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Somos um país de invejosos?

Será também o brasileiro um invejoso por natureza?

Retrato de Ozires Silva, ex-presidente da Petrobrás, um dos fundadores da Embraer, durante evento "São José 2030", que discute o futuro da cidade, no Expo Vale Sul, São José dos Campos. O fórum reúne autoridades e representantes de diferentes segmentos empresariais de São José. (Lucas Lacaz/Estadão Conteúdo)
DR

Da Redação

Publicado em 8 de fevereiro de 2023 às 18h09.

Um vídeo gravado em 2018, que registra o programa Roda Viva com a participação do ex-presidente da Embraer, Ozires Silva, voltou a circular nesta semana pelas redes sociais. Ozires, também ex-comandante da Petrobras e da Varig, conta que esteve, tempos atrás, em um jantar que contou com três jurados do comitê encarregado de indicar nomes ao Prêmio Nobel.

Ele, então, aproveitou para perguntar a esses convidados a razão pela qual não havia um só brasileiro vencedor desse troféu, talvez o maior reconhecimento de obra existente no mundo. Depois de algumas doses de vodca, um dos jurados respondeu à pergunta: “Vocês, brasileiros, são destruidores de heróis”, disse. “Todos os candidatos brasileiros que apareceram – ao contrário do que acontece nos outros países, em especial os Estados Unidos… Toda vez que aparece um candidato brasileiro, todo mundo no Brasil joga pedra”.

A pergunta de Ozires faz todo o sentido. Afinal, há vencedores do Nobel em outros países latino-americanos, como Argentina, Chile, Colômbia e Venezuela. No Brasil, entretanto, não há um só vencedor. E a resposta do membro do comitê também é fiel à realidade: os brasileiros são os primeiros a criticar um compatriota. Candidatos não faltaram, do biólogo Carlos Chagas ao físico César Lattes, do médico Vital Brasil à escritora Lygia Fagundes Telles, do político e diplomata Osvaldo Aranha ao médico Adolfo Lutz. Todos devidamente detonados por seus concidadãos.

Será o famoso complexo de vira-lata, ao qual Nelson Rodrigues se referia? “O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima”, disse o autor de “Bonitinha, mas Ordinária”.

Se voltarmos um pouco no tempo, vamos ver que Rodrigues tem razão. Basta ler alguma linhas traçadas por Monteiro Lobato no início do Século 20: “O Brasil, filho de pais inferiores – destituídos desses caracteres fortíssimos que imprimem – um cunho inconfundível em certos indivíduos, como acontece com o alemão, com o inglês, cresceu tristemente – dando como resultado um tipo imprestável, incapaz de continuar a se desenvolver sem o concurso vivificador do sangue de alguma raça original”.

Mas talvez a baixa autoestima não explique completamente esse fenômeno. Será também o brasileiro um invejoso por natureza?

Inevitável não lembrar de uma frase do maestro Antônio Carlos Jobim sobre o tema. “Sucesso, no Brasil, é a pior das ofensas pessoais”, afirmou ele. Tom Jobim contava uma história a respeito da inveja alheia. Ele tomou banho em casa e foi a um de seus restaurantes favoritos, o Antonio’s, para almoçar um prato de camarão. Ele estava aboletado na varanda do lugar, todo cheiroso, e preparava-se para atacar a sua comida. De repente, apareceu um sujeito, da rua, e gritou: “A-há! Aí, hein, seu Tom Jobim! De banho tomado, comendo camarão…!”. Como se comer camarão fosse um crime capital.

O maestro conseguiu, em 1964, uma façanha e tanto: a música “Garota de Ipanema”, uma composição sua e de Vinicius de Moraes, ganhou o prêmio Grammy de melhor canção. Ele concorreu com os Beatles (intérpretes de “I Want to Hold Your Hand” – a música mais vendida do ano nos Estados Unidos), Barbra Streisand, Petula Clarke e Louis Armstrong – uma turma de respeito. Mas, ao voltar ao Brasil, em vez de ser elogiado, foi acusado de ter se americanizado.

