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O fracasso da sucessão da Família Gucci

O que você pode aprender para a sua família de acordo com Paulo Kimak da Potenza Family Office

 (George Rose/Getty Images)
(George Rose/Getty Images)

Por Paulo Kimak*

A história da família Gucci é um exemplo fascinante do impacto que o planejamento patrimonial pode ter no sucesso (ou fracasso) da continuidade de uma empresa familiar.

A história da família remonta a 1921, quando Guccio Gucci abriu uma loja de couro em Florença, na Itália. A marca Gucci começou como uma pequena empresa produzindo malas de viagem e acessórios de couro de alta qualidade. Ao longo dos anos, a marca foi ganhando reconhecimento e popularidade, se transformando numa marca de luxo icônica, mas a família também enfrentou desafios e tomou decisões importantes, incluindo a venda da empresa.

Ao explorar a trajetória familiar, podemos aprender valiosas lições sobre a importância do planejamento patrimonial, principalmente em relação a governança corporativa e família na jornada dos Gucci e como ela poderia ter auxiliado na busca pelo sucesso.

Um dos principais desafios enfrentados pelas empresas familiares é a sobrevivência além da primeira geração. Apenas uma pequena porcentagem delas consegue chegar à quarta geração. No entanto, estratégias de planejamento sucessório, preparação e alinhamento de expectativas podem garantir uma transição suave e bem-sucedida.

No Brasil, as empresas familiares desempenham um papel significativo na economia brasileira, representando 90% das empresas em atividade. Além disso, segundo dados oficiais, contribuem com aproximadamente 65% do Produto Interno Bruto (PIB) e empregam cerca de 75% da força de trabalho.

Das empresas familiares brasileiras, 70% alcançam a segunda geração, 10% a terceira geração e apenas 3% sobrevivem até a quarta geração.

O planejamento patrimonial é um processo estratégico que envolve a gestão e a proteção dos ativos e recursos de uma família ao longo das gerações. No caso da família Gucci, o planejamento patrimonial teria sido fundamental para garantir essa transição suave e bem-sucedida da empresa para as próximas gerações.

Um dos principais benefícios do planejamento patrimonial é a preparação adequada dos sucessores. Ao identificar e desenvolver os membros da família com potencial para assumir papéis-chave na empresa, o planejamento patrimonial teria permitido à família Gucci formar uma equipe de gestão sólida e capaz de continuar o legado da marca, independentemente da decisão de vendê-la ou não.

Na Gucci, os filhos assumiram a gestão da empresa após a morte de Guccio em 1953. A partir de então a marca ganhou popularidade e relevância global. No entanto, poucos anos depois, em 1974, a falta de consenso e disputas de poder entre a segunda e a terceira geração causaram uma crise financeira - não só no negócio, mas também na família. Ainda nos anos 1980, uma longa batalha judicial começou (entre Aldo, o filho e, Maurizio, neto de Guccio e filho de Rodolfo) e agravou ainda mais a crise na empresa e na família.

Os valores e o DNA familiar são a essência de uma empresa familiar, mas muitas vezes são perdidos com o tempo. É fundamental transmitir esses elementos aos sucessores, garantindo a continuidade da identidade e do propósito da empresa. Com um plano claro de sucessão e programas de desenvolvimento personalizados, os sucessores teriam sido preparados para enfrentar os desafios do mundo dos negócios de forma mais eficaz.

Além disso, o planejamento patrimonial teria permitido à família Gucci definir estratégias de governança corporativa e familiar sólidas. A implementação de estruturas de governança adequadas, como conselhos de administração independentes e acordos familiares, teria ajudado a estabelecer diretrizes claras para a tomada de decisões e a gestão dos interesses da família e da empresa. Isso poderia ter evitado conflitos internos e garantido uma governança eficaz, independentemente de a empresa ser vendida ou permanecer sob controle familiar.

No caso da família Gucci, a batalha judicial resultou em Maurizio assumir o controle da empresa. Como a Gucci estava passando por dificuldades financeiras, em 1988 ele vendeu aproximadamente 48% de sua participação para a empresa de investimentos Investcorp. Cinco anos depois, em 1993, as dívidas e os gastos excessivos acabaram por obrigar Maurizio a fazer uma venda adicional também para a Investcorp, encerrando a história da família à frente da empresa.

Outro aspecto relevante do planejamento patrimonial é a proteção dos ativos familiares. Ao considerar opções de venda da empresa, o planejamento patrimonial teria permitido à família Gucci estruturar a transação de forma a maximizar o valor dos ativos e minimizar possíveis impactos fiscais. Além disso, teria proporcionado a diversificação dos investimentos da família, garantindo uma base financeira sólida mesmo após a venda da empresa.

Nesse sentido, o Family Office desempenha um papel fundamental. O escritório atua como uma ponte entre as dimensões patrimoniais, financeiras, familiares e empresariais. Ele promove o alinhamento de propósito e facilita a construção conjunta de regras, visando uma gestão eficaz e harmoniosa estabelecendo funções e papéis claros para cada membro da família.

O planejamento patrimonial poderia ter assegurado que o produto da venda fosse investido de forma inteligente e estratégica, a fim de preservar e aumentar a riqueza familiar. Essa abordagem teria permitido que a família Gucci continuasse a prosperar financeiramente, mesmo sem a posse direta da empresa.

Em resumo, ao adotar práticas de governança corporativa e familiar, as empresas familiares podem garantir sua continuidade e deixar um legado duradouro no mundo dos negócios e isso teria desempenhado um papel crucial na trajetória da família Gucci. Ao preparar os sucessores, estabelecer estruturas de governança sólidas e proteger os ativos familiares, o planejamento patrimonial poderia ter garantido o sucesso contínuo da família e da marca, independentemente de decidirem vender a empresa.

Esse é um lembrete importante de como o planejamento patrimonial pode ser um elemento-chave na preservação do legado de uma empresa familiar ao longo das gerações. O planejamento pode e deve acontecer para todas as famílias empresárias, seja qual for o tamanho da empresa e da família.

Com o apoio de profissionais especializados, como um Family Office, essas empresas têm a oportunidade de construir um futuro sólido e duradouro para as próximas gerações, preservando sua cultura e valores enquanto geram riqueza e impacto positivo para a sociedade.

*Paulo Kimak é advogado e head de Wealth Planning na Potenza Multi Family Office. É formado na Universidade do Estado do Amazonas e pós-graduado em Finanças pelo INSPER e em Direito Tributário pelo IBDT (Instituto Brasileiro de Direito Tributário). Iniciou sua carreira no mercado financeiro no Banco Credit Suisse e grande parte da sua carreira no Wealth Planning do BTG Pactual. Possui certificação CFP e faz parte de conselho de administração e conselho de família.

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A Potenza Multi Family Office atua no acompanhamento global do patrimônio dos clientes, incluindo investimentos financeiros, imóveis, participações em empresas e outros ativos ilíquidos. Traz soluções personalizadas às necessidades individuais de cada família a partir da análise de todo o patrimônio de forma transparente e independente.