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Ano novo, política nem tão nova assim

Até agora, 2018 concentra as esperanças de muita gente de que podemos realmente transformar o panorama brasileiro. Podemos?

ELEIÇÕES: Em 2018, começam a valer novas regras que melhorarão a qualidade de nossa democracia, como a cláusula de desempenho / Valter Campanato/ Agência Brasil (Valter Campanato/Agência Brasil)
ELEIÇÕES: Em 2018, começam a valer novas regras que melhorarão a qualidade de nossa democracia, como a cláusula de desempenho / Valter Campanato/ Agência Brasil (Valter Campanato/Agência Brasil)
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Joel Pinheiro da Fonseca

Publicado em 28 de dezembro de 2017 às, 08h45.

A sensação de que nossa cultura política apodreceu e precisa ser urgentemente trocada. Até agora, 2018 concentra as esperanças de muita gente (na verdade, uma fina camada do eleitorado com mais instrução formal) de que podemos realmente transformar o panorama brasileiro.

O nosso sistema, por outro lado, trabalha na direção contrária: dificulta a mudança e a emergência do novo como uma força política relevante. Fundo partidário, tempo de TV, campanha informal já valendo para quem ocupa cargo público, cabos eleitorais espalhados pelos estados. A lógica das alianças valida tudo isso e, por mais que internet tenha um peso inédito, a campanha na TV e na rua continuar preponderante. Meme nem sempre se traduz em voto.

Eu acredito que caminhamos para uma versão melhorada do mesmo. Na eleição presidencial, a vitória deve ficar com uma chapa de centro bem-conectada, capaz de angariar os votos de quem não se vê representado no radicalismo à esquerda que deve acompanhá-lo. Alguém que saiba fazer bem a velha política mas que não esteja imerso em corrupção.

Na Câmara, a mesma coisa. Quem tem base já constituída (e portanto, necessariamente, já joga o jogo de apoios e relacionamentos da velha política) continua tendo enorme vantagem quem chega apenas com uma excelente formação acadêmica, carreira profissional de destaque e a melhor das vontades do mundo para transformar nossa política.

Como já ressaltei em outras ocasiões, muito do desejo de renovação da política é na verdade um desejo de negação da política. Negação da ideia de que relações pessoais, bases de apoio personalista e capacidade de negociar pensando em fins pragmáticos sejam fatores determinantes da vida pública. Em seu lugar, apenas a discussão de propostas e o zelo implacável na defesa das causas que o eleitorado de cada candidato apoia. Essa postura pode funcionar para um ou outro parlamentar se reeleger agradando a um eleitorado ideológico e fiel, mas não é capaz de produzir os consensos necessárias para avançar reformas possíveis – sempre imperfeitas, mas reais.

Sendo assim, me incomoda o discurso já meio padrão de que, se algo no sistema atual impede ou atrasa as tentativas de renovação, se o sucesso dos novos entrantes bem-intencionados não é fácil e quase automático, então há algo de profundamente errado com o sistema.

Que o sistema tenha problemas – e as revelações da extensão da corrupção em nossa política não nos deixam esquecer disso – não dá para negar. Mas talvez ele tenha mais a ensinar a quem quer entrar nele e fazer diferente. Nem tudo na velha política brasileira é ruim. Conquistar a confiança do eleitorado, estabelecer uma conexão que não passa por discussões ideológicas (que sempre serão restritas a uma parcela pequena), saber manter aliados e sair do conforto das próprias convicções, é um exercício necessário para exercer o poder democraticamente em um país tão grande e variado como o Brasil.

Em 2018, começam a valer novas regras que melhorarão a qualidade de nossa democracia, como a cláusula de desempenho. E nas eleições posteriores, a coligação eleitoral deixa de ser permitida. São mudanças positivas, que nos ajudarão a renovar do jeito certo: melhorando a qualidade e aproximando o voto do eleitor do candidato eleito. Renovação radical, tirar tudo que aí está, como se o que vem de fora fosse, por si mesmo, superior, não teremos. E isso também é bom. Uma política mais honesta, um pouco mais disposta a discutir ideias e que saiba preservar o saber de nossa política tradicional; um amálgama do que há de melhor no novo e no velho. É isso que desejo para o Brasil em 2018. Feliz ano novo!