Definitivamente, usando outra frase de Tom Jobim, “o Brasil não é um país para amadores”. Mas talvez seja uma nação de invejosos.

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Um vídeo gravado em 2018, que registra o programa Roda Viva com a participação do ex-presidente da Embraer, Ozires Silva, voltou a circular nesta semana pelas redes sociais. Ozires, também ex-comandante da Petrobras e da Varig, conta que esteve, tempos atrás, em um jantar que contou com três jurados do comitê encarregado de indicar nomes ao Prêmio Nobel.

Ele, então, aproveitou para perguntar a esses convidados a razão pela qual não havia um só brasileiro vencedor desse troféu, talvez o maior reconhecimento de obra existente no mundo. Depois de algumas doses de vodca, um dos jurados respondeu à pergunta: “Vocês, brasileiros, são destruidores de heróis”, disse. “Todos os candidatos brasileiros que apareceram – ao contrário do que acontece nos outros países, em especial os Estados Unidos… Toda vez que aparece um candidato brasileiro, todo mundo no Brasil joga pedra”.

A pergunta de Ozires faz todo o sentido. Afinal, há vencedores do Nobel em outros países latino-americanos, como Argentina, Chile, Colômbia e Venezuela. No Brasil, entretanto, não há um só vencedor. E a resposta do membro do comitê também é fiel à realidade: os brasileiros são os primeiros a criticar um compatriota. Candidatos não faltaram, do biólogo Carlos Chagas ao físico César Lattes, do médico Vital Brasil à escritora Lygia Fagundes Telles, do político e diplomata Osvaldo Aranha ao médico Adolfo Lutz. Todos devidamente detonados por seus concidadãos.

Será o famoso complexo de vira-lata, ao qual Nelson Rodrigues se referia? “O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima”, disse o autor de “Bonitinha, mas Ordinária”.

Se voltarmos um pouco no tempo, vamos ver que Rodrigues tem razão. Basta ler alguma linhas traçadas por Monteiro Lobato no início do Século 20: “O Brasil, filho de pais inferiores – destituídos desses caracteres fortíssimos que imprimem – um cunho inconfundível em certos indivíduos, como acontece com o alemão, com o inglês, cresceu tristemente – dando como resultado um tipo imprestável, incapaz de continuar a se desenvolver sem o concurso vivificador do sangue de alguma raça original”.

Mas talvez a baixa autoestima não explique completamente esse fenômeno. Será também o brasileiro um invejoso por natureza?

Inevitável não lembrar de uma frase do maestro Antônio Carlos Jobim sobre o tema. “Sucesso, no Brasil, é a pior das ofensas pessoais”, afirmou ele. Tom Jobim contava uma história a respeito da inveja alheia. Ele tomou banho em casa e foi a um de seus restaurantes favoritos, o Antonio’s, para almoçar um prato de camarão. Ele estava aboletado na varanda do lugar, todo cheiroso, e preparava-se para atacar a sua comida. De repente, apareceu um sujeito, da rua, e gritou: “A-há! Aí, hein, seu Tom Jobim! De banho tomado, comendo camarão…!”. Como se comer camarão fosse um crime capital.

O maestro conseguiu, em 1964, uma façanha e tanto: a música “Garota de Ipanema”, uma composição sua e de Vinicius de Moraes, ganhou o prêmio Grammy de melhor canção. Ele concorreu com os Beatles (intérpretes de “I Want to Hold Your Hand” – a música mais vendida do ano nos Estados Unidos), Barbra Streisand, Petula Clarke e Louis Armstrong – uma turma de respeito. Mas, ao voltar ao Brasil, em vez de ser elogiado, foi acusado de ter se americanizado.

Definitivamente, usando outra frase de Tom Jobim, “o Brasil não é um país para amadores”. Mas talvez seja uma nação de invejosos.

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