O depoimento de Wajngarten mostra que Bolsonaro está cercado de amadores
Não deixa de ser irônico que a chamada de capa da revista que causou a quizumba seja “Houve Incompetência”
Da Redação
Publicado em 13 de maio de 2021 às 08h31.
ALUIZIO FALCÃO FILHO
O depoimento do ex-secretário Fabio Wajngarten à CPI da Pandemia é um exemplo de como o governo de Jair Bolsonaro foi formado a partir de uma equipe de amadores. Política no Brasil , porém, é jogo de cachorro grande. Mas, desde o início, o governo tem colocado em postos importantes ou incompetentes ou pessoas que ainda estão dando seus primeiros passos na arte de lidar com as raposas felpudas do Congresso. É verdade que temos técnicos de alto gabarito em posições de destaque – mas estes são ofuscados pela exuberância irracional dos inábeis que habitam os gabinetes do Executivo.
Vamos ao exemplo do dia: Wajngarten foi até à CPI e tentou engabelar os senadores com uma conversa mole. A reação foi a pior possível e ele acabou devidamente achincalhado. Vamos esquecer um pouco a extensa folha de acusações que pesam sobre o relator da Comissão, o senador Renan Calheiros, que pediu até a prisão do depoente. O fato é que o ex-titular da Secom foi encarar uma alcateia sem nenhum tipo de preparação – ou foi submetido a um treinamento inócuo e incapaz.
O início de um depoimento de horas a fio foi marcado por questões relativas à entrevista que ele havia dado à revista Veja. Aos inquisidores, ele disse que não havia utilizado a palavra “incompetência” para definir a atuação do Ministério da Saúde no combate à Covid-19. “A manchete serve para vender a tiragem, a manchete serve para trazer audiência, a manchete serve para chamar a atenção”, disse o ex-secretário aos senadores.
Os parlamentares, calejados por esta e outras acareações, disseram que iriam pedir a gravação original da entrevista. Não demorou muito e a própria revista divulgou o áudio em seu portal. Nele, Wajngarten responde a uma pergunta sobre se houve incompetência ou negligência por parte do Executivo da seguinte forma: “Incompetência, incompetência. Quando você tem um laboratório americano com cinco escritórios de advocacia apoiando na negociação, e você tem do outro lado um time pequeno, tímido, sem experiência, é sete a um”.
O maior pecado de Wajngarten, neste caso, é a ilusão de que uma narrativa meia-boca vai se sobrepor à realidade. O que passou pela cabeça do ex-titular da Secom? Que ninguém checaria sua versão? Que os jornalistas de Veja, acusados de sensacionalismo, ficariam quietos? É preciso uma dose cavalar de amadorismo para entrar em uma roubada como essa. Mas o pior não é o amadorismo em si. É a arrogância de achar que uma história sem lastro vai colar diante de um bando de senadores que estão em busca de sangue.
Não deixa de ser irônico que a chamada de capa da revista que causou a quizumba seja “Houve Incompetência”. No original, a frase se referia ao ex-ministro Eduardo Pazuello ou sua equipe. Mas, hoje, cai feito uma luva para descrever o depoimento de Fábio Wajngarten à CPI.
Desde que essa entrevista foi publicada, havia uma dúvida sobre os verdadeiros motivos do entrevistado em cutucar Pazuello publicamente. Uns achavam que Wajngarten tinha sido estimulado pela mágoa de ter sido dispensado do governo. Outros, no entanto, acreditavam que a entrevista tinha sido combinada com o alto escalão do Planalto. O intuito, nesta versão, seria transformar o ex-ministro da Saúde em um bode expiatório e livrar o presidente de qualquer responsabilidade no tocante à gestão desastrosa em relação à compra de vacinas, que poderia ter sido adiantada em preciosos meses.
Qualquer que tenha sido a motivação de Wajngarten, ele deve estar plenamente arrependido de ter dado essa entrevista. Não fosse a reportagem, o ex-secretário teria sido solenemente ignorado pela CPI e não teria de dar explicações a ninguém. Acabou colocando lenha na fogueira da oposição e deu apenas mais combustível ao relator da Comissão para bater no governo. Não fosse o presidente da CPI, Omar Aziz, que se recusou a decretar a prisão do ex-comunicador do Planalto (pedida por dois senadores), Wajngarten teria saído de camburão do Senado, por mentir a uma Comissão Parlamentar de Inquérito.
Apoiadores do governo poderão dizer que essa seria uma mentira menor – um delito júnior perto do que já se fez anteriormente no Parlamento. Isso pode até ser verdade. Mas, ao mesmo tempo, não se pode tentar enrolar os parlamentares com tanta desfaçatez, sem se preocupar ao menos em vender à plateia um enredo com credibilidade mínima.
É exasperante imaginar que o padrão Wajngarten seja a régua reinante na contratação de vários assessores do Executivo. O governo resolveu imitar seus antecessores ao aderir ao Centrão e criar seu próprio mecanismo de toma-lá-dá-cá para garantir votos no Congresso (votos esses que vão blindar o presidente Bolsonaro mesmo que o relatório de Renan Calheiros diga cobras e lagartos sobre a atuação do governo durante a pandemia). Deveria aproveitar o ensejo e imitar alguns ex-presidentes da República, que colocaram grandes articuladores políticos e homens com inegável talento de comunicação ao seu redor. Somente assim é que se pode evitar vexames como os de ontem e manifestações tão explícitas de incompetência.
