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O papel decisivo de Rodrigo Maia para 2018

O papel usual do presidente da Câmara é organizar a agenda legislativa proposta pelo governo, com o qual costuma ter ótima relação. Eduardo Cunha foi a exceção que confirmou a regra. E Rodrigo Maia?

MAIA E TEMER: o presidente da Câmara tem pouco a ganhar se levar adiante a reforma da Previdência / Ueslei Marcelino/ Reuters
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Da Redação

Publicado em 28 de outubro de 2017 às 07h09.

Eventos políticos têm, com frequência, efeitos imprevisíveis. O presidente Michel Temer (PMDB) certamente ficou aliviado com sua segunda “absolvição”, em menos de três meses, pela Câmara dos Deputados. Apesar da diminuição do número de parlamentares que o apoiaram, sua vitória foi determinada com folga de cerca de 100 votos. Bastante coisa. Não podemos culpá-lo por ter alguma empolgação com o resultado, até porque estamos biologicamente determinados para sermos otimistas. Mas o presidente não deve ter imaginado a principal consequência de sua vitória política: o fortalecimento de Rodrigo Maia (DEM), presidente da Câmara dos Deputados.

Em tempos normais, a presidência da Câmara é o segundo cargo mais importante do país. Nosso vice-presidente mais influente em seus últimos meses de mandato, o próprio Temer, só conseguiu essa distinção ao aliar-se a Eduardo Cunha (PMDB), presidente da Câmara por pouco mais de um ano. Ao assumir a presidência da República, o peemedebista buscou concentrar as prerrogativas de chefe da Câmara e da República. O papel usual do presidente da Câmara é organizar a agenda legislativa proposta pelo governo, com o qual costuma ter ótima relação. Eduardo Cunha foi a exceção que confirmou a regra. E Rodrigo Maia?

As últimas indicações do “Botafogo” – apelido de Maia nas planilhas da Odebrecht – foram no sentido de formar uma liderança paralela à do presidente da República. Desabafou que obteve sugestões, durante a tramitação da primeira denúncia contra o presidente, para derrubar Temer. E sugeriu ao peemedebista que organizasse, o mais rápido possível, uma reforma ministerial para acomodar as bancadas partidárias. Como disse Joesley Batista, nessa escola Temer é professor. Sua capacidade de gerenciar a coalizão tem sido notável diante de tamanha impopularidade. Alguns deputados podem estar genuinamente insatisfeitos, mas o fato é que a distribuição de ministérios feita por Temer tem tido excepcional estabilidade em comparação aos outros presidentes após 1988. Maia obviamente sabe disso. Por que, então, estaria “fustigando” o presidente?

Há duas explicações plausíveis. A primeira é que diante do vácuo de poder que ora se desenha no país, Maia quer se tornar uma espécie de “Eduardo Cunha do bem” (não do DEM! não do DEM!). Noves fora toda a corrupção, Cunha propôs uma agenda legislativa paralela à do governo. Através dos consideráveis poderes regimentais de que qualquer presidente da Câmara dos Deputados dispõe, conseguiu colocar em votação no plenário projetos de seu interesse. Perdeu uns, ganhou outros. O interessante é que fez algo inédito no período pós-88 e que pode ser agora imitado por Rodrigo Maia: agiu como um “segundo gerente” de coalizão.

O “primeiro gerente”, claro, é sempre o presidente da República. Quando só um ator político tenta organizar a coalizão, o custo pode ser altíssimo. Afinal, cada partido que entra na coalizão poderá cobrar um preço sabendo que concorre com outros, mas o presidente precisará atrair vários. A competição entre partidos para participar da coalizão poderia, em tese, diminuir o preço de cada um. O problema é que o presidente precisa acumular vários em sua base, pois uma “supermaioria” será necessária para garantir a aprovação de leis. Defecções e ausências na base são esperadas.

