Análise: explosões em Brasília fortalecem STF e dificultam pacto político pró-Bolsonaro
Tabuleiro político se torna ainda mais intrincado, dificultando a costura de alianças e a viabilização de estratégias de reinserção política de Bolsonaro
Publicado em 14 de novembro de 2024 às, 14h22.
O ato, perpetrado por um suspeito que aparenta agir sozinho, transcende o campo dos ataques individuais e reverbera no xadrez político nacional. As consequências são imediatas e significativas, afetando os movimentos institucionais, as estratégias de poder e o delicado equilíbrio das forças políticas.
Em primeiro lugar, os desdobramentos fortalecem o STF, especialmente na figura do ministro Alexandre de Moraes. Responsável pelos inquéritos que investigam os atos de 8 de janeiro de 2023, Moraes já ocupava uma posição de protagonismo na defesa das instituições democráticas. O novo ataque reforça seu papel como uma espécie de guardião do ordenamento constitucional.
Sob pressão constante de setores que exigem a anistia ou a flexibilização das penas impostas aos envolvidos nos atos antidemocráticos, Moraes encontra agora respaldo renovado para endurecer medidas. O episódio realça ainda mais a liderança de Moraes na condução dos processos contra extremistas, consolidando sua posição na Corte e no cenário político.
Com este ataque criminoso, as críticas direcionadas ao ministro perdem força, especialmente aquelas vindas de grupos que tentavam relativizar ou minimizar a gravidade dos fatos registrados em 8 de janeiro de 2023 e seus mentores intelectuais. De forma indireta, o novo atentado confere ainda mais autoridade ao Supremo, em um contexto no qual o questionamento de sua legitimidade havia se tornado moeda corrente entre segmentos radicais e até mesmo entre setores mais moderados da direita.
Anistia: um horizonte cada vez mais distante
A segunda implicação direta das explosões em Brasília diz respeito à delicada questão da anistia para os envolvidos nos atos antidemocráticos. As negociações que vinham sendo costuradas por aliados de Jair Bolsonaro – incluindo governadores, senadores do PL e interlocutores no campo jurídico – agora enfrentam um revés dramático. A tentativa de obter uma revisão da inelegibilidade do ex-presidente, articulada nos bastidores como uma forma de reabilitá-lo para a disputa eleitoral de 2026, esbarrará em uma nova onda de descrédito e resistência institucional, inclusive entre os congressistas, que vinham avançando no tema nas comissões da Câmara dos Deputados.
O clima de tensão e de ameaça às instituições cria um ambiente tóxico, desfavorável a qualquer aproximação ou concessão política que possa ser interpretada como leniência com extremistas. Com isso, a possibilidade de Bolsonaro recuperar seus direitos políticos recua significativamente. Os episódios recentes forçam uma retração, comprometendo as chances de negociações mais flexíveis e reabrindo feridas que o ex-presidente tentava cicatrizar nas esferas pública e jurídica. O tabuleiro político, que já era complexo, se torna ainda mais intrincado, dificultando a costura de alianças e a viabilização de estratégias de reinserção política de Bolsonaro.
Oportunidade para Lula
O terceiro ponto de impacto das explosões em Brasília envolve o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Recentemente fragilizado por derrotas eleitorais em âmbito municipal e pela estrondosa vitória de Donald Trump, aliado de Bolsonaro, nos EUA, Lula vê no episódio uma oportunidade de reposicionar sua imagem pública. Ao se reunir, de forma imediata, com ministros do STF na noite do novo atentado aos poderes e reafirmar seu compromisso com a estabilidade institucional, o presidente busca recuperar parte do simbolismo que o ajudou na corrida pelo Planalto em 2022.
A narrativa de Lula como defensor das instituições e da ordem democrática encontra, neste contexto, terreno fértil. O ato de violência pode funcionar como catalisador de uma reaproximação de forças que compuseram sua coalizão de campanha naquele ano, incluindo setores do centro político e da sociedade civil que se uniram em torno da autodenominada “carta em defesa da democracia”, subscrita por antigos detratores do presidente durante a disputa eleitoral de 2022.
O aparente atentado, nesse contexto, reforça a percepção de que, diante de ameaças extremistas, Lula ainda pode se apresentar com um pilar de resistência institucional, ainda que em meio a agudos desafios econômicos e de articulação política.
O caldeirão político e a polarização
O cenário desencadeado pelas explosões em Brasília também levanta reflexões sobre os riscos de um novo ciclo de polarização extremista. Se, por um lado, o fortalecimento das instituições é inquestionável, por outro, o discurso punitivo e de combate ao radicalismo pode alimentar ressentimentos entre grupos minoritários que já enxergam nas instituições uma figura de opressão e injustiça. Essa dinâmica cria um ciclo vicioso, no qual ataques geram repressões, que, por sua vez, alimentam novas ondas de ressentimento e potencial violência.
O desafio político, portanto, não se limita à aplicação de punições exemplares, mas à capacidade de restabelecer um pacto social que una o país em torno de valores democráticos, afastando os extremos e promovendo uma estabilização duradoura. O ataque em Brasília sugere que a disputa pelo controle narrativo e institucional do Brasil está longe de ser concluída. Para o bem ou para o mal, as consequências políticas desse evento criminoso e trágico moldarão os próximos movimentos do jogo político.