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ALUIZIO FALCÃO FILHO
O depoimento do ex-secretário Fabio Wajngarten à CPI da Pandemia é um exemplo de como o governo de Jair Bolsonaro foi formado a partir de uma equipe de amadores. Política no Brasil , porém, é jogo de cachorro grande. Mas, desde o início, o governo tem colocado em postos importantes ou incompetentes ou pessoas que ainda estão dando seus primeiros passos na arte de lidar com as raposas felpudas do Congresso. É verdade que temos técnicos de alto gabarito em posições de destaque – mas estes são ofuscados pela exuberância irracional dos inábeis que habitam os gabinetes do Executivo.
Vamos ao exemplo do dia: Wajngarten foi até à CPI e tentou engabelar os senadores com uma conversa mole. A reação foi a pior possível e ele acabou devidamente achincalhado. Vamos esquecer um pouco a extensa folha de acusações que pesam sobre o relator da Comissão, o senador Renan Calheiros, que pediu até a prisão do depoente. O fato é que o ex-titular da Secom foi encarar uma alcateia sem nenhum tipo de preparação – ou foi submetido a um treinamento inócuo e incapaz.
O início de um depoimento de horas a fio foi marcado por questões relativas à entrevista que ele havia dado à revista Veja. Aos inquisidores, ele disse que não havia utilizado a palavra “incompetência” para definir a atuação do Ministério da Saúde no combate à Covid-19. “A manchete serve para vender a tiragem, a manchete serve para trazer audiência, a manchete serve para chamar a atenção”, disse o ex-secretário aos senadores.
Os parlamentares, calejados por esta e outras acareações, disseram que iriam pedir a gravação original da entrevista. Não demorou muito e a própria revista divulgou o áudio em seu portal. Nele, Wajngarten responde a uma pergunta sobre se houve incompetência ou negligência por parte do Executivo da seguinte forma: “Incompetência, incompetência. Quando você tem um laboratório americano com cinco escritórios de advocacia apoiando na negociação, e você tem do outro lado um time pequeno, tímido, sem experiência, é sete a um”.
O maior pecado de Wajngarten, neste caso, é a ilusão de que uma narrativa meia-boca vai se sobrepor à realidade. O que passou pela cabeça do ex-titular da Secom? Que ninguém checaria sua versão? Que os jornalistas de Veja, acusados de sensacionalismo, ficariam quietos? É preciso uma dose cavalar de amadorismo para entrar em uma roubada como essa. Mas o pior não é o amadorismo em si. É a arrogância de achar que uma história sem lastro vai colar diante de um bando de senadores que estão em busca de sangue.
Não deixa de ser irônico que a chamada de capa da revista que causou a quizumba seja “Houve Incompetência”. No original, a frase se referia ao ex-ministro Eduardo Pazuello ou sua equipe. Mas, hoje, cai feito uma luva para descrever o depoimento de Fábio Wajngarten à CPI.
Desde que essa entrevista foi publicada, havia uma dúvida sobre os verdadeiros motivos do entrevistado em cutucar Pazuello publicamente. Uns achavam que Wajngarten tinha sido estimulado pela mágoa de ter sido dispensado do governo. Outros, no entanto, acreditavam que a entrevista tinha sido combinada com o alto escalão do Planalto. O intuito, nesta versão, seria transformar o ex-ministro da Saúde em um bode expiatório e livrar o presidente de qualquer responsabilidade no tocante à gestão desastrosa em relação à compra de vacinas, que poderia ter sido adiantada em preciosos meses.
Qualquer que tenha sido a motivação de Wajngarten, ele deve estar plenamente arrependido de ter dado essa entrevista. Não fosse a reportagem, o ex-secretário teria sido solenemente ignorado pela CPI e não teria de dar explicações a ninguém. Acabou colocando lenha na fogueira da oposição e deu apenas mais combustível ao relator da Comissão para bater no governo. Não fosse o presidente da CPI, Omar Aziz, que se recusou a decretar a prisão do ex-comunicador do Planalto (pedida por dois senadores), Wajngarten teria saído de camburão do Senado, por mentir a uma Comissão Parlamentar de Inquérito.
Apoiadores do governo poderão dizer que essa seria uma mentira menor – um delito júnior perto do que já se fez anteriormente no Parlamento. Isso pode até ser verdade. Mas, ao mesmo tempo, não se pode tentar enrolar os parlamentares com tanta desfaçatez, sem se preocupar ao menos em vender à plateia um enredo com credibilidade mínima.
É exasperante imaginar que o padrão Wajngarten seja a régua reinante na contratação de vários assessores do Executivo. O governo resolveu imitar seus antecessores ao aderir ao Centrão e criar seu próprio mecanismo de toma-lá-dá-cá para garantir votos no Congresso (votos esses que vão blindar o presidente Bolsonaro mesmo que o relatório de Renan Calheiros diga cobras e lagartos sobre a atuação do governo durante a pandemia). Deveria aproveitar o ensejo e imitar alguns ex-presidentes da República, que colocaram grandes articuladores políticos e homens com inegável talento de comunicação ao seu redor. Somente assim é que se pode evitar vexames como os de ontem e manifestações tão explícitas de incompetência.
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