O presidente precisa de muitos recursos para atrair diversos partidos. Mas, se houver um “segundo gerente” da coalizão – papel que pode ser ocupado pelo presidente da Câmara dos Deputados –, o custo diminui. (O argumento é dos cientistas políticos Tim Groseclose e James Snyder Jr. em “Buying Supermajorities”, artigo publicado pela American Political Science Review em 1996.) Rodrigo Maia se atreverá a competir com Temer pelo apoio dos deputados? Suas últimas manifestações públicas indicam que essa possibilidade não pode ser descartada.

A segunda explicação para o comportamento de Maia é que ele quer ser um grande “eleitor” em 2018. Disse que um candidato de centro, “conservador nos valores e liberal na economia”, terá boas chances de se tornar presidente ano que vem. E o deputado carioca poderia, talvez, ser vice na chapa ou um ministro relevante no futuro governo. Mas, para isso, Maia não poderia liderar a aprovação da Reforma da Previdência. É isto mesmo que ele tem indicado nas últimas semanas. Por mais crucial para o futuro do Brasil que seja a reforma, ela é bastante impopular.

Como afirma o cientista político Paul Pierson, em reformas desse tipo os atores políticos procuram transferir a culpa e a responsabilidade para outros. (Um dos artigos de Pierson sobre o assunto é “The new politics of the welfare State”, publicado pela World Politics em 1996.) Nesse aspecto, Maia está melhor do que Temer. O DEM não foi da coalizão petista que levou a este descalabro nas finanças públicas. Poderia culpar Dilma e o PT de modo crível. Ainda assim, Maia tem pouco a ganhar se levar adiante a reforma.

E se Michel Temer insistir? Talvez ele aprenda uma lição exposta por Argelina Figueiredo e Fernando Limongi em um artigo sobre a Reforma da Previdência aprovada pelos parlamentares a pedido de Fernando Henrique Cardoso em 1998. (O texto é “Reforma da Previdência e instituições políticas”, publicado pela Novos Estudos Cebrap em 1998.) Os cientistas políticos mostram que a reforma só foi bem-sucedida graças às artimanhas regimentais de Luís Eduardo Magalhães, então presidente da Câmara dos Deputados, e do deputado federal Michel Temer, entre outros. Pelo que tem dito, Rodrigo Maia não será o Temer de Temer.

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Eventos políticos têm, com frequência, efeitos imprevisíveis. O presidente Michel Temer (PMDB) certamente ficou aliviado com sua segunda “absolvição”, em menos de três meses, pela Câmara dos Deputados. Apesar da diminuição do número de parlamentares que o apoiaram, sua vitória foi determinada com folga de cerca de 100 votos. Bastante coisa. Não podemos culpá-lo por ter alguma empolgação com o resultado, até porque estamos biologicamente determinados para sermos otimistas. Mas o presidente não deve ter imaginado a principal consequência de sua vitória política: o fortalecimento de Rodrigo Maia (DEM), presidente da Câmara dos Deputados.

Em tempos normais, a presidência da Câmara é o segundo cargo mais importante do país. Nosso vice-presidente mais influente em seus últimos meses de mandato, o próprio Temer, só conseguiu essa distinção ao aliar-se a Eduardo Cunha (PMDB), presidente da Câmara por pouco mais de um ano. Ao assumir a presidência da República, o peemedebista buscou concentrar as prerrogativas de chefe da Câmara e da República. O papel usual do presidente da Câmara é organizar a agenda legislativa proposta pelo governo, com o qual costuma ter ótima relação. Eduardo Cunha foi a exceção que confirmou a regra. E Rodrigo Maia?

As últimas indicações do “Botafogo” – apelido de Maia nas planilhas da Odebrecht – foram no sentido de formar uma liderança paralela à do presidente da República. Desabafou que obteve sugestões, durante a tramitação da primeira denúncia contra o presidente, para derrubar Temer. E sugeriu ao peemedebista que organizasse, o mais rápido possível, uma reforma ministerial para acomodar as bancadas partidárias. Como disse Joesley Batista, nessa escola Temer é professor. Sua capacidade de gerenciar a coalizão tem sido notável diante de tamanha impopularidade. Alguns deputados podem estar genuinamente insatisfeitos, mas o fato é que a distribuição de ministérios feita por Temer tem tido excepcional estabilidade em comparação aos outros presidentes após 1988. Maia obviamente sabe disso. Por que, então, estaria “fustigando” o presidente?

