Exame.com
Continua após a publicidade

Austeridade antes? Estímulos agora?

A política fiscal vem sendo pervertida pelo partidarismo de direita

TRUMP: o plano fiscal de Trump de 2017 representou uma ruptura absoluta com os princípios normais de política fiscal / REUTERS | Kevin Lamarque (Kevin Lamarque)
TRUMP: o plano fiscal de Trump de 2017 representou uma ruptura absoluta com os princípios normais de política fiscal / REUTERS | Kevin Lamarque (Kevin Lamarque)
P
Paul Krugman

Publicado em 13 de novembro de 2018 às, 15h01.

Como muitas pessoas notaram, o plano fiscal de Trump de 2017 representou uma ruptura absoluta com os princípios normais de política fiscal. Historicamente, nós temos tido grandes déficits quando a economia está fraca, e déficits ou superávits menores quando ela está forte. Porém, desta vez o déficit está disparando mesmo com o desemprego baixo. Este plano foi irresponsável, e mostra que as desculpas republicanas a respeito dos déficits sempre foram mentirosas – o que alguns de nós dissemos na ocasião.

Porém, o que tem sido menos destacado é o fato de que isso é na verdade parte de uma história mais ampla. A política fiscal tem saído dos trilhos desde 2010, e não é por causa do que ela tem causado à dívida interna, mas devido ao que ela tem feito à macroeconomia.

Eis o que a política fiscal deveria fazer: Ela deveria apoiar a demanda quando a economia estivesse fraca, e tirar este estímulo quando a economia estiver robusta. Como disse John Maynard Keynes, “a expansão, e não a recessão, é o momento certo para a austeridade”. E até 2010 os Estados Unidos mais ou menos seguiram esta cartilha. Desde então, porém, a política fiscal tem se tornado perversa: primeiro pela austeridade apesar do desemprego elevado, e agora com essa expansão apesar do desemprego baixo.

Durante a recessão de 2001 e seu rescaldo, e de novo quando aconteceu a Grande Recessão em 2008, o desemprego alto foi recebido com expansão fiscal. Deste ponto de vista o estímulo de Obama foi a política normal, aplicada a uma situação excepcional. (Para uma ilustração do meu argumento, vejam este gráfico que usa a Medição do Impacto Fiscal calculada pelo Hutchins Center, da Brookings Institution, que estima quanto a política fiscal em todos os níveis de governo soma ou tira do crescimento econômico no curto prazo)

Só que aí a política fiscal descarrilou. O erro de percurso, por este parâmetro, começou na verdade antes mesmo dos republicanos conquistarem a Câmara, e principalmente, na minha opinião, refletiu os cortes no orçamento público nas esferas estadual e municipal. Mas ele piorou muito depois do Partido Republicano ganhar poder de obstrução, forçando uma austeridade significativa mesmo quando o desemprego continuava extremamente elevado.

Paralelamente, o Fed não podia mais cortar as taxas de juros, porque elas já estavam em zero, e você pode me incluir no time dos céticos quanto à eficiência da flexibilização quantitativa para abaixar estas taxas (às quais os republicanos se opuseram ferozmente). Assim, sem dúvida esta guinada rumo à austeridade fiscal desacelerou o crescimento e atrasou a recuperação econômica.

E agora, com o desemprego muito baixo e um presidente republicano na Casa Branca, nós estamos recebendo o estímulo fiscal de que precisávamos desesperadamente lá atrás – e não é necessário agora. A política fiscal, como muito da nossa governança na América atual, vem sendo pervertida pelo partidarismo de direita.