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Efeitos da prisão de Cunha só em 2017

Christopher Garman O ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha finalmente foi preso, e a grande questão que circula pelos corredores de Brasília é que tipo de dano ele pode causar à administração Temer. Há inúmeras razões para o Palácio do Planalto estar preocupado. Em contraste com outros operadores do PMDB que colaboraram com a Justiça na […]

MICHEL TEMER E EDUARDO CUNHA: para Garman, as chances do ex-deputado derrubar este governo são muito pequenas / Antonio Cruz/Agência Brasil (Antonio Cruz/Agência Brasil)
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Da Redação

Publicado em 22 de outubro de 2016 às 09h02.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h03.

Christopher Garman

O ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha finalmente foi preso, e a grande questão que circula pelos corredores de Brasília é que tipo de dano ele pode causar à administração Temer. Há inúmeras razões para o Palácio do Planalto estar preocupado.

Em contraste com outros operadores do PMDB que colaboraram com a Justiça na órbita da investigação da Lava Jato, mais notavelmente Sérgio Machado, este é o primeiro peixe grande do partido na Câmara dos Deputados que é mandado à prisão. É importante lembrar que o PMDB é muito mais uma aglomeração de máquinas políticas regionais do que um partido unido, e que há uma divisão clara entre a ala do partido no Senado, liderada pelo senador Renan Calheiros, e a ala do partido na Câmara dos Deputados, de quem o presidente Michel Temer tem sido um líder-chave. Na verdade, os dois lados geralmente competiam entre si pelo acesso ao governo nos governos do PT. Mais especificamente, Eduardo Cunha tem sido um aliado de longa data do presidente Temer e de seu círculo mais próximo de assessores, muitos dos quais são ministros com papel estratégico no governo atual. Isso significa que Eduardo Cunha certamente tem potencial de alvejar muitos ministros da atual administração, e potencialmente até mesmo o presidente, enquanto negocia uma delação premiada com os promotores.

A questão não é tanto se Cunha vai falar, mas sim como nós devemos interpretar o dano que ele pode causar. Claro, muito vai depender do que sairá de seu provável acordo de delação. Também não devemos esquecer do dano que pode surgir do acordo de delação sendo negociado por quase 80 executivos da Odebrecht. Mas a melhor aposta é que o estrago político ao governo Temer e às suas reformas será mais sentido em 2017. De fato, no que diz respeito às votações no Congresso nos próximos meses, isso pode paradoxalmente ajudar a aprovar o teto de gastos (PEC 241). Mas a história provavelmente será outra quando a reforma da Previdência for a votação no ano que vem.

Em primeiro lugar, as chances de Eduardo Cunha derrubar este governo são muito pequenas. O presidente Michel Temer tem dois fatores de peso a seu favor: apoio amplo a seu governo no Congresso e junto à elite econômica. Há uma avaliação clara hoje no Congresso de que o custo de um “fracasso” do governo Temer será enorme. Deputados federais e senadores estão bastante cientes de que os eleitores estão irritados com os políticos, que suas fontes tradicionais de financiamento eleitoral secaram, e, mais amplamente, que se o país continuar a enfrentar uma crise econômica e fiscal incontrolável suas máquinas políticas correrão risco nas eleições de 2018. Isso não ajudou apenas a conduzir o impeachment de Dilma Rousseff, mas é o que também dá a Temer bastante força para aprovar suas reformas no Congresso.

A reação do Congresso à queda de três ministros de Temer em dois meses de mandato – Romero Jucá (Planejamento), Henrique Eduardo Alves (Turismo) e Fábio Silveira (Transparência) – dá uma boa ideia de como o Legislativo reagirá daqui em diante. Em lugar de abandonar Temer, eles responderam pondo em votação a pauta do governo no Congresso precisamente para mostrar que este governo não estava para entrar em crise. Em outras palavras, tão logo a Lava Jato ameaçou o nascente governo Temer, a reação no Congresso foi reunir as tropas em torno do novo presidente.  Nós desconfiamos que o mesmo vai acontecer se Cunha atirar nos ministros próximos a Temer. O Palácio do Planalto certamente tentará acelerar a votação da PEC 241, e o receio de que o governo Temer seja visto como fraco atrairá um apoio ainda maior.