Há duas explicações plausíveis. A primeira é que diante do vácuo de poder que ora se desenha no país, Maia quer se tornar uma espécie de “Eduardo Cunha do bem” (não do DEM! não do DEM!). Noves fora toda a corrupção, Cunha propôs uma agenda legislativa paralela à do governo. Através dos consideráveis poderes regimentais de que qualquer presidente da Câmara dos Deputados dispõe, conseguiu colocar em votação no plenário projetos de seu interesse. Perdeu uns, ganhou outros. O interessante é que fez algo inédito no período pós-88 e que pode ser agora imitado por Rodrigo Maia: agiu como um “segundo gerente” de coalizão.

O “primeiro gerente”, claro, é sempre o presidente da República. Quando só um ator político tenta organizar a coalizão, o custo pode ser altíssimo. Afinal, cada partido que entra na coalizão poderá cobrar um preço sabendo que concorre com outros, mas o presidente precisará atrair vários. A competição entre partidos para participar da coalizão poderia, em tese, diminuir o preço de cada um. O problema é que o presidente precisa acumular vários em sua base, pois uma “supermaioria” será necessária para garantir a aprovação de leis. Defecções e ausências na base são esperadas.

O presidente precisa de muitos recursos para atrair diversos partidos. Mas, se houver um “segundo gerente” da coalizão – papel que pode ser ocupado pelo presidente da Câmara dos Deputados –, o custo diminui. (O argumento é dos cientistas políticos Tim Groseclose e James Snyder Jr. em “Buying Supermajorities”, artigo publicado pela American Political Science Review em 1996.) Rodrigo Maia se atreverá a competir com Temer pelo apoio dos deputados? Suas últimas manifestações públicas indicam que essa possibilidade não pode ser descartada.

A segunda explicação para o comportamento de Maia é que ele quer ser um grande “eleitor” em 2018. Disse que um candidato de centro, “conservador nos valores e liberal na economia”, terá boas chances de se tornar presidente ano que vem. E o deputado carioca poderia, talvez, ser vice na chapa ou um ministro relevante no futuro governo. Mas, para isso, Maia não poderia liderar a aprovação da Reforma da Previdência. É isto mesmo que ele tem indicado nas últimas semanas. Por mais crucial para o futuro do Brasil que seja a reforma, ela é bastante impopular.

Como afirma o cientista político Paul Pierson, em reformas desse tipo os atores políticos procuram transferir a culpa e a responsabilidade para outros. (Um dos artigos de Pierson sobre o assunto é “The new politics of the welfare State”, publicado pela World Politics em 1996.) Nesse aspecto, Maia está melhor do que Temer. O DEM não foi da coalizão petista que levou a este descalabro nas finanças públicas. Poderia culpar Dilma e o PT de modo crível. Ainda assim, Maia tem pouco a ganhar se levar adiante a reforma.

E se Michel Temer insistir? Talvez ele aprenda uma lição exposta por Argelina Figueiredo e Fernando Limongi em um artigo sobre a Reforma da Previdência aprovada pelos parlamentares a pedido de Fernando Henrique Cardoso em 1998. (O texto é “Reforma da Previdência e instituições políticas”, publicado pela Novos Estudos Cebrap em 1998.) Os cientistas políticos mostram que a reforma só foi bem-sucedida graças às artimanhas regimentais de Luís Eduardo Magalhães, então presidente da Câmara dos Deputados, e do deputado federal Michel Temer, entre outros. Pelo que tem dito, Rodrigo Maia não será o Temer de Temer.

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