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A transformação digital, o elixir da juventude e outras promessas

O prometido ganho de eficiência trazido pela transformação digital pode nada significar se o modelo de negócio estiver ferido pela pandemia

A partir de agora, o Brasil protegerá marcas registradas de 120 países que participam do protocolo de Madri (Marc Mcdermott / EyeEm/Getty Images)
JR

Janaína Ribeiro

Publicado em 8 de junho de 2020 às 15h42.

Última atualização em 9 de junho de 2020 às 11h12.

Quem, como eu, já vive o mundo dos negócios no Brasil há mais de três décadas tem um estoque de crises na memória, muitas cicatrizes e uma lista de hidroxicloroquinas corporativas para contar.

Em cada desastre prolongado aparece uma solução que aponta o caminho da salvação, acompanhada de palavras chiques (normalmente grafadas em inglês)  significando  coisas diferentes para clientes potenciais diferentes, que trazem uma certa mística salvadora.

Foi assim com os famosos Just-In-Time, Downsinzing, Data Mining, Knowledge Management, Cloud Computing, Big Data, e a lista não para aqui. A bola da vez é a famosa Digital Transformation.

Acrescentar um adjetivo ao poderoso substantivo transformação parece um exercício perigoso. Transformação é absoluta em seu significado e, para ser real, tem que ser de dentro para fora e sendo assim dispensaria adjetivos; mas o marketing não vive sem adjetivos, nem promessas, nem sonhos.

Dizia meu antigo professor de mestrado que tecnologia é apenas uma ferramenta, que mal utilizada, fará  você chegar mais rápido ao lugar errado. Temo que a banalização da transformação digital prometa ouro a garimpeiros, vendendo pás e picaretas mas sem a certeza, para os compradores, de haver ou não uma mina de verdade na montanha prometida.

Antes de adotar uma saída digital para seu negócio, o empresário, independente de seu tamanho, precisa avaliar o real impacto da pandemia sobre o seu modelo de negócio e suas chances reais nesse hostil mundo de negócios brasileiro.

Olhar para a tecnologia como salvação me parece um vício de origem que pode trazer perda de tempo e desperdício de recursos tão escassos. O prometido ganho de eficiência trazido pela tal transformação pode nada significar se o modelo de negócio (ou o segmento) estiver ferido de morte pela pandemia.

De nada adiantaria um fabricante de carruagens, em 1910, aumentar sua eficiência (produzindo modelos mais fortes e ágeis) quando o automóvel era o cavaleiro do apocalipse para aquela indústria.

Vejo a capacidade de ler e acessar a realidade, a criatividade e resiliência de pequenos empresários brasileiros como elementos anteriores ao mergulho na piscina da suposta transformação digital, que tantos vendedores de soluções digitais oferecem como o novo Elixir da Juventude.

Lembro novamente meu mestre, que dizia ser a tecnologia apenas uma ferramenta. Primeiro o assessment da real situação, depois um diagnóstico e mais tarde o remédio. Definir primeiro o remédio não funciona nem aqui, terra das jabuticabas.

Indo no caminho oposto, testemunhei histórias reais nessas últimas semanas, como a da pequena empresária Regina Trentini, do Bouquet de Maguet (@bouquetdemuguet) que fornecia doces sofisticados para festas de luxo, e viu seu mercado evaporar, passando a vender hambúrgueres gourmet, antes mesmo de turbinar o seu Instagram. Sem um novo produto ajustado à realidade imposta, a tecnologia pouco ajudaria.

Ou a história da empresária Renata Piazzalunga,da loja de produtos de design produzidos com sustentabilidade Fellicia (@felliciaoficial), que na ausência do canal de distribuição provido por seus clientes lojistas, buscou uma parceria com uma empresa de logística que garantisse o trânsito dos seus produtos, vital para sua sobrevivência antes de ampliar sua presença online com lives.

Há casos, sim, que a solução tecnológica é determinante para a continuidade do negócio face ao novo cenário, como o exemplo da diretora de Dublagem Sandra Mara, que improvisou um pequeno estúdio em sua casa (apesar de todas as dificuldades encontradas com a nossa banda larga) ao entender que era o único meio de continuar a trabalhar durante a quarentena. E funcionou!

As histórias tem inúmeros outros nomes e endereços mas a questão principal é entender que não existe uma solução que atenda todo mundo, que no meio da crise há sempre alguém querendo vender poções mágicas e o primeiro passo é saber se seu negócio fica de pé com o que você tinha a oferecer antes do meteoro nos atingir.

