(Cristian Borrego Sala/Getty Images)
Panorama Econômico
Publicado em 8 de dezembro de 2025 às 21h55.
Em 1987, o economista Robert Solow, prêmio Nobel, cunhou uma frase que não poderia ser mais atual: “Você pode ver a era do computador em todos os lugares, menos nas estatísticas oficiais de produtividade”. Quase 40 anos depois, estamos vivendo o Paradoxo de Solow 2.0.
Embora a transformação tecnológica seja evidente no cotidiano, o ponteiro dos índices de produtividade agregada pouco se moveu na última década.
Como explicar esse abismo entre a revolução que sentimos na microeconomia, no dia a dia das empresas, e a lentidão da produtividade nos dados oficiais? A resposta mais provável é: estamos usando réguas do século XX para medir uma transformação do século XXI.
Há mais de uma década, o mundo observa um fenômeno curioso, em que novas tecnologias ampliam a eficiência, redesenham modelos de negócio e transformam cadeias de valor, mas os indicadores econômicos capturam apenas uma fração disso. A produtividade real é provavelmente maior do que os números capturam. O problema é que as métricas macroeconômicas foram desenhadas para uma economia tangível, focada em capital físico e horas trabalhadas. A economia atual cresce cada vez mais apoiada em automação e ativos intangíveis, que impactam muito e aparecem pouco nas métricas.
Isso não é um mero detalhe estatístico. Tem importância estrutural, com efeitos na inflação, no PIB, na competitividade e nos mercados de capitais. A produtividade é o motor silencioso do bem-estar. Quando ela sobe, salários podem crescer com menos pressão sobre preços, empresas ganham margem sem depender apenas do ciclo e países aumentam competitividade não por subsídio ou desvalorização cambial, mas por eficiência genuína.
No nível microeconômico, a IA transforma a natureza do trabalho de três formas que as estatísticas tradicionais do PIB subestimam:
Somados, esses ganhos diminuem a inflação e aumentam a velocidade de crescimento do PIB. Quando a tecnologia eleva a produtividade, como aconteceu no fim dos anos 1990, ocorre um efeito importante: a economia consegue produzir mais com os mesmos insumos, o que reduz custos e alivia a pressão de preços. Em outras palavras, o PIB pode crescer por um tempo sem gerar inflação imediata.
Esse atraso cria um risco político e fiscal: governos podem interpretar o alívio inflacionário como sinal de que há espaço permanente para gastar mais e expandir déficits. A matemática fiscal continua existindo, mas uma economia mais produtiva consegue absorver mais demanda antes de transformá-la em pressão de preços. É justamente essa janela de “inflação comportada” que aumenta o ímpeto dos políticos e pode incentivar a expansão do gasto público e do endividamento em vários países ao longo das últimas décadas.
O que isso significa para investidores?
Como gestor, eu resumiria a tese em quatro implicações práticas:
Conclusão: o micro dominando o macro
Neste momento, tem sido comum ouvirmos que a bolsa americana está cara. Ao mesmo tempo, o crescimento do lucro das empresas de tecnologia segue acima do histórico, e os investimentos na infraestrutura da economia digital seguem em ritmo acelerado. A nova economia influencia mais do que o seu próprio setor. Ela afeta produtividade, inflação, PIB, emprego e até a tolerância política ao endividamento público.
É preciso olhar por baixo da carapuça macroeconômica para entender que parte relevante do roteiro do macro, hoje, está sendo escrita pela microeconomia. Na era da IA, entender o macro exige destrinchar o micro.
Luigi Micales é gestor da Black Swan Investimentos e economista.