desde Watergate as coisas são diferentes.

(Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV.)