No que se trata de comprometer Temer, a dificuldade também é grande. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem dado sinais claros de que não quer decidir pela anulação da chapa que venceu a eleição de 2014 e cassação do mandato de Temer. Isso ficou claro não só na morosidade para julgar a ação sobre a eleição de 2014, mas também por causa de declarações do ministro Luiz Fux, de que o tribunal poderia acolher o pedido da defesa de Temer, de que suas contas fossem julgadas em separado das de Dilma Rousseff. Tudo isso significa que vai ser preciso muito mais que uma nova leva de acusações de caixa 2 contra Temer para botar este governo abaixo ou minar suas reformas.

Porém, ano que vem a história será diferente. Em primeiro lugar, 2017 será quando as acusações contra políticos começarão a serem julgadas. O julgamento pelo STF de políticos com foro privilegiado tramita com lentidão, e Cunha levará meses negociando um acordo de delação com os promotores. Como resultado, embora as acusações possam ser apresentadas, o legisladores no Congresso só começarão a sentir os impactos no ano que vem. Além disso, se a economia começar a se recuperar justamente porque Temer obteve vitórias no Congresso sobre o teto de gastos, e o Banco Central continuar a cortar taxas de juros, o sinal de “crise” no Congresso pode diminuir. Em outras palavras, a obra da dita “ponte” para 2018 parecerá estar bem avançada. Isso significa que os legisladores sentirão menos urgência para aprovar as reformas de Temer, e que suas atenções estarão mais concentradas nas eleições de 2018.

Em outras palavras, no ano que vem, a Lava Jato atingindo o governo Temer pode não resultar em apoio às reformas. Isso não é bom para a reforma da Previdência, que a administração está preparando para apresentar no começo de Novembro. O governo não só estará votando a reforma politicamente mais difícil um ano antes das eleições de 2018 em um contexto de urgência menor, mas também no momento em que as acusações de Eduardo Cunha, além das da Odebrecht, estarão atingindo o Congresso em cheio. Não é uma boa combinação.

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Christopher Garman

O ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha finalmente foi preso, e a grande questão que circula pelos corredores de Brasília é que tipo de dano ele pode causar à administração Temer. Há inúmeras razões para o Palácio do Planalto estar preocupado.

Em contraste com outros operadores do PMDB que colaboraram com a Justiça na órbita da investigação da Lava Jato, mais notavelmente Sérgio Machado, este é o primeiro peixe grande do partido na Câmara dos Deputados que é mandado à prisão. É importante lembrar que o PMDB é muito mais uma aglomeração de máquinas políticas regionais do que um partido unido, e que há uma divisão clara entre a ala do partido no Senado, liderada pelo senador Renan Calheiros, e a ala do partido na Câmara dos Deputados, de quem o presidente Michel Temer tem sido um líder-chave. Na verdade, os dois lados geralmente competiam entre si pelo acesso ao governo nos governos do PT. Mais especificamente, Eduardo Cunha tem sido um aliado de longa data do presidente Temer e de seu círculo mais próximo de assessores, muitos dos quais são ministros com papel estratégico no governo atual. Isso significa que Eduardo Cunha certamente tem potencial de alvejar muitos ministros da atual administração, e potencialmente até mesmo o presidente, enquanto negocia uma delação premiada com os promotores.

A questão não é tanto se Cunha vai falar, mas sim como nós devemos interpretar o dano que ele pode causar. Claro, muito vai depender do que sairá de seu provável acordo de delação. Também não devemos esquecer do dano que pode surgir do acordo de delação sendo negociado por quase 80 executivos da Odebrecht. Mas a melhor aposta é que o estrago político ao governo Temer e às suas reformas será mais sentido em 2017. De fato, no que diz respeito às votações no Congresso nos próximos meses, isso pode paradoxalmente ajudar a aprovar o teto de gastos (PEC 241). Mas a história provavelmente será outra quando a reforma da Previdência for a votação no ano que vem.

