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Análise: O recado do professor Haddad a Lula sobre 2026

Ministro alerta Planalto para travar guinada à esquerda na economia ; estudioso da ciência política, ele condiciona chances de reeleição ao apoio do centro

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad: recados públicos do ministro alerta para risco de perder apoio do centro (JOSEPH EID/AFP/Getty Images)
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad: recados públicos do ministro alerta para risco de perder apoio do centro (JOSEPH EID/AFP/Getty Images)

Logo na transição de governos, em novembro de 2022, o ex-ministro e ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, desejou "boa sorte" aos investidores ao tomar pé da cartilha econômica da terceira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva.

Meirelles, que chegou a se movimentar para reassumir o Ministério da Fazenda, foi preterido pelo então presidente eleito e passou a circular em fóruns proeminentes do mercado financeiro advertindo para a predominância dos desenvolvimentistas no núcleo-duro do Planalto que vinha sendo desenhado naquela ocasião, de alta instabilidade institucional.

A escolha de Fernando Haddad para a pasta, apesar de algum ruído inicial, se mostrou um antídoto para a pressão sobre o risco fiscal na medida em que o recém-indicado por Lula se apressou em anunciar um novo arcabouço para estabelecer parâmetros para as contas públicas.

Em seguida, no primeiro ano da administração Lula 3, Haddad venceu batalhas importantes com a ala política do governo, sempre erguendo a bandeira do equilíbrio nos gastos e engatou um agenda harmoniosa com o Congresso Nacional, obtendo aprovações de itens sobre os quais pairava imensa dúvida havia décadas, como a Reforma Tributária.

Fortalecido, o ministro manteve a confiança da Faria Lima, mesmo tendo à frente o desafio de conduzir um ajuste fiscal ancorado na busca incessante de novas fontes de arrecadação, já que o QG lulista não abriria mão dos investimentos públicos como instrumento de crescimento da economia rumo a uma possível reeleição.

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Desde janeiro, contudo, o ciclo virtuoso haddadista vem passando por avarias que remontam às incertezas do período de troca de governo.

A queda na popularidade presidencial, somada à instabilidade na relação com o Legislativo e a resiliência da oposição com alternativa de poder para 2026 formam um "combo" com potencial para minar a credibilidade do sistema financeiro na equipe econômica.

É neste contexto que se insere o anúncio da Lei de Diretrizes Orçamentárias, feito esta semana, tirando do horizonte o compromisso de superávit no atual mandato.

Isoladamente, a medida vinha sendo até digerida pelo mercado, mas diante do cenário que se desenha para os próximos dois anos, ela vem sendo interpretada pelos agentes financeiros como um sinal preocupante.

Ciência política

Questionado com frequência por próceres do PT e do núcleo palaciano, Haddad sempre teve um bom faro para temas da ciência política. Foi dele, ainda como prefeito de São Paulo, o diagnóstico de que a direita avançaria e se constituiria num vetor de poder nacional surfando no auge da Lava-Jato.

Professor acadêmico e mestre em filosofia, o ministro da Fazenda é um estudioso dos fenômenos sociais em curso no planeta e guarda distanciamento estratégico dos formuladores desenvolvimentistas que são majoritários na cúpula petista.

Ele atuou decisivamente na aliança de Lula com o ex-rival Geraldo Alckmin, que garantiu o terceiro mandato ao presidente. Naquela ocasião, já vislumbrando o vigor da máquina federal bolsonarista e o deslocamento de forças ideológicas que gravitavam no entorno do PSDB para a direita radical, Haddad prescreveu como única hipótese de triunfo para o lulismo uma aproximação com atores centristas e moderados, que ajudariam a consolidar a maioria apertadíssima que se viu confirmada nas urnas em outubro de 2022.

Dois anos depois e experimentando o período mais crítico de sua gestão na Fazenda, o ministro voltou a usar a mesma fórmula para chamar a atenção do chefe, hoje mais sensível a outros conselheiros no Planalto.

Presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto: sucessão na liderança do BC é uma das principais pautas econômicas deste ano (André Ressel/BCB/Flickr)

Em entrevista concedida à Globonews exatamente no dia em que o Executivo tornou público o documento da LDO, tão barulhento no mercado, Haddad adotou tom inusual ao enviar seguidas mensagens a Lula.

Entre outros recados, disse que o presidente não é imbatível na tentativa de reeleição daqui a dois anos e que só a reedição coalizão do PT com parcela expressiva do centro daria segurança ao projeto eleitoral lulista de um quarto mandato. Segundo ele, o governo precisa entender os riscos que "continua correndo".

A retórica de Haddad, incrementada pelas oscilações do câmbio e pelas novas incertezas sobre a trajetória dos juros, visa também pautar a decisão mais importante do ano na seara macroeconômica: a sucessão de Roberto Campos Neto no Banco Central.

O ministro teme que se estabeleça uma linha direta entre a futura chefia da autoridade e o entorno presidencial, o que deterioraria rapidamente as percepções dos formadores de opinião do mercado, trazendo à tona um repique inflacionário e pressão sobre os juros.

Efeito Tarcísio

Haddad, por óbvio, advoga em causa própria ao insistir no namoro com o centro, visto que sua agenda fiscalista tem simpatia desse contingente de eleitores, insuficiente para vencer uma eleição, mas essencial para decidi-la.

O ministro deseja contar com o respaldo dos agentes financeiros e de setores substantivos do empresariado para conter o apetite por gastos que é o mantra dos ministérios políticos de Lula, sob os aplausos do fisiologismo que dá as cartas no Congresso Nacional.

A fala do ministro, contudo, não pode ser descolada do diagnóstico cada vez mais sólido no Planalto de que um novo fator desponta no xadrez eleitoral de 2026 —a possível candidatura do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.

Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo: político desponta como opção eleitoral de grande atração para eleitorado de centro em 2026 ( Francisco Cepeda/ Governo do Estado de SP/Flickr)

Prestes a se filiar ao PL, maior sigla do Legislativo, o ex-ministro de Jair Bolsonaro veste o figurino que pode capturar uma fração expressiva do mesmo centro que esteve com Lula erguendo a bandeira do respeito às instituições democráticas em 2022.

Articulado e bem avaliado no PIB, Tarcísio reuniria, no entendimento de aliados do presidente, os atributos para fazer o que se chama de ruptura da polarização pela direita clássica, altamente sedutora inclusive para os economistas que endossaram a bem-sucedida aliança Lula-Alckmin.

Ainda não são conhecidos os efeitos dos avisos de Haddad ao QG lulista, exceto a trivial reação beligerante do seu partido, o PT. O certo é que o ambiente de incertezas externas agudas na economia tende a antecipar decisões políticas que eram aguardadas apenas para o próximo biênio.