Exame.com
Continua após a publicidade

O problema do governo não é a comunicação -- é o próprio governo

Lula quer fazer uma troca na Secom, mas antes precisa entender o que está errado em sua administração

Lula quer fazer uma troca na Secom, mas antes precisa entender o que está errado em sua administração (Rodrigo Caetano/Exame)
Lula quer fazer uma troca na Secom, mas antes precisa entender o que está errado em sua administração (Rodrigo Caetano/Exame)

Pipocam por aí comentários de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, insatisfeito com a comunicação de seu governo desde a posse, vai finalmente mexer nessa área. O atual titular da Secom, Paulo Pimenta, daria lugar ao marqueteiro Sidônio Palmeira, um dos responsáveis pela campanha que levou Lula ao Planalto.

Sidônio não é um petista raiz, como Pimenta. Pelo contrário. Tem ligações com políticos ligados ao PSDB e União Brasil e foi sócio de ACM Neto em um fundo imobiliário. Quando escolhido para marquetear a campanha de Lula em 2022, disse que iria desavermelhar o PT e dar um tom mais emocional às peças eleitorais. Essa estratégia foi coroada com a vitória dos petistas.

Em tese, o marqueteiro baiano entende mais deste riscado que Pimenta, mas terá um desafio enorme pela frente, já que o maior problema do governo não é a comunicação, como imagina Lula – mas o próprio governo.

Lula acredita que suas conquistas na economia – PIB em crescimento, massa salarial aumentando e baixo desemprego – não são percebidas pela população. Para piorar, seus índices de aprovação não crescem e, em algumas pesquisas, até diminuem.

Ocorre que estamos em um quadro de inflação crescente, turbinada pelo aquecimento da economia, motivada pelo consumo. Tivemos impulsos dados à economia, como o reforço ao Bolsa Família, o reajuste de salários dos servidores federais (congelados há sete anos) e o aumento do salário-mínimo acima da inflação, que impactou os benefícios pagos pela Previdência oficial. Tudo isso impulsionou o varejo e colocou a inflação acima da meta.

Inflação, como vimos recentemente nas eleições dos Estados Unidos, é um tema importante demais para ser desprezado pelos governos que pretendem se manter no poder. Mas somente um makeover de comunicação não será suficiente para virar o jogo em favor do PT. Além disso, a agenda ideológica petista vem desagradando a classe média brasileira, seja com uma pauta identitária ou com a estratégia de sempre jogar pobres contra ricos.

Lembro de uma conversa que tive com Nizan Guanaes, muitos anos atrás. Ele tinha acabado de lançar, com grande sucesso, uma campanha publicitária do guaraná Antarctica – um dos comerciais tinha um irresistível jingle combinando pipoca e o refrigerante (a voz na primeira gravação, por sinal, é da cantora Lucinha Lins). Eu perguntei se o sucesso seria o mesmo se o comercial fosse com o guaraná da Brahma, cujo sabor era adocicado demais (ainda não existia Ambev ou Inbev). Ele coçou a cabeça e respondeu: “Não, não seria”. Detalhe: isso não foi uma entrevista e sim uma colóquio particular, na antessala do evento “Melhores e Maiores”, da revista Exame. A missão de Sidônio é fazer um comercial criativo e popular como o da pipoca – só que com o guaraná da Brahma. Tarefa difícil.

Em um recente evento do PT, Lula disse que tinha parte da culpa pelos erros de seu governo na comunicação, pois não dá muitas entrevistas coletivas, preferindo falar com emissoras locais de rádio. E anunciou que iria começar a fazer uma rodada de entrevistas com vários repórteres. É aí que mora o perigo. As declarações recentes do presidente causaram polêmicas ou desconforto junto ao mercado financeiro. Amplificá-las em uma série de coletivas não parece ser um bom caminho.

Presidente, o senhor quer melhorar a comunicação do governo? Comece reduzindo o número de suas entrevistas. Neste caso, menos é mais. Muito mais.