O que Marina acrescenta, de fato, à candidatura Lula?
A aliança com a ambientalista tem um significado simbólico importante, mas não deve se traduzir em um volume expressivo de votos
Publicado em 13 de setembro de 2022 às, 15h06.
Depois de semanas com total protagonismo de Jair Bolsonaro, a campanha eleitoral teve um dia que girou totalmente em torno de Luiz Inácio Lula da Silva. O ex-presidente anunciou o apoio de sua ex-ministra Marina Silva, que rompera com o PT desde 2009. A aliança com a ambientalista tem um significado simbólico importante, mas não deve se traduzir em um volume expressivo de votos. Marina teve desempenhos eleitorais impressionantes em 2010 e 2014, mas deixou a desejar quatro anos atrás, terminando na oitava posição, com 1 % dos votos (atrás de Henrique Meirelles e do Cabo Daciolo).
Por outro lado, o encolhimento da distância entre Bolsonaro e Lula, capturado nas últimas pesquisas, mostra quão parelha será essa eleição. Dentro deste cenário, qualquer contribuição eleitoral, por menor que seja, pode ser decisiva.
Além disso, a aproximação desses dois ex-desafetos pode reforçar a mensagem de que Lula representa uma frente ampla, que conseguiu reunir antigos adversários em busca de um objetivo comum, que seria derrotar o presidente Bolsonaro.
Como já acontece com Geraldo Alckmin, cujos vídeos antigos, atacando Lula, são reprisados constantemente nas redes sociais, Marina terá declarações do passado exploradas no universo digital. Lembremos que nas eleições de 2014 e 2018, a então candidata da Rede sofreu ataques ferozes do quartel general de Dilma Rousseff. Marina chegou dizer, recentemente, que foi o PT quem introduziu o conceito de fake news em campanhas eleitorais.
O governo aproveitou também para ontem utilizar uma declaração de Ciro Gomes no sentido de criticar a aliança Marina-Lula. O ministro Fábio Faria postou um vídeo no qual Ciro diz: “Bolsonaro é cria da cultura de ódio do Lula e do PT, não é, Marina Silva?”. Essa postagem, diga-se de passagem, dá mais munição para os petistas que acusam o ex-governador do Ceará de agir em favor de Bolsonaro nessa campanha.
Na entrevista coletiva em que deu ao lado de Marina, Lula disse que “a política ambiental [de seu eventual governo] será tratada de forma transversal” e que “todos os ministros terão obrigação com a questão climática”. Essa frase lembrou os tempos em que o ex-presidente estava no Planalto, quando ele e vários ministros falavam de “transversalidade” – certos conceitos que teriam de ser tratados por todas as pastas do governo.
A preservação do meio ambiente seria um destes tópicos, disse a então ministra Marina em um seminário realizado em novembro de 2007. “Uma das diretrizes da política ambiental é a integração e a transversalidade, ferramentas extremamente necessárias para incrementar o diálogo com os diferentes setores do governo”, afirmou.
Em maio de 2008, porém, ela pediria demissão em caráter irrevogável, depois de tentar sair da Esplanada de forma amigável. A razão? A tal da “transversalidade” estava funcionando, mas dos outros ministérios em relação ao dela – e não ao contrário, como ela esperava. Os ministros Mangabeira Unger e Reinhold Stephanes entraram em rota de colisão com a titular do Meio Ambiente e o clima foi ficando insustentável.
Quando o primeiro fogo amigo surgiu no front, Marina disse a Lula que gostaria de sair do governo. Explicou as razões e também afirmou que rezara bastante para saber o que fazer – e que Deus havia dito para que ela pedisse demissão. Lula pediu que não fizesse nada e pediu para que voltasse em uma semana. Nesta nova reunião, Lula despachou com a ministra como se nada tivesse acontecido dias atrás. Ao final do encontro, Marina disse que queria divulgar sua carta de demissão. O presidente retrucou que não poderia deixá-la fazer isso. Marina perguntou o porquê. Lula respondeu: “Eu sonhei que estava conversando com Deus e ele me disse para não deixar você pedir demissão”.
Dias mais tarde, o ministério do Meio Ambiente sofreria interferências indesejáveis de Mangabeira Unger e Marina voltou para o Senado, dando início a um processo de rompimento com o Partido dos Trabalhadores. O fato de Lula ter conseguido reverter um desentendimento de treze anos mostra que ele fará de tudo para aumentar seu guarda-chuva oposicionista – embaixo do qual ele poderia até incluir o hoje adversário Ciro Gomes. Resta saber se Ciro vai querer aderir à frente contra Bolsonaro, depois de tudo o que falou contra o ex-presidente nos últimos tempos.