Já está mais do que claro: Trump é o louco na Casa Branca
Antes mesmo da obsessão da mídia com o servidor de e-mails de Hillary Clinton colocar o Pior Presidente do Mundo na Casa Branca, historiadores já estavam comparando Donald Trump a Calígula, o cruel e depravado imperador romano que se deliciava em humilhar os outros, em particular os integrantes da elite do império. Contudo, com sete […]
Publicado em 28 de agosto de 2017 às, 12h50.
Antes mesmo da obsessão da mídia com o servidor de e-mails de Hillary Clinton colocar o Pior Presidente do Mundo na Casa Branca, historiadores já estavam comparando Donald Trump a Calígula, o cruel e depravado imperador romano que se deliciava em humilhar os outros, em particular os integrantes da elite do império. Contudo, com sete meses de governo Trump, podemos ver que essa comparação foi injusta.
Para começar, Calígula, até onde nós sabemos, não fomentava a violênica étnica dentro do império. Além disso, de novo, até onde nós temos conhecimento, o governo de Roma continuou a funcionar razoavelmente bem apesar de suas artimanhas: gGovernadores das províncias continuaram a manter a ordem, o exércio continuou a defender as fronteiras, não houve crises econômicas.
Finalmente, quando seu comportamento se tornou verdadeiramente intolerável, a elite de Roma fez o que o partido que hoje controla o Congresso parece incapaz até mesmo de imaginar: ela encontrou um jeito de se livrar dele.
Qualquer um com um par de olhos – olhos que não estejam vidrados na Fox News, de qualquer maneira – percebeu há muito tempo que o Sr. Trump é completamente incapaz, moral e intelectualmente, de ocupar o cargo que tem. Mas nos últimos dias as coisas parecem ter atingido uma massa crítica.
Jornalistas pararam de se aproveitar dos breves momentos de não-loucura para declarar o Sr. Trump “presidencial”; líderes de empresas pararam de tentar obter favores emprestando ao Sr. Trump um ar de credibilidade; até mesmo os líderes militares foram até onde puderam para se distanciar dos pronunciamentos do governo.
Vamos colocar desta maneira: “Não é meu presidente” costumava soar como um slogan extremo. Agora isso mais ou menos se tornou o princípio operante para peças-chave do sistema político nos Estados Unidos.
Apesar disso, pode parecer à primeira vista que a República continue a funcionar normalmente. Nós estamos criando empregos; as ações estão em alta; os serviços públicos continuam a funcionar.
Mas lembrem-se, esse governo ainda tem de confrontar uma crise que não seja ele mesmo quem criou.
Além do mais, uma série de manchetes assustadoras espreita. Deixe pra lá a reforma tributária. O Congresso tem de agir dentro das próximas semanas para aprovar um orçamento, ou o governo irá fechar; para elevar o teto da dívida, ou o país entrará em default; para renovar o Programa de Cobertura de Saúde Infantil, ou milhões de crianças ficarão sem atendimento.
E aí, quem vai garantir que esses prazos críticos sejam cumpridos? Não o Sr. Trump, que está ocupado demais elogiando supremacistas brancos e promovendo suas próprias empresas. Talvez os líderes republicanos no Congresso ainda consigam amarrar seus integrantes extremistas, que enxergam a ideia de aleijar o governo como uma coisa boa, para fazer os acordos necessários.
Mas a revelação de que essas lideranças estavam mentindo sobre a cobertura pública de saúde todos esses anos destruiu a credibilidade intelectual deles – lembram quando as pessoas levavam a sério as pretensões de expertise política do porta-voz do Congresso, Paul Ryan? Além disso, a associação com o Presidente Calígula também destruiu a credibilidade deles. Eles poderiam manter o governo funcionando lidando com os democratas, mas eles têm medo de fazer isso, pelo mesmo motivo que eles têm medo de confrontar o louco na Casa Branca.
Eis a situação: todo mundo em Washington hoje sabe que nós temos um presidente que nunca falou sério quando jurou defender a Constituição. Ele viola essa promessa praticamente todo dia e isso nunca vai melhorar.
A boa notícia é que os pais fundadores contemplaram esta possibilidade e ofereceram um remédio constitucional: ao contrário dos senadores da Roma antiga, que tinham de conspirar com a Guarda Pretoriana para fazer com que Calígula fosse assassinado, o Congresso tem a capacidade de remover um presidente desonesto.
Contudo, um terço do país ainda aprova esse presidente desonesto – e esse terço representa uma grande maioria da base de apoio do Partido Republicano. Ou seja, tudo que nós conseguimos da grande maioria dos republicanos eleitos são expressões em off de “decepção” ou denúncias de intolerância que de alguma maneira esquecem de citar o intolerante supremo da nação.
Não é apenas que os republicanos temam desafios nas primárias vindo de candidatos que cedem à direita racista, emboras eles temam; o Sr. Trump já está apoiando rivais dos republicanos que ele considera insuficientemente leais.
A questão é que os supremacistas brancos há tempos têm sido uma peça-chave, ainda que não reconhecida, da coalizão do Partido Republicano, e os republicanos precisam destes votos para vencer as eleições gerais. Considerando-se os tipos de covardia que eles têm mostrado até aqui, é difícil imaginar alguma coisa – até mesmo, e inclusive, evidências de conspiração com uma potência externa – que os faria arriscar a perda do apoio desses eleitores.
Ou seja, as chances são de que nós estejamos presos a um presidente malévolo e incompetente, a quem ninguém instruído respeita, e que muitos consideram ilegítimo. Se for isso, nós temos de esperar que nosso país de alguma forma cambaleie ao longo do próximo ano e meio sem catástrofes, e que as eleições de meio de mandato alterem o coeficiente político e tornem a Constituição grande de novo.
Caso isso não aconteça, tudo que se pode dizer é Deus salve a América. Porque todas as indicações são de que os republicanos não irão.
(Este artigo foi publicado originalmente no The New York Times do dia 18 de agosto de 2017.)