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Aécio Neves e o fechamento do espaço político

Em jantar de políticos nesta semana, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) fez um desabafo com seus colegas: “Abriremos espaço para um salvador da pátria [nas eleições presidenciais de 2018]?”. A preocupação do senador é compartilhada pela classe política hoje dominante. Partidos como PMDB, PT, PSDB, PP e outros de menor porte passaram (pelo menos) as […]

AÉCIO NEVES: senador tucano é denunciado pela Procuradoria-Geral da República / Evaristo Sá/AFP (Evaristo Sá/AFP)
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Da Redação

Publicado em 10 de março de 2017 às 19h33.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h23.

Em jantar de políticos nesta semana, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) fez um desabafo com seus colegas: “Abriremos espaço para um salvador da pátria [nas eleições presidenciais de 2018]?”. A preocupação do senador é compartilhada pela classe política hoje dominante. Partidos como PMDB, PT, PSDB, PP e outros de menor porte passaram (pelo menos) as duas últimas décadas beneficiando-se de financiamento ilegal em suas campanhas eleitorais. Com a Operação Lava-Jato (e também antes, com o Mensalão, no caso petista), políticos passaram a ser presos e responsabilizados por seus crimes pela Justiça. Mais do que nunca, toda a classe política está sob suspeita. A chance de um candidato “aventureiro” ser eleito ano que vem é real.

Sem querer, a frase de Aécio é bastante reveladora sobre o propósito da corrupção no sistema político. Ele e Fernando Henrique Cardoso, entre outros, afirmaram que é menos grave roubar para custear campanhas políticas do que para outros propósitos. Afinal, todos os políticos fazem assim. Sem corrupção, presume-se, o PSDB não teria chances. Como sociólogo, FHC sabe bem que a “legitimação pelo procedimento” (conceito de Niklas Luhmann) não serve como justificativa moral. Mas o fato que descrevem é verdadeiro. Corrupção é mais regra do que exceção no financiamento de campanhas. Ao revelar detalhes da conexão entre empresas e políticos, a Lava-Jato os impede de negar o óbvio.

Aécio e FHC esquecem, de modo conveniente, que os partidos não estão em pé de igualdade no início de cada campanha. Ao contrário. Imaginemos dois partidos, PA e PB. PA é da coalizão de governo e tem duas secretarias (ou ministérios) na área social. PB é um partido de oposição, sem cargos no governo. Nas próximas eleições, PA terá tido a chance de beneficiar eleitores diretamente, e também de beneficiar seus doadores (legais e ilegais) através de decisões regulatórias ou mais concretas, como licitações direcionadas. PB não terá tido nada disso. Mesmo assim, uma empresa pode decidir financiar ambos ilegalmente. Será com a mesma quantia? Dificilmente. Afinal, PA tem melhores argumentos para pedir dinheiro. Os benefícios para a empresa já foram realizados. PB pode argumentar que continuará os esquemas, mas talvez seja “cheap talk”. E se, ao chegar ao poder, PB decide auditar todos os contratos feitos no governo anterior?

Está claro, então, que partidos que compõem o governo partem de uma posição vantajosa com relação aos demais. Terão mais financiamento legal e ilegal para suas campanhas. Com isso, aumentarão suas chances de permanecer no poder. Já citei, neste espaço, um texto dos cientistas políticos Ivan Jucá, Marcus Melo e Lucio Rennó, publicado no Journal of Politics in Latin America no início do ano. Eles mostram que deputados implicados em escândalos de corrupção obtêm segurança eleitoral na medida em que gastam acima de certa quantia, considerando apenas gastos legalmente declarados. Ou seja: os corruptos conseguem “fechar espaço” contra possíveis “salvadores da pátria”.

Este quadro é o que o cientista político Michael Johston, em seu excelente Syndromes of Corruption (Cambridge University Press, 2005), chama de “cartéis de elite”. O termo não se refere a cartéis empresariais como o que vitimou a Petrobras nas últimas décadas, mas sim a uma hegemonia de grupos políticos, empresários e burocratas que tentam permanecer em suas posições de poder mesmo com crescente competição eleitoral e instituições relativamente fortes. Nosso sistema eleitoral para o Legislativo é de representação proporcional com lista aberta, tido internacionalmente como um dos mais abertos para a entrada de competidores. Isso aumenta o custo das campanhas.

