Como a Lei do Superendividamento impacta a vida do consumidor brasileiro
A legislação visa impedir que consumidores assumam dívidas maiores do que podem pagar e criar alternativas para quem já está nessa situação
Publicado em 24 de março de 2022 às, 12h17.
Última atualização em 24 de março de 2022 às, 12h20.
Não é raro encontrar casos de consumidores que possuem mais de uma dívida — na verdade, é mais comum do que você pode imaginar. De acordo com a última edição do Mapa da Inadimplência e Renegociação de Dívidas no Brasil, 64 milhões de brasileiros estão inadimplentes hoje e, juntos, eles possuem 214 milhões de dívidas. Ou seja, é mais dívida do que gente!
Garanta o seu lugar entre as melhores do Brasil, entre no Ranking Negócios em Expansão 2022
Foi pensando nessa realidade que o governo federal sancionou, em julho do ano passado, a Lei 14.181, conhecida como Lei do Superendividamento, que promove mudanças no Código de Defesa do Consumidor. A legislação visa proteger os consumidores para que eles não assumam compromissos financeiros superiores ao que podem pagar e criar alternativas para os consumidores que já estão nessa situação e não sabem por onde começar a resolver o problema. Resumindo, importante demais, né?
No artigo de hoje, vamos falar um pouco mais sobre esse cenário de superendividamento e explicar as diretrizes da lei e como elas podem impactar a vida do consumidor brasileiro — especialmente o endividado.
Entenda o conceito de superendividamento
Uma definição importante que a legislação é o conceito de superendividamento. Não basta o consumidor ter duas ou mais dívidas para ser considerado um superendividado. Na verdade, de acordo com a lei, “entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação”.
Tirando do juridiquês e traduzindo de forma didática, um consumidor é considerado superendividado quando o valor de suas dívidas é maior do que a sua renda e, por isso, ele não tem condições de arcar com seus compromissos financeiros. E, vale dizer, as dívidas contempladas pela lei podem ser originadas de qualquer compromisso financeiro, como operações de crédito, compras a prazo e serviço de prestação continuada.
É importante que você saiba que a expressão “boa- fé” inserida no texto da lei não está ali por acaso. Para ser contemplado pelo que a legislação prevê, o consumidor não pode ter contraído dívidas já com a intenção de não pagar ou para adquirir ou contratar produtos e serviços de luxo e alto valor. Acredite: a justiça tem mecanismos para investigar isso.
Saiba o que prevê a Lei do Superendividamento
De forma resumida, a legislação promete conter o superendividamento de duas maneiras: estabelecendo mecanismos para facilitar a negociação de dívidas entre credor e devedor e criando instrumentos para conter abusos na oferta de crédito pelo mercado. Antes de mais nada, precisamos dizer que esses são, de fato, caminhos muito importantes para o cenário de endividamento no Brasil.
Negociação de dívidas
O Código de Defesa do Consumidor, alterado após a sanção da Lei do Superendividamento, prevê que o consumidor superendividado, que tenha contraído dívidas com mais de uma instituição, tem o direito de solicitar à justiça um processo de repactuação de dívidas com a presença de todos os credore. Já parou pra pensar o quanto seria mais fácil para o consumidor poder sentar em uma mesa e negociar todas as dívidas ao mesmo tempo?
Segundo a lei, essa repactuação é feita em uma audiência de conciliação, na qual o consumidor deve apresentar um plano de pagamento de até cinco anos. Se os credores concordarem com a proposta, o juiz responsável pela audiência homologa o acordo e solicita a suspensão das ações judiciais em andamento e a retirada do nome do consumidor da lista de negativados dos birôs de crédito.
Vale ressaltar que consumidores que tenham dívidas com garantia real (como um carro, por exemplo), financiamentos imobiliários ou contratos de crédito rural não têm direito a essa possibilidade de negociação judicial prevista pelas alterações no Código de Defesa do Consumidor.
Oferta de crédito
O segundo ponto trazido pela legislação é a contenção de abusos na oferta de crédito no mercado — e, certamente, você já viveu na pele a certeza de que eles existem. Para isso, a lei determina mais transparência no processo, estabelecendo que a instituição que está ofertando o crédito deve fornecer informações claras sobre o custo efetivo total da dívida, a taxa mensal de juros e o prazo de validade da oferta, entre outros dados.
As mudanças no Código de Defesa do Consumidor também asseguram o combate a propagandas abusivas, mediante a proibição, por exemplo, de anúncios que oferecem crédito “sem consulta a serviços de proteção ao crédito ou sem avaliação financeira do consumidor”. Se você identificar alguma propaganda dessa por aí, saiba que tem direito de fazer uma denúncia nos canais de defesa do consumidor, como o Procon da sua cidade.
Outro ponto importantíssimo trazido pela lei é a proibição de atos que envolvem o assédio ou à pressão sobre o consumidor para a oferta de crédito, especialmente se o consumidor em questão fizer parte de um grupo vulnerável, como idosos, analfabetos ou pessoas doentes. Você, com certeza, conhece alguém que não para de receber ligações de oferta de crédito consignado e é exatamente essas pessoas que a legislação busca proteger.
Perceba que a educação financeira tem tudo a ver com isso
Toda semana, a gente usa esse espaço para falar sobre a importância da educação financeira. E diante de um tema tão relevante como o superendividamento, é mais necessário trazer o assunto para a mesa. Ainda que de forma superficial, a Lei do Superendividamento fez isso.
Com as alterações, o artigo 4º do Código de Defesa do Consumidor passa a tratar do fomento de ações direcionadas à educação financeira dos consumidores. De acordo com a legislação, essas iniciativas são importantes para “atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo”.
A nova lei, portanto, reforça a nossa crença de que as soluções para o consumidor endividado precisam ir além de serviços e produtos financeiros. Dar a eles instrumentos para que eles entendam a própria realidade e estabeleçam os caminhos para reverter a situação em que se encontram é fundamental para que eles alcancem a tranquilidade financeira que todo mundo deseja e merece.