Um “gênio bastante estável” no comando
Trump se mantem e é mantido no poder graças ao seu time no governo
Publicado em 15 de janeiro de 2018 às, 13h14.
Última atualização em 15 de janeiro de 2018 às, 17h22.
Assim como milhões de pessoas ao redor do mundo, eu também fiquei tranquilo ao saber que Donald Trump é um “gênio bastante estável”. Perceba, se ele não fosse – e em vez disso fosse um pretenso tirano errático, vingativo, desinformado e preguiçoso -, nós poderíamos estar em verdadeiros apuros.
Sejamos honestos: Esta grande nação sempre foi liderada por homens medíocres, alguns dos quais tinham personalidades desagradáveis. Mas em geral eles não causaram muitos estragos, por dois motivos.
Primeiro, presidentes de segunda mão frequentemente estiveram rodeados de servidores públicos de primeira classe. Olhe, por exemplo, para a lista dos secretários do Tesouro desde a fundação da nação; embora nem todo mundo que ocupou o cargo tenha sido outro Alexander Hamilton, em geral é um contingente bastante impressionante. E fez diferença.
Há um debate em andamento sobre se Ronald Reagan, que recebeu um diagnóstico de Alzheimer cinco anos antes de deixar o cargo, já estava exibindo sinais de declínio cognitivo durante seu segundo mandato. Apesar disso, com James Baker administrando o Departamento do Tesouro e George Shultz cuidando do Departamento de Estado, ninguém precisou se preocupar em saber se pessoas qualificadas estavam tomando as grandes decisões.
Segundo, nosso sistema de controle tem restringido presidentes que de outro modo poderiam se sentir tentados a ignorar o estado de direito ou a abusar de sua posição. Embora nós provavelmente tenhamos tido governantes que desejavam enjaular seus críticos ou enriquecer enquanto estavam no cargo, nenhum deles se atreveu a agir com base nesses desejos.
Mas isso foi antes. Com o Gênio Bastante Estável-Chefe, as velhas regras não valem mais. Quando o G.B.E se mudou para a Casa Branca, ele trouxe consigo uma coleção de subordinados extraordinária – e eu quero dizer isso no pior sentido possível. Alguns deles já se foram, como Michael Flynn, a quem o Sr. Trump indicou como conselheiro de segurança nacional apesar de dúvidas circulando mesmo naquela ocasião sobre as relações internacionais dele, e que no mês passado se declarou culpado de ter mentido para o FBI sobre estes laços. Também se foi Tom Price, secretário de Saúde e Serviços Humanos, abatido por seu vício em viagens caras de avião particular.
Outros, entretanto, continuam lá; certamente a ideia de Steve Mnuchin no Tesouro fez Alexander Hamilton rolar em sua tumba. Além dele, muitas indicações de nível incrivelmente baixo têm circulado nos bastidores. Nós só temos uma noção de quão ruins as coisas estão por causa das ocasionais histórias que vêm à tona, como aquela do indicado de Trump para comandar o Serviço de Saúde Indígena, que parece ter mentido sobre suas qualificações para o cargo. (Uma porta-voz do Departamento de Saúde e Serviços Humanos disse que um tornado havia destruído os registros de trabalho dele.)
E, enquanto pessoas desqualificadas estão entrando, gente qualificada está debandando. Tem havido um grande êxodo de pessoal experiente no Departamento de Estado; talvez ainda mais alarmante, supostamente há um êxodo semelhante acontecendo na Agência Nacional de Segurança.
Em outras palavras, um único ano do Sr. Trump nos fez percorrer um longo caminho rumo a um dos piores e mais imbecis governos. É boa coisa que o homem no topo seja, tipo assim, esperto.
Enquanto isso, e quanto às limitações ao mau comportamento presidencial? Ah, para com isso, essa coisa de controle é tão década de 70, hein? Os republicanos poderiam ter se importando com as ações ilegais do presidente durante o Watergate, mas hoje em dia eles claramente enxergam o emprego deles como orientado a proteger os privilégios do G.B.E., e de deixá-lo fazer o que ele quiser.
Pode me incluir entre aqueles que não acharam as revelações do novo livro de Michael Wolff tão chocantes assim, porque elas apenas confirmam o que muitas histórias têm nos dito sobre esta Casa Branca. A notícia realmente importante da semana passada, até onde eu entendo, envolveu indícios de que lideranças republicanas no Congresso estão cada vez mais determinadas a se envolver em obstrução da justiça.
Até agora, não estava completamente claro se os integrantes pró-acobertamento do Congresso, como Devin Nunes, que têm assediado o Departamento de Justiça enquanto o setor tenta investigar a interferência russa na eleição, agiam por conta própria. Mas Paul Ryan, o porta-voz da Câmara, agora tomou plenamente o lado do Sr. Nunes, efetivamente apostando todas as fichas na obstrução.
Ao mesmo tempo, dois senadores republicanos fizeram o primeiro pedido parlamentar para que haja acusações criminais relacionadas à intervenção russa, e não contra aqueles que podem ter trabalhado com uma potência externa hostil, mas contra o ex-espião britânico que tinha na verdade preparado um dossiê sobre uma possível conspiração Trump-Rússia.
Em outras palavras, no momento em que grande parte do mundo está duvidando da saúde de Trump para o comando, as únicas pessoas que poderiam limitá-lo estão fazendo o que podem para colocá-lo acima do estado de direito.
Até aqui, a implosão das nossas normas culturais tem tido surpreendentemente pouco efeito na vida cotidiana (a não ser que você esteja vivendo em uma Porto Rico devastada por furacões e ainda aguarde a volta da energia elétrica graças a uma resposta federal inadequada). O presidente passa suas manhãs assistindo tv e tuitando contra seus desafetos; ele causou estragos na competência do governo e o partido dele não quer que você saiba se ele é um agente de outro país. Apesar disso, as ações estão em alta, a economia está crescendo e nós ainda não entramos em nenhuma nova guerra. Mas isso são os primeiros dias. Nós gastamos mais de dois séculos construindo uma grande nação, e até mesmo um Gênio Bastante Estável provavelmente precisa de um par de anos para acabar de arruiná-la.