Tirar o cartel hegemônico do poder não é fácil. A oposição brasileira é débil em todos os níveis – municipal, estadual e federal. Para diminuir a corrupção, é preciso criminalizar os comportamentos ilegais (como o STF fez nesta semana, em sua decisão sobre o financiamento de campanha [legal, mas com propósitos corruptos] do senador Valdir Raupp [PMDB). E continuar prestigiando as instituições de combate à corrupção, como o Ministério Público, Polícia Federal, Ministério da Transparência e Tribunal de Contas da União. Ou então seremos condenados a imaginar políticos cantando “meu fechamento é você” para empresários.

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Sem querer, a frase de Aécio é bastante reveladora sobre o propósito da corrupção no sistema político. Ele e Fernando Henrique Cardoso, entre outros, afirmaram que é menos grave roubar para custear campanhas políticas do que para outros propósitos. Afinal, todos os políticos fazem assim. Sem corrupção, presume-se, o PSDB não teria chances. Como sociólogo, FHC sabe bem que a “legitimação pelo procedimento” (conceito de Niklas Luhmann) não serve como justificativa moral. Mas o fato que descrevem é verdadeiro. Corrupção é mais regra do que exceção no financiamento de campanhas. Ao revelar detalhes da conexão entre empresas e políticos, a Lava-Jato os impede de negar o óbvio.

Aécio e FHC esquecem, de modo conveniente, que os partidos não estão em pé de igualdade no início de cada campanha. Ao contrário. Imaginemos dois partidos, PA e PB. PA é da coalizão de governo e tem duas secretarias (ou ministérios) na área social. PB é um partido de oposição, sem cargos no governo. Nas próximas eleições, PA terá tido a chance de beneficiar eleitores diretamente, e também de beneficiar seus doadores (legais e ilegais) através de decisões regulatórias ou mais concretas, como licitações direcionadas. PB não terá tido nada disso. Mesmo assim, uma empresa pode decidir financiar ambos ilegalmente. Será com a mesma quantia? Dificilmente. Afinal, PA tem melhores argumentos para pedir dinheiro. Os benefícios para a empresa já foram realizados. PB pode argumentar que continuará os esquemas, mas talvez seja “cheap talk”. E se, ao chegar ao poder, PB decide auditar todos os contratos feitos no governo anterior?

Está claro, então, que partidos que compõem o governo partem de uma posição vantajosa com relação aos demais. Terão mais financiamento legal e ilegal para suas campanhas. Com isso, aumentarão suas chances de permanecer no poder. Já citei, neste espaço, um texto dos cientistas políticos Ivan Jucá, Marcus Melo e Lucio Rennó, publicado no Journal of Politics in Latin America no início do ano. Eles mostram que deputados implicados em escândalos de corrupção obtêm segurança eleitoral na medida em que gastam acima de certa quantia, considerando apenas gastos legalmente declarados. Ou seja: os corruptos conseguem “fechar espaço” contra possíveis “salvadores da pátria”.

Este quadro é o que o cientista político Michael Johston, em seu excelente Syndromes of Corruption (Cambridge University Press, 2005), chama de “cartéis de elite”. O termo não se refere a cartéis empresariais como o que vitimou a Petrobras nas últimas décadas, mas sim a uma hegemonia de grupos políticos, empresários e burocratas que tentam permanecer em suas posições de poder mesmo com crescente competição eleitoral e instituições relativamente fortes. Nosso sistema eleitoral para o Legislativo é de representação proporcional com lista aberta, tido internacionalmente como um dos mais abertos para a entrada de competidores. Isso aumenta o custo das campanhas.

Tirar o cartel hegemônico do poder não é fácil. A oposição brasileira é débil em todos os níveis – municipal, estadual e federal. Para diminuir a corrupção, é preciso criminalizar os comportamentos ilegais (como o STF fez nesta semana, em sua decisão sobre o financiamento de campanha [legal, mas com propósitos corruptos] do senador Valdir Raupp [PMDB). E continuar prestigiando as instituições de combate à corrupção, como o Ministério Público, Polícia Federal, Ministério da Transparência e Tribunal de Contas da União. Ou então seremos condenados a imaginar políticos cantando “meu fechamento é você” para empresários.

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