No Brasil, corruptos são os outros
Nunca se falou tanto sobre a corrupção no Brasil. O mal é visto como a raiz da crise econômica. O debate sobre ética ganhou as mesas de bar, os almoços de família e os salões de beleza. Homens, mulheres e crianças de todas as classes e cantos do país passaram a debater a corrupção dos […]
Da Redação
Publicado em 25 de abril de 2016 às 12h28.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h31.
Nunca se falou tanto sobre a corrupção no Brasil. O mal é visto como a raiz da crise econômica. O debate sobre ética ganhou as mesas de bar, os almoços de família e os salões de beleza. Homens, mulheres e crianças de todas as classes e cantos do país passaram a debater a corrupção dos políticos, mas damos pouca importância às pequenas “corrupções cotidianas”, mais presentes em nossa vida do que se pode imaginar.
O famoso “jeitinho brasileiro” acabou virando um termo simpático para muitas atitudes do dia a dia. Uma maneira de tornar mais leve o flagelo moral da nossa sociedade. Essa prática é tão cotidiana que quem a comete nem se lembra que também é uma forma de corrupção. Mas será que a população só considera corrupção algum escândalo no poder público? Movido por essa curiosidade, fui pesquisar como os brasileiros se sentem diante de atos ilícitos ou eticamente questionáveis. Confesso que me assustei com as respostas.
Em tempos de impeachment, quando perguntamos diretamente às pessoas se elas se consideram corruptas, menos de 3% admitem ser. No entanto, quando listamos uma série de atos ilícitos presentes no dia a dia, sete em cada dez disseram que já cometeram pelo menos uma atitude ilegal. Pode parecer ranhetice minha, afinal, “quem nunca?” Mas são essas as atitudes que formam um caldo de impunidade que acaba prejudicando todos nós. Vamos ver alguns exemplos:
· 67% dos brasileiros afirmam comprar produtos piratas (muitos são de qualidade duvidosa, importados ou fabricados por mão de obra informal, o que prejudica a economia brasileira);
· mais de 33 milhões de pessoas afirmam que não devolveram o troco a mais que receberam ao fazer alguma compra;
· três em cada dez brasileiros afirmam que conhecem alguém que já fez “gato” na TV por assinatura;
· os ingressos de cinema, show e teatro são muito caros e a cultura é fundamental, não é mesmo? Por essa razão, 22 milhões de pessoas relatam que já compraram meio ingresso com uma carteirinha de estudante que não era sua ou que era falsificada.
Infelizmente, o “jeitinho” está naturalizado no comportamento de boa parte da população. Virou sinônimo de ser esperto. Exemplo de inteligência. Contra a “indústria das multas”, mais de 10 milhões de brasileiros dizem ter pagado propina a algum policial ou agente de fiscalização. Para “se proteger” do imposto de renda, 22,3 milhões dizem que conhecem alguém que já mentiu na declaração. Não preciso dizer aqui que o dinheiro que se deixa de recolher prejudica um conjunto de políticas públicas de saúde e educação. Não se rouba do governo, mas de todos nós.
O resultado da pesquisa mostra que, para a maioria absoluta da população deste país — que costuma falar sem nenhum constrangimento que “ladrão que rouba ladrão tem 100 anos de perdão” —, o corrupto é sempre o outro. Vivemos uma epidemia. Sofremos de corrupção endêmica. Muitos tentam justificar seu erro com os erros dos outros. É latente a incoerência de uma sociedade que fica inconformada com os atos de corrupção no ambiente público e não encara o desvio privado como atitude ilícita. Passar “o Brasil a limpo” implica ter tolerância zero com as corrupções do nosso dia a dia.
Nunca se falou tanto sobre a corrupção no Brasil. O mal é visto como a raiz da crise econômica. O debate sobre ética ganhou as mesas de bar, os almoços de família e os salões de beleza. Homens, mulheres e crianças de todas as classes e cantos do país passaram a debater a corrupção dos políticos, mas damos pouca importância às pequenas “corrupções cotidianas”, mais presentes em nossa vida do que se pode imaginar.
O famoso “jeitinho brasileiro” acabou virando um termo simpático para muitas atitudes do dia a dia. Uma maneira de tornar mais leve o flagelo moral da nossa sociedade. Essa prática é tão cotidiana que quem a comete nem se lembra que também é uma forma de corrupção. Mas será que a população só considera corrupção algum escândalo no poder público? Movido por essa curiosidade, fui pesquisar como os brasileiros se sentem diante de atos ilícitos ou eticamente questionáveis. Confesso que me assustei com as respostas.
Em tempos de impeachment, quando perguntamos diretamente às pessoas se elas se consideram corruptas, menos de 3% admitem ser. No entanto, quando listamos uma série de atos ilícitos presentes no dia a dia, sete em cada dez disseram que já cometeram pelo menos uma atitude ilegal. Pode parecer ranhetice minha, afinal, “quem nunca?” Mas são essas as atitudes que formam um caldo de impunidade que acaba prejudicando todos nós. Vamos ver alguns exemplos:
· 67% dos brasileiros afirmam comprar produtos piratas (muitos são de qualidade duvidosa, importados ou fabricados por mão de obra informal, o que prejudica a economia brasileira);
· mais de 33 milhões de pessoas afirmam que não devolveram o troco a mais que receberam ao fazer alguma compra;
· três em cada dez brasileiros afirmam que conhecem alguém que já fez “gato” na TV por assinatura;
· os ingressos de cinema, show e teatro são muito caros e a cultura é fundamental, não é mesmo? Por essa razão, 22 milhões de pessoas relatam que já compraram meio ingresso com uma carteirinha de estudante que não era sua ou que era falsificada.
Infelizmente, o “jeitinho” está naturalizado no comportamento de boa parte da população. Virou sinônimo de ser esperto. Exemplo de inteligência. Contra a “indústria das multas”, mais de 10 milhões de brasileiros dizem ter pagado propina a algum policial ou agente de fiscalização. Para “se proteger” do imposto de renda, 22,3 milhões dizem que conhecem alguém que já mentiu na declaração. Não preciso dizer aqui que o dinheiro que se deixa de recolher prejudica um conjunto de políticas públicas de saúde e educação. Não se rouba do governo, mas de todos nós.
O resultado da pesquisa mostra que, para a maioria absoluta da população deste país — que costuma falar sem nenhum constrangimento que “ladrão que rouba ladrão tem 100 anos de perdão” —, o corrupto é sempre o outro. Vivemos uma epidemia. Sofremos de corrupção endêmica. Muitos tentam justificar seu erro com os erros dos outros. É latente a incoerência de uma sociedade que fica inconformada com os atos de corrupção no ambiente público e não encara o desvio privado como atitude ilícita. Passar “o Brasil a limpo” implica ter tolerância zero com as corrupções do nosso dia a dia.