No país da biodiversidade, faltam recursos para gerir os nossos parques
Natureza nos dá motivos de sobra para enaltecer nossos parques, mas realidade de escassez e limitação de recursos tem comprometido seu potencial
Bibiana Guaraldi
Publicado em 27 de abril de 2021 às 07h09.
Quem já visitou algum parque natural brasileiro , certamente se surpreendeu com tamanha exuberância cênica desses locais. Não por acaso, nossos parques conservam uma rica biodiversidade – uma das maiores do mundo – cuja excepcionalidade projetou algumas dessas áreas ao patamar de patrimônio natural da humanidade. Enquanto a natureza nos dá motivos de sobra para enaltecer nossos parques, a realidade de escassez e limitação de recursos para a gestão e manutenção dessas áreas tem comprometido grande parte do seu potencial gerador de desenvolvimento, saúde e bem-estar – para não mencionar a vulnerabilidade a que sua fauna e flora ficam expostas.
Esse retrato de limitações foi capturado na edição recém-lançada da pesquisa Diagnóstico de Uso Público em Parques Brasileiros: A Perspectiva da Gestão , produzida pelo Instituto Semeia junto a equipes gestoras de 370 parques de todas as regiões, biomas e níveis governamentais do país. O sinal de alerta dessa escassez de recursos foi declarado por 67% dos respondentes, que afirmaram não contar com subsídios – humanos e financeiros – necessários para a realização de suas atividades no parque.
Ainda de acordo com a pesquisa, grande parte (49%) das equipes que administram essas áreas conta somente com até 10 funcionários, ao passo que 9% possuem apenas um colaborador. Na prática, isso quer dizer que, no caso dos parques nacionais, um único funcionário fica responsável, em média, por quase 11 mil hectares – o que equivale a cerca de 11 mil campos de futebol. Já na esfera estadual, seria um funcionário para, aproximadamente, 2 mil hectares e, na municipal, um funcionário para 58 hectares.
Quando o assunto é a gestão financeira desses espaços, além da escassez de recursos, o cenário é também de falta de informação: 40% dos respondentes declaram não ter acesso aos dados orçamentários das unidades em que atuam. Entre os que têm acesso a esses números, seja de forma parcial ou total, o valor médio do orçamento em 2019 para os parques federais foi de R$ 790 mil, para os municipais, de R$ 800 mil, e os estaduais, R$ 9,6 milhões.
Para se ter uma ideia, o National Park Service (órgão norte-americano responsável por 421 unidades distribuídas em 34 milhões de hectares) teve em 2019 um orçamento de USD 2,4 bilhões. No mesmo ano, o orçamento do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) foi de USD 142,6 milhões (em reais, 791 milhões), para administrar uma área cinco vezes maior (se considerarmos unidades de conservação terrestres e marinhas).
Tudo isso se reflete nas condições de visitação e uso público dos parques brasileiros. Mais da metade declara não contar com infraestrutura básica para receber visitantes – como banheiro e estacionamento, por exemplo. E, entre as unidades que receberam visitantes em 2019 (79%), apenas 7% afirmam contar com uma estrutura que garante plenamente as necessidades básicas de visitação, enquanto somente 11% consideram que a manutenção das estruturas está em excelente estado.
Esses dados evidenciam uma triste contradição: se, por um lado, nossos parques possuem belezas naturais únicas, equipes altamente qualificadas e experientes, além de um potencial turístico promissor, por outro, tudo isso se arrefece com a precariedade observada na implementação e manutenção das atividades de uso público na maioria deles. Basta pensar que, em 2019, o Brasil foi listado pelo Fórum Econômico Mundial como 2º lugar em recursos naturais, mas figura somente na 32ª colocação do ranking global de competitividade turística.
Alcançar um patamar condizente à altura do nosso capital natural é mais do que possível. Para isso, faz-se necessário fortalecer os órgãos gestores dessas áreas e avançar numa agenda mais moderna, empreendedora e sustentável voltada à gestão desses espaços. E, nesse sentido, as parcerias e concessões podem ser uma alternativa possível – já experimentadas em alguns parques brasileiros internacionalmente reconhecidos, como Iguaçu e Chapada dos Veadeiros, por exemplo – para apoiar as equipes gestoras a potencializar a visitação, o turismo e a conservação. Afinal de contas, quanto mais os brasileiros conhecerem o seu patrimônio natural, maior será a conscientização sobre o valor e a necessidade de cuidar dessas áreas.
