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Justiça social e nova economia: é hora de dar poder de decisão para diferentes vozes

O Brasil atingiu o pior índice de desigualdade das últimas duas décadas a partir de quatro aspectos: econômico, racial, regional e de gênero

Full length side view of young man and woman walking towards white ladders against coral background (Klaus Vedfelt/Getty Images)
Full length side view of young man and woman walking towards white ladders against coral background (Klaus Vedfelt/Getty Images)
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Rodrigo Santini

Publicado em 4 de novembro de 2022 às, 15h49.

Por Rodrigo Santini, Adriana Barbosa e Sérgio Serapião*

A diversidade corporativa é uma das ferramentas de gestão e desenvolvimento de negócios mais promissoras a curto, médio e longo prazo. Negócios são pensados e realizados por pessoas e para pessoas. A representatividade, além de necessária para a redução da desigualdade social, é fundamental para a sustentabilidade dos negócios. Uma equipe diversa tende a ter diferentes ideias, desenvolver melhores produtos e ter representatividade no mercado, o que impacta diretamente (e positivamente) nos lucros. Enquanto algumas empresas se comprometem com a pauta e comprovam os impactos positivos, a maioria ainda não começou a dar os primeiros passos.

O Brasil atingiu o pior índice de desigualdade das últimas duas décadas (1% da população mais rica concentrou 49,6% de toda a riqueza do país de acordo com relatório do Credit Suisse), a partir de quatro aspectos: ​​econômico, racial, regional e de gênero. E isso leva a injustiças sociais, favorecendo pessoas ou empresas que detém privilégios, gerando um desequilíbrio de renda inconcebível para um país que está entre as 10 melhores economias do mundo. E quem pode mudar esse cenário? Recentemente a agência Edelman divulgou o resultado de uma pesquisa global confirmando que a instituição que o brasileiro mais confia são as empresas, com 64% de credibilidade - seguida por 60% para ONGs, 47% para mídia e apenas 34% para o Governo. Isso mostra que o compromisso das empresas com a redução das desigualdades é um caminho muito sólido para os impactos positivos e para serem guias nessas mudanças urgentes de reestruturação da sociedade.

Analisando do ponto de vista econômico, ao investir em diversidade ninguém sai perdendo, mas o capitalismo de stakeholders vai além dos resultados financeiros. Trata-se, principalmente, de ter a  representação de interesses de toda a sociedade dentro da empresa. Em um país em que, segundo dados do IBGE, 54% da população é negra, chegar em ambientes corporativos, olhar para os lados e não reconhecer esse cenário, nos mostra que o problema é grave.

O compromisso de empresas com a transformação social passa pela composição de um conselho de administração diverso, capaz de pensar os impactos dos negócios no território ou setor onde atua, mas também precisa de lideranças que impulsionem verdadeiras mudanças e facilitem o empoderamento dos indivíduos na jornada de autoestima profissional. Do ponto de vista da cultura organizacional, é importante ampliar canais de comunicação para uma equipe questionadora e engajada com a inovação na prática, gerar oportunidades de capacitação da equipe e ser rede de apoio.

Uma consulta pública da B3, a bolsa de valores oficial do Brasil, surgiu para discutir a elaboração de uma proposta de regra de diversidade nos conselhos de administração de empresas listadas. A proposta pede às empresas que elejam, no mínimo, 1 mulher e 1 integrante de comunidade minorizada como titular do Conselho de Administração ou da diretoria estatutária, parte de conselhos ou administração - com o prazo máximo de implementação, ou de prestação de justificativa para não o fazer, até 2026.

O Sistema B Brasil participou ativamente da consulta pública da B3 com provocações que destacam nossos valores prioritários. Defendemos, por exemplo, a inclusão de todas as empresas listadas na abrangência da norma proposta. Afinal,  empresas de qualquer porte que se colocam no mercado como capital aberto têm impacto sistêmico.

Quanto ao tópico de proporcionalidade de representatividade nos Conselhos Administrativos, a proposta do Sistema B foi baseada na realidade no que diz respeito à diversidade do país. A sugestão apresentada diz que a representatividade populacional deva ser a linha guia mínima: as maiorias minorizadas - mulheres (que representam 52% da população brasileira) e pessoas negras (que representam 54% da população do país) - devem compor, obrigatoriamente, parte dos 30% sugeridos. Outras minorias devem compor o restante dessa porcentagem, ficando a critério das empresas quais populações seriam incluídas de acordo com a sua realidade territorial e/ou campo de atuação.                                                                                                       

Para o Sistema B Brasil, falar de diversidade é prioritário e urgente, não apenas por toda a importância da representatividade já mencionada, mas por entender que o desafio é  ainda maior e requer de fato compromisso. E isso precisa aparecer desde o topo. A falta de líderes representativos, principalmente na pauta racial, compromete a reputação de uma instituição que se propõe a abraçar a inclusão apenas para cumprir os requisitos mínimos de diversidade, mas nenhum deles com poder de decisão para, de fato, promover mudanças, isso é popularmente conhecido como tokenismo. É preciso dar aos negros o mesmo poder de decisão que é dado aos brancos para que tenhamos mudança.

Ações como a da B3 indicam a direção de que diversidade corporativa precisa estar ligada ao propósito de oxigenar as cadeiras das lideranças na sociedade, e o Movimento B acredita que as empresas podem ser ainda mais ambiciosas nesse sentido. Aliás, essa é uma demanda endereçada pela Agenda 2030, apoiada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e outros parceiros no Brasil. Entre os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), o ODS 10 pauta a Redução das Desigualdades: “Até 2030, empoderar e promover a inclusão social, econômica e política de todos, independentemente da idade, gênero, deficiência, raça, etnia, origem, religião, condição econômica ou outra.”

O Brasil está inserido num cenário econômico mundialmente privilegiado e, como falamos acima, as empresas possuem uma voz confiável e que influencia a maior parte da população. Por isso, é fundamental que a comunidade empresarial seja parte da construção e implementação da solução para problemas globais, como desigualdade, mudanças climáticas e inclusão social. O Movimento de Empresas B faz isso oferecendo ferramentas, apoio no letramento racial e criando infraestrutura de suporte e incentivos para que outras organizações sigam esse modelo de liderança. Diferentes empresas da rede B oferecem expertise e tecnologias para auxiliar outras empresas a avançarem em questões de diversidade e inclusão, e em toda a jornada de impacto positivo a fim de construir um mundo melhor para todas as pessoas e o planeta. Esse processo também envolve instituições públicas e sociais. O esforço e o envolvimento precisam ser coletivos. A transformação passa pela inclusão e empoderamento de vozes mais diversas. A agenda 2030 já começou.

*Rodrigo Santini é diretor Executivo do Sistema B, Adriana Barbosa é conselheira do Sistema B Brasil e Sérgio Serapião é Co-presidente do Conselho do Sistema B Brasil.