Metaverso ou Meta Avesso
O advento do Metaverso e suas potenciais catastróficas consequências não-intencionais
Da Redação
Publicado em 20 de abril de 2022 às 14h05.
Última atualização em 20 de abril de 2022 às 14h06.
Se em 1999 alguém dissesse que receber uma ligação telefônica causaria surpresa e até certa irritação, que seria usual mensagem de texto (ou áudio) ao invés de uma conversa em tempo real, seria tratado com surpresa ou ceticismo.
Essa realidade comportamental é mais uma das consequências não-intencionais trazidas pela tecnologia e suas redes sociais. Mas está aí e será difícil reverter esse “modus operandi”, especialmente para gerações que aprenderam a se comunicar desse jeito.
Quando a internet surgiu, trouxe promessas de reduzir a distância entre as pessoas, de criar espaço para pluralidade e liberdade. O sonho da aldeia global parecia próximo de virar realidade.
É verdade que participamos da guerra na Ucrânia quase em tempo real, que temos amigos virtuais em diversos países e que passeamos pelas ruas de Paris sem sair de casa. As videochamadas, ficção científica décadas atrás, são uma realidade para bilhões de pessoas que dispõem de um smartphone.
A redução das distâncias físicas também trouxe a queda da fronteira entre o público e o privado, uma explosão de voyeurismo global, sem necessariamente aproximar pessoas através de relações mais profundas e satisfatórias. O número exponencialmente maior de conexões não significou aprofundamento das relações; ao contrário, a intimidade é evitada como pecado.
O Metaverso está próximo e os titãs da tecnologia investem pesadamente para criar seus mundos virtuais. A Microsoft pagou mais de 60 bilhões de dólares (sim, bilhões) por uma empresa de videogames; Facebook, Apple e Amazon também investem dezenas de bilhões de dólares no desenvolvimento de seus mundos virtuais.
Para simplificar: um metaverso é um espaço onde os humanos podem participar de um universo virtual compartilhado. O termo originou-se do romance “Snow Crash”, de Neal Stephenson, no qual os humanos interagem uns com os outros, como avatares, em um espaço 3D.
Nesse espaço virtual, as pessoas, através de seus avatares, terão experiências cada vez mais próximas da realidade como hoje a percebemos.
Através da utilização de sensores e aparelhos usados no corpo humano, sensações serão simuladas e provocadas nas interações virtuais.
É importante salientar que os novos mundos virtuais em desenvolvimento terão réplicas do mundo contemporâneo, ou seja, seu avatar poderá passear pelo museu do Museu Hermitage, em São Petersburgo, atravessar seus corredores, parar em frente a certa obra, perceber seus detalhes em terceira dimensão, cruzar com outros avatares e com eles interagir.
Do ponto de vista cultural, esse avanço tecnológico parece uma excelente ideia, mas chamo atenção para consequências não-intencionais e seus riscos. Não podemos esquecer que a experiência nesses mundos virtuais poderá ser aditiva, modificar comportamentos e costumes, a exemplo do que aconteceu com as conversas por telefone, só que em uma escala absurdamente maior e potencialmente mais perigosa.
Para ficar com alguns exemplos:
- Seu avatar poderá ter o gênero que você desejar e viver uma realidade em cada mundo virtual escolhido;
- Você poderá ter um emprego remunerado em criptomoeda no Metaverso e estar desempregado no mundo real;
- Você poderá ser proprietário de uma mansão vizinha a de seu ídolo no Metaverso e viver em um desconfortável quarto alugado;
- Crimes no Metaverso serão punidos e haverá prisões para avatares transgressores, ou seja, você poderá estar livre e seu avatar confinado. A recíproca também será possível;
- Você participará de reuniões no metaverso, cumprimentará outros avatares, trocará abraços, sorrisos e beijos, sem enfrentar trânsito ou qualquer inconveniência;
- Com vestimentas e sensores especiais, o toque entre avatares terá o respectivo efeito em seus donos. Isso, obviamente, trará questões entre as relações existentes, especialmente no que diz respeito ao conceito de traição e à necessidade de interagir presencialmente.
As relações humanas foram extremamente impactadas pela internet, sentimos os efeitos deletérios das redes sociais, do crescimento da intolerância, da cultura de personalidade que privilegia aparências em detrimento de essência e caráter.
Os efeitos da exposição contínua a celulares estão sendo estudados, mas é indiscutível o impacto sobre a psique humana pelo uso exagerado e pela preferência do dispositivo eletrônico a experiências de contato direto com o mundo real, com a natureza e com outras pessoas. Crianças viciadas em videogames, presas aos aparelhos, confinadas em quartos e adultos viciados em interações virtuais, incapazes de relações afetivas. Ano após ano, mundialmente, aumentam a depressão e número de suicídios.
Loucura é a incapacidade de distinguir entre realidade e fantasia. Em mundos virtuais cada vez mais próximos do mundo real, talvez a fronteira entre realidade e fantasia possa desaparecer.
Verdade e realidade nunca foram prioridade para o homo sapiens e, com o advento do Metaverso, talvez estejamos diante de uma gigantesca caixa de Pandora que revelará o pior que temos e afastará o melhor que somos. E assim criará, como diz o compositor baiano: o avesso do avesso do avesso do avesso.