*Mariana Haddadé Coordenadora de Conhecimento do Instituto Semeia e responsável pela pesquisa
*Aline Rezendeé Coordenadora de Comunicação do Instituto Semeia
Quem já visitou algum parque natural brasileiro , certamente se surpreendeu com tamanha exuberância cênica desses locais. Não por acaso, nossos parques conservam uma rica biodiversidade – uma das maiores do mundo – cuja excepcionalidade projetou algumas dessas áreas ao patamar de patrimônio natural da humanidade. Enquanto a natureza nos dá motivos de sobra para enaltecer nossos parques, a realidade de escassez e limitação de recursos para a gestão e manutenção dessas áreas tem comprometido grande parte do seu potencial gerador de desenvolvimento, saúde e bem-estar – para não mencionar a vulnerabilidade a que sua fauna e flora ficam expostas.
Esse retrato de limitações foi capturado na edição recém-lançada da pesquisa Diagnóstico de Uso Público em Parques Brasileiros: A Perspectiva da Gestão , produzida pelo Instituto Semeia junto a equipes gestoras de 370 parques de todas as regiões, biomas e níveis governamentais do país. O sinal de alerta dessa escassez de recursos foi declarado por 67% dos respondentes, que afirmaram não contar com subsídios – humanos e financeiros – necessários para a realização de suas atividades no parque.
Ainda de acordo com a pesquisa, grande parte (49%) das equipes que administram essas áreas conta somente com até 10 funcionários, ao passo que 9% possuem apenas um colaborador. Na prática, isso quer dizer que, no caso dos parques nacionais, um único funcionário fica responsável, em média, por quase 11 mil hectares – o que equivale a cerca de 11 mil campos de futebol. Já na esfera estadual, seria um funcionário para, aproximadamente, 2 mil hectares e, na municipal, um funcionário para 58 hectares.
Quando o assunto é a gestão financeira desses espaços, além da escassez de recursos, o cenário é também de falta de informação: 40% dos respondentes declaram não ter acesso aos dados orçamentários das unidades em que atuam. Entre os que têm acesso a esses números, seja de forma parcial ou total, o valor médio do orçamento em 2019 para os parques federais foi de R$ 790 mil, para os municipais, de R$ 800 mil, e os estaduais, R$ 9,6 milhões.
Para se ter uma ideia, o National Park Service (órgão norte-americano responsável por 421 unidades distribuídas em 34 milhões de hectares) teve em 2019 um orçamento de USD 2,4 bilhões. No mesmo ano, o orçamento do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) foi de USD 142,6 milhões (em reais, 791 milhões), para administrar uma área cinco vezes maior (se considerarmos unidades de conservação terrestres e marinhas).
Tudo isso se reflete nas condições de visitação e uso público dos parques brasileiros. Mais da metade declara não contar com infraestrutura básica para receber visitantes – como banheiro e estacionamento, por exemplo. E, entre as unidades que receberam visitantes em 2019 (79%), apenas 7% afirmam contar com uma estrutura que garante plenamente as necessidades básicas de visitação, enquanto somente 11% consideram que a manutenção das estruturas está em excelente estado.
Esses dados evidenciam uma triste contradição: se, por um lado, nossos parques possuem belezas naturais únicas, equipes altamente qualificadas e experientes, além de um potencial turístico promissor, por outro, tudo isso se arrefece com a precariedade observada na implementação e manutenção das atividades de uso público na maioria deles. Basta pensar que, em 2019, o Brasil foi listado pelo Fórum Econômico Mundial como 2º lugar em recursos naturais, mas figura somente na 32ª colocação do ranking global de competitividade turística.
Alcançar um patamar condizente à altura do nosso capital natural é mais do que possível. Para isso, faz-se necessário fortalecer os órgãos gestores dessas áreas e avançar numa agenda mais moderna, empreendedora e sustentável voltada à gestão desses espaços. E, nesse sentido, as parcerias e concessões podem ser uma alternativa possível – já experimentadas em alguns parques brasileiros internacionalmente reconhecidos, como Iguaçu e Chapada dos Veadeiros, por exemplo – para apoiar as equipes gestoras a potencializar a visitação, o turismo e a conservação. Afinal de contas, quanto mais os brasileiros conhecerem o seu patrimônio natural, maior será a conscientização sobre o valor e a necessidade de cuidar dessas áreas.
*Mariana Haddadé Coordenadora de Conhecimento do Instituto Semeia e responsável pela pesquisa
*Aline Rezendeé Coordenadora de Comunicação do Instituto Semeia