Pense nisso antes de comprar powerpoints de futurologia e promessas de uma juventude eterna.

Sérgio Cavalcanti é empreendedor, é CEO e fundador da NationSoft Tecnologia

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Quem, como eu, já vive o mundo dos negócios no Brasil há mais de três décadas tem um estoque de crises na memória, muitas cicatrizes e uma lista de hidroxicloroquinas corporativas para contar.

Em cada desastre prolongado aparece uma solução que aponta o caminho da salvação, acompanhada de palavras chiques (normalmente grafadas em inglês)  significando  coisas diferentes para clientes potenciais diferentes, que trazem uma certa mística salvadora.

Foi assim com os famosos Just-In-Time, Downsinzing, Data Mining, Knowledge Management, Cloud Computing, Big Data, e a lista não para aqui. A bola da vez é a famosa Digital Transformation.

Acrescentar um adjetivo ao poderoso substantivo transformação parece um exercício perigoso. Transformação é absoluta em seu significado e, para ser real, tem que ser de dentro para fora e sendo assim dispensaria adjetivos; mas o marketing não vive sem adjetivos, nem promessas, nem sonhos.

Dizia meu antigo professor de mestrado que tecnologia é apenas uma ferramenta, que mal utilizada, fará  você chegar mais rápido ao lugar errado. Temo que a banalização da transformação digital prometa ouro a garimpeiros, vendendo pás e picaretas mas sem a certeza, para os compradores, de haver ou não uma mina de verdade na montanha prometida.

Antes de adotar uma saída digital para seu negócio, o empresário, independente de seu tamanho, precisa avaliar o real impacto da pandemia sobre o seu modelo de negócio e suas chances reais nesse hostil mundo de negócios brasileiro.

Olhar para a tecnologia como salvação me parece um vício de origem que pode trazer perda de tempo e desperdício de recursos tão escassos. O prometido ganho de eficiência trazido pela tal transformação pode nada significar se o modelo de negócio (ou o segmento) estiver ferido de morte pela pandemia.

De nada adiantaria um fabricante de carruagens, em 1910, aumentar sua eficiência (produzindo modelos mais fortes e ágeis) quando o automóvel era o cavaleiro do apocalipse para aquela indústria.

Vejo a capacidade de ler e acessar a realidade, a criatividade e resiliência de pequenos empresários brasileiros como elementos anteriores ao mergulho na piscina da suposta transformação digital, que tantos vendedores de soluções digitais oferecem como o novo Elixir da Juventude.

Lembro novamente meu mestre, que dizia ser a tecnologia apenas uma ferramenta. Primeiro o assessment da real situação, depois um diagnóstico e mais tarde o remédio. Definir primeiro o remédio não funciona nem aqui, terra das jabuticabas.

Indo no caminho oposto, testemunhei histórias reais nessas últimas semanas, como a da pequena empresária Regina Trentini, do Bouquet de Maguet (@bouquetdemuguet) que fornecia doces sofisticados para festas de luxo, e viu seu mercado evaporar, passando a vender hambúrgueres gourmet, antes mesmo de turbinar o seu Instagram. Sem um novo produto ajustado à realidade imposta, a tecnologia pouco ajudaria.

Ou a história da empresária Renata Piazzalunga,da loja de produtos de design produzidos com sustentabilidade Fellicia (@felliciaoficial), que na ausência do canal de distribuição provido por seus clientes lojistas, buscou uma parceria com uma empresa de logística que garantisse o trânsito dos seus produtos, vital para sua sobrevivência antes de ampliar sua presença online com lives.

Há casos, sim, que a solução tecnológica é determinante para a continuidade do negócio face ao novo cenário, como o exemplo da diretora de Dublagem Sandra Mara, que improvisou um pequeno estúdio em sua casa (apesar de todas as dificuldades encontradas com a nossa banda larga) ao entender que era o único meio de continuar a trabalhar durante a quarentena. E funcionou!

As histórias tem inúmeros outros nomes e endereços mas a questão principal é entender que não existe uma solução que atenda todo mundo, que no meio da crise há sempre alguém querendo vender poções mágicas e o primeiro passo é saber se seu negócio fica de pé com o que você tinha a oferecer antes do meteoro nos atingir.

Pense nisso antes de comprar powerpoints de futurologia e promessas de uma juventude eterna.

Sérgio Cavalcanti é empreendedor, é CEO e fundador da NationSoft Tecnologia
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