Em primeiro lugar, as chances de Eduardo Cunha derrubar este governo são muito pequenas. O presidente Michel Temer tem dois fatores de peso a seu favor: apoio amplo a seu governo no Congresso e junto à elite econômica. Há uma avaliação clara hoje no Congresso de que o custo de um “fracasso” do governo Temer será enorme. Deputados federais e senadores estão bastante cientes de que os eleitores estão irritados com os políticos, que suas fontes tradicionais de financiamento eleitoral secaram, e, mais amplamente, que se o país continuar a enfrentar uma crise econômica e fiscal incontrolável suas máquinas políticas correrão risco nas eleições de 2018. Isso não ajudou apenas a conduzir o impeachment de Dilma Rousseff, mas é o que também dá a Temer bastante força para aprovar suas reformas no Congresso.

A reação do Congresso à queda de três ministros de Temer em dois meses de mandato – Romero Jucá (Planejamento), Henrique Eduardo Alves (Turismo) e Fábio Silveira (Transparência) – dá uma boa ideia de como o Legislativo reagirá daqui em diante. Em lugar de abandonar Temer, eles responderam pondo em votação a pauta do governo no Congresso precisamente para mostrar que este governo não estava para entrar em crise. Em outras palavras, tão logo a Lava Jato ameaçou o nascente governo Temer, a reação no Congresso foi reunir as tropas em torno do novo presidente.  Nós desconfiamos que o mesmo vai acontecer se Cunha atirar nos ministros próximos a Temer. O Palácio do Planalto certamente tentará acelerar a votação da PEC 241, e o receio de que o governo Temer seja visto como fraco atrairá um apoio ainda maior.

No que se trata de comprometer Temer, a dificuldade também é grande. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem dado sinais claros de que não quer decidir pela anulação da chapa que venceu a eleição de 2014 e cassação do mandato de Temer. Isso ficou claro não só na morosidade para julgar a ação sobre a eleição de 2014, mas também por causa de declarações do ministro Luiz Fux, de que o tribunal poderia acolher o pedido da defesa de Temer, de que suas contas fossem julgadas em separado das de Dilma Rousseff. Tudo isso significa que vai ser preciso muito mais que uma nova leva de acusações de caixa 2 contra Temer para botar este governo abaixo ou minar suas reformas.

Porém, ano que vem a história será diferente. Em primeiro lugar, 2017 será quando as acusações contra políticos começarão a serem julgadas. O julgamento pelo STF de políticos com foro privilegiado tramita com lentidão, e Cunha levará meses negociando um acordo de delação com os promotores. Como resultado, embora as acusações possam ser apresentadas, o legisladores no Congresso só começarão a sentir os impactos no ano que vem. Além disso, se a economia começar a se recuperar justamente porque Temer obteve vitórias no Congresso sobre o teto de gastos, e o Banco Central continuar a cortar taxas de juros, o sinal de “crise” no Congresso pode diminuir. Em outras palavras, a obra da dita “ponte” para 2018 parecerá estar bem avançada. Isso significa que os legisladores sentirão menos urgência para aprovar as reformas de Temer, e que suas atenções estarão mais concentradas nas eleições de 2018.

Em outras palavras, no ano que vem, a Lava Jato atingindo o governo Temer pode não resultar em apoio às reformas. Isso não é bom para a reforma da Previdência, que a administração está preparando para apresentar no começo de Novembro. O governo não só estará votando a reforma politicamente mais difícil um ano antes das eleições de 2018 em um contexto de urgência menor, mas também no momento em que as acusações de Eduardo Cunha, além das da Odebrecht, estarão atingindo o Congresso em cheio. Não é uma boa combinação.

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