Exame.com
Continua após a publicidade

Depois do debate, Bolsonaro pode reavaliar sua estratégia

Os assessores de Bolsonaro preferem jogar na retranca por duas razões

O presidente Jair Bolsonaro (Iara Morselli/Esfera Brasil/Divulgação)
O presidente Jair Bolsonaro (Iara Morselli/Esfera Brasil/Divulgação)
M
Money Report – Aluizio Falcão Filho

Publicado em 30 de agosto de 2022 às, 12h00.

Aluizio Falcão Filho

Ontem, o presidente Jair Bolsonaro cancelou a participação em uma sabatina na TV Jovem Pan, marcada já há algum tempo. Como ele e sua equipe ficaram até altas horas discutindo sua performance no debate da Band, realizado na noite de domingo, seus assessores acharam melhor desistir da entrevista (em um canal cuja linha editorial é simpática ao governo, diga-se). Sabe-se que uma parte da equipe mais próxima a Bolsonaro não quer que ele se exponha mais até o Segundo Turno e, neste sentido, diminua o número de entrevistas que dará daqui para frente.

Ora, o desempenho de Bolsonaro no debate deixou a desejar. O presidente deu as lacradas de costume, mas errou a mão em alguns momentos (como o de minimizar a reação das mulheres diante do machismo e ter criticado a jornalista Vera Magalhães antes de responder a uma pergunta) e se perdeu em outros.

Normalmente, um candidato se viraria para reverter a imagem que ficou do debate. Mas os assessores presidenciais preferem contornar o prejuízo através do silêncio. Essa estratégia, até alguns anos atrás, funcionaria. Afinal, a audiência de um debate político em um domingo à noite nunca foi alta e a repercussão era feita informalmente. Hoje, no entanto, temos a internet, que imortaliza pisadas de bola e multiplica a audiência da TV aberta.

Ou seja, nos próximos dias, os opositores vão distribuir uma compilação com os piores momentos de Jair Bolsonaro pelas redes. Antes, poucos (em relação ao número total de eleitores) viam esses embates. Hoje, porém, há uma cauda longa dessas imagens nas redes sociais.

Portanto, a reação natural seria avaliar o que houve de errado para tentar melhorar na próxima oportunidade. Ocorre que Bolsonaro está cercado de torcedores, que referendam todos seus movimentos nessa campanha. Seus assessores preferem jogar na retranca por duas razões. Em primeiro lugar, porque, no fundo, gostaram das lacrações e não enxergam a gravidade de o mandatário ter um comportamento machista em um país com cerca de 53 % de mulheres formando a maioria do eleitorado. Além disso, sabem que dificilmente o presidente irá mudar seu comportamento e que deve repetir sempre o mesmo estilo.

Tomemos o exemplo de Ciro Gomes. Ele lembrou que Bolsonaro referiu-se à filha como uma “fraquejada”. O presidente admitiu que a frase foi infeliz e pediu desculpas – mas cutucou o adversário ao lembrá-lo de uma grosseria cometida por Ciro em relação à ex-mulher, Patrícia Pillar. Ciro, então, admitiu erros em seu comportamento, fruto de uma vida moldada pelo machismo. Bolsonaro preferiu um discurso cutucando o mimimi feminista e uma pretensa vitimização das mulheres. O pedetista disse estar “sempre aprendendo” a refrear seus impulsos machistas e arrematou: “Mas você não aprende nada”.

Aqui vale um parêntese: Lula poderia ter aproveitado para fustigar Bolsonaro e criar uma empatia ainda maior com o eleitorado feminino. Mas, preferiu a discrição e saiu pela tangente quando pressionado sobre se escalaria um ministério com 50 % de mulheres.

Embora o Brasil tenha mudado significativamente de 2018 para cá (especialmente porque a Operação Lava-Jato definhou e a corrupção deixou de ser o tema mais importante da cena política), Jair Bolsonaro continua com o mesmo discurso de quatro anos atrás, dando ênfase especialmente no que diz respeito à religião e à família.

Em vez de buscar algum tipo de ligação com o eleitorado feminino, o presidente prefere agradar seu apoiador raiz e perpetuar uma visão de mundo que pode ser considerada preconceituosa por muitos. No fundo, Bolsonaro acha que vai recuperar, no segundo turno, os eleitores de 2018 que rejeitam o PT e isso o levará à vitória.

É preciso aguardar para saber se essa estratégia vai dar certo ou não. Mas as próximas pesquisas podem dar uma pista sobre o comportamento do eleitor em relação a esse debate. Se Ciro e Simone Tebet subirem, por exemplo, será a confirmação de que os indecisos não se decidiram em relação a Bolsonaro (ou Lula). Se ficarem na mesma, no entanto, será a confirmação de que o Brasil continuará sendo a meca da polarização – e que talvez esse antagonismo ideológico não terminará tão cedo.