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Panorama Econômico
Publicado em 1 de dezembro de 2025 às 14h11.
Por o Juan Schiavo, sócio da Cimo Family Office.
O mercado global de gestão de fortunas vive uma década de transformações profundas, ditadas tanto pela evolução do perfil dos investidores quanto pelo ritmo de criação e migração da riqueza mundial. Um estudo publicado em outubro de 2025 pela consultoria BCG (Boston Consulting Group) mostra que o patrimônio financeiro global atingiu US$ 305 trilhões em 2024, um avanço de 8% em dólar, impulsionado pela extensão do ciclo de valorização dos mercados acionários nos Estados Unidos e na Ásia.
Para os próximos cinco anos, o relatório projeta um crescimento anual médio de 5,5%, levando o volume total de ativos financeiros globais para cerca de US$ 400 trilhões em 2029. A força desse movimento vem, sobretudo, do dinamismo da Ásia e da expansão acelerada do segmento Ultra High Net Worth (UHNW), indivíduos com mais de US$ 100 milhões em patrimônio financeiro.
No recorte brasileiro, o cenário é de avanço, mas com nuances importantes. O patrimônio financeiro do país deve crescer cerca de 4,3% ao ano, em dólares, até 2029, alcançando um mercado de aproximadamente US$ 3,7 trilhões. É um ritmo semelhante ao da América Latina, porém com uma composição que destoa significativamente da média global.
Embora globalmente o segmento UHNW represente cerca de 14% da riqueza financeira, no Brasil essa fatia se aproxima de 31%, proporção mais que o dobro da média. Ou seja, trata-se de um mercado concentrado, com grande peso de famílias empresárias, fundadores de companhias e dinâmicas sucessórias complexas, exigindo níveis elevados de personalização e arquitetura sofisticada de veículos de investimento.
Esse fator isolado já seria suficiente para diferenciar o mercado brasileiro, mas a realidade local se torna ainda mais particular quando adicionamos a ela a revolução geracional que está em curso.
A ascensão de uma nova geração de investidores
Um dos movimentos mais relevantes apontados pelo BCG é a redistribuição da riqueza entre gerações. Em menos de dez anos, os Millennials, hoje com idades entre 29 e 44 anos, devem saltar de 9% para 25% da riqueza global. Embora o grosso das grandes fortunas permaneça nas mãos da Geração X (28%) e dos
Boomers (21%), a velocidade com que o capital está migrando para mãos mais jovens redefine a forma como a indústria de wealth management deve operar.
As expectativas desse novo investidor são claras:
· 60% esperam ferramentas digitais avançadas;
· 66% aceitam atendimento totalmente virtual;
· 81% ainda valorizam pelo menos um encontro presencial antes de investir.
Trata-se de um cliente híbrido: digital em sua rotina, mas que exige profundidade técnica e confiança humana nos momentos decisivos.
No Brasil, esse fenômeno é ainda mais expressivo. A democratização do acesso ao mercado financeiro, impulsionada por plataformas digitais, pela disseminação de influenciadores financeiros e pela digitalização dos meios de pagamento, colocou milhões de novos investidores no radar. Entre 2016 e 2022, o investidor pessoa física assumiu protagonismo na B3 e nos fundos distribuídos pelas plataformas, por exemplo.
Mas essa entrada acelerada se deu em um mercado onde preço, transparência e alinhamento de interesses ainda não são padrão; pelo contrário, muitas vezes são diferenciais competitivos restritos a players mais bem posicionados. O resultado é um ambiente em que o investidor jovem busca sofisticação, mas encontra uma indústria ainda fragmentada, marcada por assimetrias de informação e serviços pouco integrados.
A fronteira internacional: o avanço do offshore brasileiro
Outro ponto crucial destacado pelo BCG é o avanço consistente do mercado offshore no Brasil. Historicamente, o país é um dos que apresentam menor nível de diversificação global em sua alocação de recursos entre seus pares emergentes; porém, cresce a busca de empresários e investidores por diversificação internacional, proteção patrimonial e segurança jurídica.
O fenômeno é ainda mais forte entre o chamado “novo dinheiro”, especialmente fundadores que venderam empresas e executivos da economia digital. Para esse grupo, os Estados Unidos se consolidam como principal destino de custódia internacional, superando centros tradicionais da Europa.
Entretanto, os grandes bancos brasileiros ainda enfrentam limitações relevantes quando o assunto é atendimento offshore:
· baixa integração entre carteiras onshore e offshore;
· oferta restrita de produtos;
· experiência digital fragmentada;
· rede de assessores com pouca vivência internacional;
· ausência de relatórios consolidados.
Essas lacunas abrem espaço para gestoras independentes, Multi Family Offices e instituições globais, que conseguem oferecer uma abordagem verdadeiramente integrada, combinando planejamento tributário internacional, portfólios multiativos e custódia em diferentes jurisdições.
O que define o futuro do wealth management no Brasil
A próxima década será decisiva para o setor. A combinação de:
· transição geracional acelerada,
· pressão regulatória por transparência,
· demanda crescente por serviços globais,
· sofisticação do investidor digital e
· concentração de riqueza em grupos familiares complexos
deve redesenhar profundamente o modelo de negócios dos players locais.
O futuro do wealth management no país será menos sobre vender produtos e muito mais sobre:
· construir relações de confiança em longo prazo;
· oferecer arquitetura aberta e global de investimentos;
· adotar tecnologia e dados para aconselhamento personalizado;
· integrar planejamento sucessório, jurídico e patrimonial;
· entregar eficiência operacional e menor fricção.
É um mercado que deixa de ser liderado por quem distribui produtos e passa a ser dominado por quem entrega excelência, transparência e sofisticação na gestão de patrimônios cada vez mais globais.