Um gargalo nas exportações
Último elo na cadeia do agronegócio, nossos portos precisam acompanhar a evolução crescente da produção no campo e da logística terrestre
Publicado em 10 de novembro de 2020 às, 19h20.
Última atualização em 8 de janeiro de 2021 às, 19h47.
O potencial de produção do agronegócio brasileiro e a capacidade de escoamento da nossa logística terrestre crescem a olhos vistos no país, mas ainda encontram um gargalo na ponta final: os portos. A carência de investimentos e o excesso de burocracia tornam mais lentos os avanços necessários para facilitar o fluxo de caminhões, trens e navios que lá precisam chegar para deixar ou buscar cargas. E isso acaba sendo uma linha de destaque, pintada de vermelho, na planilha do custo Brasil.
Importante dizer que, a despeito da criticidade dessa situação, muita coisa tem evoluído nos últimos anos, sobretudo agora com a atual Secretaria Nacional dos Portos. Cito um exemplo: nesta gestão deixaram de ocorrer as indicações políticas para cargos cruciais ao funcionamento das operações. A nomeação de gestores sem qualificação técnica ou gerencial foi apontada por extensa auditoria do TCU como um dos cinco principais problemas responsáveis por afugentar investimentos privados dos portos púbicos. Para 70% dos representantes de terminais arrendados nestes portos, as nomeações sempre geraram problemas na gestão da autoridade portuária.
Apesar de a movimentação nos portos públicos estar crescendo, ainda está longe da evolução que se observa nos demais elos da cadeia. A produção do agronegócio bate recorde atrás de recorde. O que vem pela frente é ainda mais promissor, com a intensificação da transformação digital e da biotecnologia no campo para aumentar ainda mais os já imbatíveis índices de produtividade, reconhecidos mundialmente. A necessidade de atravessar o país para levar toda essa produção às docas tem progredido graças à presença de maciços investimentos privados e a uma eficiente gestão do Ministério da Infraestrutura. Há em curso diversos projetos para expandir o modal ferroviário. Somente na Malha Paulista, a capacidade de transporte dos trens saltará de 35 milhões para 75 milhões de toneladas por ano, até 2026. Tudo isso desembocará em Santos.
Atualmente, de todas as cargas brasileiras que se destinam ao porto paulista, 70% chegam por rodovia e 30% por ferrovia. No futuro, serão 70% por ferrovia e 30% por rodovia. Portanto é fundamental investir no acesso ferroviário ao porto, com construções de novas vias internas e peras ferroviárias para otimizar a movimentação de vagões, novos pátios de estacionamento e melhorias na infraestrutura dos terminais já existentes.
A lista de questões que precisam ser endereçadas para aprimorar a gestão existentes nos portos é longa. Os problemas apresentados pelos arrendatários em respostas dadas aos auditores do TCU vão desde a falta de capina e precariedade na iluminação, até a ausência de alfandegamento, dificultando as operações portuárias. Falam ainda de falta de dragagens de manutenção e de melhorias do acesso marítimo, bem como da carência de manutenção regular das linhas férreas e das vias rodoviárias de chegada. Todos os problemas são agravados pela morosidade no atendimento de solicitações.
Em qualquer serviço público no Brasil, há uma parte considerável de servidores competentes e capacitados que estão ali não pela estabilidade, e sim para aprimorar o país. Basta conversar com alguns desses profissionais para constatar que eles relatam o mesmo corolário de problemas que atravancam as coisas no Estado mastodôntico. Nos portos isso não é diferente. Em questionário enviado pelo TCU às autoridades portuárias, os principais entraves apontados para oferecer serviços adequados são a dificuldade para realizar contratações de qualquer natureza, a falta de recursos e o receio de responsabilização pela tomada de decisões que seriam favoráveis ao interesse público, porém limitadas pela legislação cheia de amarras.
Num cenário como este, é compreensível o avanço dos Terminais de Uso Privado – os TUPs, que foram institucionalizados no país pela lei 12.815, de 2013. Hoje esses portos já respondem por quase 70% das cargas exportadas. Obviamente aqui estamos falando em volume, e não em valor agregado, quesito no qual Santos é e continuará sendo o principal porto da América Latina.
O Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ) aprovado pelo Ministério da Infraestrutura em julho deste ano para Santos projeta uma movimentação superior a 240 milhões de toneladas em 2040. Nada mais correto, portanto, que, a exemplo do que já ocorreu com as ferrovias, os aeroportos e as rodovias, a administração portuária também passe para iniciativa privada. Em Santos, o leilão deve ocorrer em 2022, de acordo com o cronograma anunciado pelo governo. Antes disso, em 2021, está programado o leilão do Espírito Santo.
O ideal seria que as privatizações ocorressem mais rapidamente e abrangessem também outros portos, inclusive os que atualmente estão delegados aos Estados e possuem um rol similar de dificuldades. Para a redução do custo Brasil, são movimentos dos quais não podemos abrir mão. E então teremos outro enorme desafio para enfrentar com o objetivo de melhorar a competitividade do país: a questão tributária. Mas isso é tema para um próximo artigo.
* Luis Henrique Guimarães é presidente da Cosan