Se em 1999 alguém dissesse que receber uma ligação telefônica causaria surpresa e até certa irritação, que seria usual mensagem de texto (ou áudio) ao invés de uma conversa em tempo real, seria tratado com surpresa ou ceticismo.
Essa realidade comportamental é mais uma das consequências não-intencionais trazidas pela tecnologia e suas redes sociais. Mas está aí e será difícil reverter esse “modus operandi”, especialmente para gerações que aprenderam a se comunicar desse jeito.
Quando a internet surgiu, trouxe promessas de reduzir a distância entre as pessoas, de criar espaço para pluralidade e liberdade. O sonho da aldeia global parecia próximo de virar realidade.
É verdade que participamos da guerra na Ucrânia quase em tempo real, que temos amigos virtuais em diversos países e que passeamos pelas ruas de Paris sem sair de casa. As videochamadas, ficção científica décadas atrás, são uma realidade para bilhões de pessoas que dispõem de um smartphone.
A redução das distâncias físicas também trouxe a queda da fronteira entre o público e o privado, uma explosão de voyeurismo global, sem necessariamente aproximar pessoas através de relações mais profundas e satisfatórias. O número exponencialmente maior de conexões não significou aprofundamento das relações; ao contrário, a intimidade é evitada como pecado.
O Metaverso está próximo e os titãs da tecnologia investem pesadamente para criar seus mundos virtuais. A Microsoft pagou mais de 60 bilhões de dólares (sim, bilhões) por uma empresa de videogames; Facebook, Apple e Amazon também investem dezenas de bilhões de dólares no desenvolvimento de seus mundos virtuais.
Para simplificar: um metaverso é um espaço onde os humanos podem participar de um universo virtual compartilhado. O termo originou-se do romance “Snow Crash”, de Neal Stephenson, no qual os humanos interagem uns com os outros, como avatares, em um espaço 3D.
Nesse espaço virtual, as pessoas, através de seus avatares, terão experiências cada vez mais próximas da realidade como hoje a percebemos.
Através da utilização de sensores e aparelhos usados no corpo humano, sensações serão simuladas e provocadas nas interações virtuais.
É importante salientar que os novos mundos virtuais em desenvolvimento terão réplicas do mundo contemporâneo, ou seja, seu avatar poderá passear pelo museu do Museu Hermitage, em São Petersburgo, atravessar seus corredores, parar em frente a certa obra, perceber seus detalhes em terceira dimensão, cruzar com outros avatares e com eles interagir.
Do ponto de vista cultural, esse avanço tecnológico parece uma excelente ideia, mas chamo atenção para consequências não-intencionais e seus riscos. Não podemos esquecer que a experiência nesses mundos virtuais poderá ser aditiva, modificar comportamentos e costumes, a exemplo do que aconteceu com as conversas por telefone, só que em uma escala absurdamente maior e potencialmente mais perigosa.
Para ficar com alguns exemplos:
- Seu avatar poderá ter o gênero que você desejar e viver uma realidade em cada mundo virtual escolhido;
- Você poderá ter um emprego remunerado em criptomoeda no Metaverso e estar desempregado no mundo real;
- Você poderá ser proprietário de uma mansão vizinha a de seu ídolo no Metaverso e viver em um desconfortável quarto alugado;
- Crimes no Metaverso serão punidos e haverá prisões para avatares transgressores, ou seja, você poderá estar livre e seu avatar confinado. A recíproca também será possível;
- Você participará de reuniões no metaverso, cumprimentará outros avatares, trocará abraços, sorrisos e beijos, sem enfrentar trânsito ou qualquer inconveniência;
- Com vestimentas e sensores especiais, o toque entre avatares terá o respectivo efeito em seus donos. Isso, obviamente, trará questões entre as relações existentes, especialmente no que diz respeito ao conceito de traição e à necessidade de interagir presencialmente.
As relações humanas foram extremamente impactadas pela internet, sentimos os efeitos deletérios das redes sociais, do crescimento da intolerância, da cultura de personalidade que privilegia aparências em detrimento de essência e caráter.
Os efeitos da exposição contínua a celulares estão sendo estudados, mas é indiscutível o impacto sobre a psique humana pelo uso exagerado e pela preferência do dispositivo eletrônico a experiências de contato direto com o mundo real, com a natureza e com outras pessoas. Crianças viciadas em videogames, presas aos aparelhos, confinadas em quartos e adultos viciados em interações virtuais, incapazes de relações afetivas. Ano após ano, mundialmente, aumentam a depressão e número de suicídios.
Loucura é a incapacidade de distinguir entre realidade e fantasia. Em mundos virtuais cada vez mais próximos do mundo real, talvez a fronteira entre realidade e fantasia possa desaparecer.
Verdade e realidade nunca foram prioridade para o homo sapiens e, com o advento do Metaverso, talvez estejamos diante de uma gigantesca caixa de Pandora que revelará o pior que temos e afastará o melhor que somos. E assim criará, como diz o compositor baiano: o avesso do avesso do avesso do avesso.