A desistência sem luta do PT
Fernando Haddad ficou parado, esperando que as demais forças caminhassem até ele. O problema é que a História mudou
Publicado em 25 de outubro de 2018 às, 12h05.
O PT não é nem de longe o grande perdedor dessas eleições. Se eu fosse dar esse título para alguém, seria o PSDB: bancada drasticamente reduzida, partido fraturado e correndo sério risco de perder seus dois maiores governos: São Paulo e Minas Gerais.
No entanto, o PT caminha sim para uma inglória lavada na corrida presidencial. Confesso que não previ este resultado: superestimei a força do PT no segundo turno. Ao mesmo tempo, Haddad não tomou os passos que pareciam óbvios assim que passou para o segundo turno: uma guinada decisiva para o centro.
Vê-lo cotidianamente se consultando com Lula preso ao longo da campanha do primeiro turno foi um espetáculo abjeto, desmoralizante no mais alto grau. Assistir a um verdadeiro poste sem nenhuma fala própria, apenas fazendo referência ao ex-presidente nos debates em que participou, também. Mas tudo se explicava como estratégia eleitoral: dessa maneira, Haddad colava sua imagem à de Lula e conseguiria os votos necessários para passar ao segundo turno, vencendo seus adversários diretos no primeiro: Ciro e Marina. Do ponto de vista cívico e republicano era horroroso, mas fazia sentido estratégico.
A questão é que, uma vez no segundo turno, esperava-se uma mudança radical. Neste momento, e indo contra Bolsonaro, sabia-se que todos os votos de esquerda no país estariam com ele, não importando o que ele falasse ou mudasse de seu plano. Ainda que Haddad se transformasse num neoliberal e falasse em privatizar a Petrobrás, ele ainda assim conquistaria os votos da esquerda para derrotar Bolsonaro.
Não foi o que ele fez. Haddad optou por algumas mudanças cosméticas como trocar as cores da chapa e frequentar igreja. Vimos pouca mudança de programa e nenhum mudança na postura pessoal. Era o momento de romper publicamente com os nomes menos recomendáveis do PT e formular uma agenda de centro democrático, com reformas, segurança pública, liberdades garantidas e preocupação social. Ao contrário, vimos o foco mantido no controle da mídia e na reforma bancária e o mesmo Haddad pouco assertivo e apagado, ainda defendendo de maneiras injustificáveis alguns dos piores aspectos do legado do PT.
Haddad ficou parado, esperando que as demais forças caminhassem até ele. O PT acreditou ter algum tipo de autoridade moral para exigir dos outros que aceitassem sua liderança, sob pena de ficarem do lado errado da história. O problema é que a História mudou.
Para a maior parte do eleitorado, o PT não é associado à defesa da democracia nem nada do tipo. O PT é visto como uma gangue de bandidos hipócritas que mentem, enganam e roubam o quanto for preciso para chegar ao poder e dele nunca sair. Só isso. Todos os ideais alegados no enfrentamento a Bolsonaro são vistos como suspeita; não seria só mais uma mentira para enganar a população?
De pouco adianta conversar com FHC a essa altura do campeonato. Não ter tido, já no início do segundo turno, uma agenda de centro que fizesse sentido para FHC e outras lideranças nacionais que se horrorizam com Bolsonaro foi um erro fruto da cegueira moral do partido. Cegueira que talvez tenha algo de estratégico por parte daqueles que não gostam de Haddad e que davam a eleição de 2018 por perdida; mas de Haddad, esperava-se mais.
Na falta de um milagre (se de Deus ou do diabo, deixo a critério do leitor), Bolsonaro vencerá a eleição no domingo. Haddad tenta, com atraso, fazer a tal caminhada para o centro, ao mesmo tempo em que Lula manda carta acusando a mídia e a Justiça. Será que ele também já se resignou com a derrota e joga com olhos em 2022? Foi uma desistência sem luta.