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A constrangedora verdade sobre o 11 de Setembro

A narrativa oficial é que o 11 de Setembro foi um "momento Pearl Harbor" que uniu a América. Mas ela é completamente falsa

Fumaça sai dos prédios do World Trade Center, em 2001: episódio desencadeou a “Guerra ao Terror” do governo Bush / AFP/Getty Images / Craig Allen
Fumaça sai dos prédios do World Trade Center, em 2001: episódio desencadeou a “Guerra ao Terror” do governo Bush / AFP/Getty Images / Craig Allen
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Paul Krugman

Publicado em 21 de setembro de 2017 às, 11h39.

Última atualização em 11 de outubro de 2017 às, 10h48.

É 11 de setembro de novo, e quase ninguém está celebrando o aniversário. Sequer me ocorreu usar meu espaço para artigos no New York Times para a ocasião, considerando-se todos os horrores atuais em andamento. Mas eu pensei em gastar alguns poucos minutos para falar sobre o que deveria ter acontecido depois do 11 de Setembro de 2001, mas não aconteceu.

Nas semanas e meses depois da atrocidade, a imprensa tinha uma narrativa sobre o que aquilo significou – basicamente, que foi um momento Pearl Harbor que reuniu a América em torno de uma nova seriedade e uma nova determinação. Isso foi confortante e encorajador. Também foi completamente falso, desde os primeiros minutos em diante.

A verdade, como sabemos hoje, é que as autoridades do governo Bush se animaram, enquanto as chamas ainda queimavam, diante da oportunidade de lutar a guerra – sem relação com o fato – que eles sempre quiseram lutar. Mas isso não foi tudo: Os republicanos no Congresso também enxergaram uma oportunidade de obter ganho partidário, desde o início. Em menos de dois dias, funcionários do Congresso estavam me contando dos esforços republicanos para aproveitar a ocasião para forçar um corte nos impostos sobre os rendimentos capitais.

O problema era que as pessoas não queriam ouvir falar dessa realidade. Quando eu escrevi um artigo repercutindo o que estava acontecendo no Congresso, fui inundado de cartas enfurecidas dos leitores, leitores irritados não com os republicanos por se aproveitarem da situação, mas comigo por reportá-la. “Como eu posso contar sobre isso para o meu filho pequeno?”, escreveu um remetente furioso.

Levou anos para as pessoas aceitarem a verdade embaraçosa. E levou muito mais tempo para a imprensa; um imenso número de eleitores havia concluído que a Guerra do Iraque foi vendida a eles com mentiras muito antes que fosse considerado aceitável dizer isso a seus amigos mais próximos.

Por que o 11 de Setembro não mudou nada? Em parte porque, ao contrário do ataque do Japão a Pearl Harbor, o terrorismo não era e não é uma ameaça existencial. Sim, ele é assustador; mas você precisaria ser um idiota para pensar que havia qualquer risco de uma conquista islâmica do Ocidente. Isso só significou que os vilões políticos internos se sentiram livres para continuar com suas canalhices e para tratar o terror como mais uma coisa da qual se aproveitar.

Fora isso, em 2001 nós já havíamos ido longe na polarização extrema conduzida pela radicalização do Partido Republicano. (Não, não são “os dois lados”.) Qualquer um que diga que o presidente Trump transformou aquele partido em algo irreconhecível se esqueceu de Tom DeLay.

Na verdade, vale imaginar qual teria sido a resposta a Pearl Harbor se o Partido Republicano de 1941 fosse o que era em 2001. Eu desconfio que os republicanos teriam declarado que era culpa de Franklin D. Roosevelt, e se posicionado contra o empréstimo do governo para pagar pela Segunda Guerra Mundial, sem falar no controle de preços e no racionamento.

Em todo caso, a essa altura nós podemos ver que o lugar do 11 de Setembro na história americana acabou sendo quase o oposto do de Pearl Harbor. O primeiro dia de infâmia uniu o país e mostrou nossa resistência fundamental. O segundo nos separou ainda mais, e destacou nossa decadência política.