Exame.com
Continua após a publicidade

Política também é nosso lugar

Precisamos de um diálogo mais transparente, ações mais conscientes, eficientes e sim, mais mulheres na política

Jacinda Ardern, primeira-ministra da Nova Zelândia: resposta eficiente diante da pandemia mostra poder das mulheres na política (Birgit Krippner/Bloomberg)
Jacinda Ardern, primeira-ministra da Nova Zelândia: resposta eficiente diante da pandemia mostra poder das mulheres na política (Birgit Krippner/Bloomberg)
N
Nosso Olhar

Publicado em 16 de julho de 2020 às, 10h14.

Última atualização em 16 de julho de 2020 às, 10h15.

2020. Um ano em que tudo virou de ponta cabeça. Pandemia. Crise econômica. Crise social. Crise política. Um ano onde as transformações não podem mais ser apenas aquelas faladas. Precisamos de ações reais para uma transformação efetiva. Quando o poder público não deu conta, tivemos um papel importante de instituições privadas para a crise não estar ainda pior do que está. E quando olhamos para o poder público, o que vem acontecendo não é razoável. Precisamos de um diálogo mais transparente, ações mais conscientes, eficientes e sim, mais mulheres na política. Somos 51% da população, mas representamos apenas 12% das prefeituras e 15% da Câmara.

E por que falar de mais mulheres na política no meio da crise de Covid-19? Mulheres foram as mais afetadas pela pandemia: altos índices de desemprego, aumento de 30-50% nos casos de violência, mulheres também são as mais responsáveis pelo trabalho doméstico, no cuidado com os filhos, com os idosos e são elas a maioria na linha de frente nos hospitais. Também durante a Covid-19 países liderados por mulheres foram os que tiveram melhor desempenho durante esse período sombrio que estamos vivendo. A Alemanha, governada por Angela Merkel, focou em equipar devidamente os profissionais da área da saúde, oferecer milhares de leitos de UTI e realizar o maior número de testes possível em sua população. A Nova Zelândia, liderada por Jacinda Ardern, decidiu fechar suas fronteiras e ordenou o isolamento social bem no início da crise. Para os que estavam no país, foram feitos testes em massa. Com essas medidas a Nova Zelândia soma apenas 22 mortes. Tsai Ing-wen, presidente de Taiwan, apresentou em janeiro, dois meses antes de a OMS declarar a pandemia, 124 medidas para evitar que o vírus se espalhasse sem ter que recorrer ao isolamento total. A resposta de Tsai Ing-wen à crise foi uma das mais rápidas.

A Islândia, liderada por Katrín Jakobsdóttir, ofereceu testes gratuitos para todos os cidadãos, com ou sem sintomas, e instituiu um sistema completo de rastreamento de casos. Sanna Marin, da Finlândia, é a chefe de estado mais jovem do mundo, aos 34 anos. Com uma visão atual, Sanna usa as mídias sociais como agente-chave para divulgar informações baseadas em fatos sobre a pandemia em seu país. Com a população informada, a Finlândia manteve números baixíssimos de infectados. Uma pesquisa indicou que Sanna recebeu a aprovação de 85% dos eleitores por seu desempenho durante a crise.

E o Brasil? Vivemos um caos. Hoje temos quase 2 milhões de pessoas infectadas pela doença e mais de 70 mil mortes. Um caos político, econômico, social. E não temos diálogo, transparência, união. Em tempos assim, o que importa são as pessoas e não ideologias partidárias. Em tempos assim, não é sobre ser de direita ou de esquerda se perdemos milhares de pessoas diariamente. Precisamos de colaboração. Ações reais para que as soluções sejam encontradas, não baseadas em opiniões partidárias, mas no que é mais efetivo para o Brasil hoje.  Precisamos de um olhar mais humano sobre toda a situação.

E por isso, junto com o Instituto Vamos Juntas na Política, comecei a olhar para os números reais da atuação feminina na política no Brasil. E por aqui as mulheres na política ainda são tão poucas. Precisamos de mais. Não só por perceber que sim, com mulheres no poder, existe uma liderança mais humana, mais justa, mais igualitária, mas porque é na política que decisões importantes da nossa vida acontecem: educação, meio ambiente, economia, direitos humanos.

E por que ainda somos tão poucas? Falando de um ponto de vista histórico, não faz muito tempo que começamos a atuar politicamente no país. Por aqui tivemos a primeira prefeita da América Latina, Alzira Soriano de Souza, na cidade de Lajes no Rio Grande do Norte em 1929, antes mesmo que o voto feminino fosse instituído em todo o Brasil, o que só ocorreu em 1932. E mesmo quando ganhamos o direito ao voto, nossos maridos tinham que aprovar. Em 1934, Carlota Pereira Queirós foi a primeira deputada federal do país, eleita por São Paulo. Isso não faz muito tempo. O Brasil ocupa o 141° lugar no ranking mundial sobre participação das mulheres no parlamento segundo um levantamento feito pela IPU (Inter-Parliamentary Union).

Mas quando temos mais mulheres na política, incluímos toda a população na conversa. Quando temos mais mulheres na política a mudança não é boa somente para nós mulheres, mas para todos. Estudos apontam que com mulheres no poder os índices de corrupção diminuem (Journal of Economic Behavior & Organization). Existe um maior número de investimentos em educação e saúde, como estudado pelas economistas Sonia Bhalotra e Irma Clots-Figueras na Índia. E podemos reduzir 257 anos de desigualdade de gênero no trabalho previstos pelo Fórum Econômico Mundial.

Aqui já temos ótimos exemplos de mulheres que chegaram lá. Apesar de existirem cotas eleitorais e a participação feminina ter aumentado com os anos, isso não ocorre no ritmo ideal. E por que será que ainda não nos vemos lá? Ainda não acreditamos que a política é nosso lugar. Mas é.  Por isso, é importante falar. Com mulheres no poder, nosso país seria diferente: mais humanitário, com mais colaboração, mais inclusão, mais diálogo. Hoje ( e lembrando que temos eleições municipais esse ano) mais do que nunca precisamos estar lá. E para isso acontecer todos nós, homens e mulheres, devemos apoiar mulheres a ocupar esse lugar. Porque é no hoje que garantimos um futuro brilhante para as meninas e meninos do nosso país.