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Trata Brasil defende que saneamento esteja no centro das campanhas esse ano

Diante dos últimos dados do Censo, entrevistamos Luana Pretto, presidente-executiva da instituição

Luana Pretto (Trata Brasil/Divulgação)
Instituto Millenium

Instituto Millenium

Publicado em 29 de fevereiro de 2024 às 16h18.

Última atualização em 29 de fevereiro de 2024 às 17h10.

O Censo 2022, publicado na semana passada, pelo IBGE, revelou que, apesar dos avanços, ainda temos grandes desafios para atingir as metas de saneamento básico em 2033, especialmente nas regiões Norte e Nordeste do país. Sobre isso, o Instituto Millenium entrevistou Luana Pretto, presidente-executiva do Instituto Trata Brasil.

Para ela, é importante aproveitarmos o ano eleitoral para colocar o tema no centro do debate, pressionando os candidatos para que incluam propostas e soluções de saneamento em seus planos de governo. Como exemplo de política que deveria ser replicada, ela cita a criação dos blocos regionais para o endereçamento coletivo das soluções de saneamento. “Por meio dos blocos, é possível racionalizar melhor os recursos e providenciar as melhores e mais sistêmicas soluções tanto para o saneamento quanto para a preservação dos recursos hídricos”, defendeu.

Leia abaixo a entrevista completa:

Instituto Millenium: Diante dos resultados do Censo 2022, que apontam para milhões de brasileiros ainda sem acesso adequado a serviços de saneamento, quais áreas (como financiamento, tecnologia, governança) devem ser priorizadas pelos governos nos próximos anos para solucionar esse que é um dos desafios mais urgentes do Brasil?

Luana Pretto: O novo Censo expôs uma realidade infelizmente ainda precária. Apesar dos avanços nas últimas décadas, existe muito a ser feito para alcançarmos a universalização do saneamento, proposta pelo seu Novo Marco Legal, que define que todos os municípios do país devem garantir que 99% da população tenha acesso à água potável e 90% ao tratamento e a coleta de esgoto até o ano de 2033.

Os governos devem, sem dúvida, priorizar a inclusão do tema na agenda pública. Este é um ano eleitoral nos municípios e precisamos pressionar os candidatos para que incluam propostas e soluções de saneamento em seus planos de governo. Além disso, para alcançarmos a universalização no ritmo proposto, devemos ampliar – e muito – os investimentos. De acordo com os últimos dados

divulgados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), ano-base 2022, o total de investimentos no setor foi de R$22,5 bilhões no ano, aumento de 30% em relação aos R$ 17,3 bilhões de 2021, porém aquém dos R$44,8 bilhões anuais para atingirmos a universalização.

IM: Com a persistência de desigualdades regionais em acesso ao saneamento, poderia nos dar exemplos de políticas ou iniciativas nacionais ou internacionais bem-sucedidas que poderiam ser adaptadas ao Brasil para reduzir essas disparidades?

LP: Como reflexo do novo Marco, a criação dos blocos regionais para o endereçamento coletivo das soluções de saneamento é um mecanismo interessante. Resgata a tese dos incentivos cruzados, que auxiliam a viabilidade técnica, econômica e social de projetos e a consequente atração de investimentos para estes projetos. Por meio dos blocos, é possível racionalizar melhor os recursos e providenciar as melhores e mais sistêmicas soluções tanto para o saneamento quanto para a preservação dos recursos hídricos.

IM: Como você avalia a implementação do marco regulatório do saneamento nos municípios brasileiros, especialmente em termos de atingir as metas de universalização? Existem governos que têm se destacado ao adotar abordagens que tem permitido expandir o acesso ao saneamento com maior velocidade? E O novo marco regulatório do saneamento busca atrair mais investimentos privados para expandir o acesso ao saneamento básico no Brasil. No entanto, além da questão financeira, enfrentamos obstáculos como a demora em obter licenças ambientais, falta de capacidade técnica e escassez de capital humano para realizar as obras necessárias. Quais estratégias podemos adotar para superar esses desafios?

LP: O Marco colocou o saneamento com algum destaque no cenário nacional. Muito se falou de saneamento nos últimos anos e, quanto mais os governantes e a sociedade falarem do acesso a água e coleta e tratamento dos esgotos, melhor para que as soluções sejam implementadas.

Então do ponto de vista prático, o Marco reforçou o compromisso que o Brasil assumiu com os brasileiros, de universalização. Ou seja, até 2033, 99% da população tem de ter acesso à água limpa e ao menos 90% têm que ter coleta e tratamento de esgoto.

Esse movimento gerou, nos últimos três anos, também diversos projetos de saneamento no Amapá, no Rio de Janeiro, no Ceará e em Alagoas, que, juntos, somam cerca de 68 bilhões de reais em investimentos e alcançam 31 milhões de pessoas. Além disso, para o futuro existem ainda outros projetos sendo estruturados no país que podem alcançar quase 50 milhões de brasileiros nos próximos anos.

Portanto, embora o ritmo de evolução dos indicadores seja mais lento que o ideal, os investimentos que estão sendo conduzidos devem evidenciar avanços mais consistentes no médio prazo.

É importante que os municípios contemplem em seus instrumentos de gestão o saneamento básico, seja no Plano Diretor Municipal, no Plano Municipal de Saneamento Básico e outros documentos correlatos que ajudem no planejamento e endereçamento das soluções, acompanhando o crescimento dos municípios como organismos vivos e dinâmicos que são.

IM: Quais inovações tecnológicas ou institucionais você acredita que serão fundamentais para acelerar o progresso em direção à universalização do saneamento básico no Brasil nos próximos anos?

LP: O acesso contínuo às novas tecnologias de prestação dos serviços de saneamento, buscando por mais eficiência e eficácia, deve ser sempre um objetivo dos operadores de saneamento. Contudo, já há disponibilidade suficiente de soluções para levarmos saneamento básico às pessoas. O arranjo institucional para as soluções me parece um caminho mais crítico, no qual, aos poucos, vamos avançando. Reforçando, portanto, a visão já apresentada, é importante que os municípios contemplem em seus instrumentos de gestão o saneamento básico, seja no Plano Diretor municipal, no Plano Municipal de Saneamento Básico e outros documentos correlatos que ajudem no planejamento e endereçamento das soluções, acompanhando o crescimento dos municípios como organismos vivos e dinâmicos que são. É necessário priorizar o tema.

Então é preciso jogar luz a essa capacidade municipal a ser desenvolvida, por conta própria ou com apoio institucional dos demais entes federativos, em especial para os pequenos municípios, para a estruturação de projetos e soluções que envolvam o saneamento básico. A própria alternativa de criação dos blocos regionais é interessante, na medida em que auxilia a viabilidade de projetos ao unir uma maior quantidade de municípios com uma solução conjunta ao invés de soluções “individuais”.

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O Censo 2022, publicado na semana passada, pelo IBGE, revelou que, apesar dos avanços, ainda temos grandes desafios para atingir as metas de saneamento básico em 2033, especialmente nas regiões Norte e Nordeste do país. Sobre isso, o Instituto Millenium entrevistou Luana Pretto, presidente-executiva do Instituto Trata Brasil.

Para ela, é importante aproveitarmos o ano eleitoral para colocar o tema no centro do debate, pressionando os candidatos para que incluam propostas e soluções de saneamento em seus planos de governo. Como exemplo de política que deveria ser replicada, ela cita a criação dos blocos regionais para o endereçamento coletivo das soluções de saneamento. “Por meio dos blocos, é possível racionalizar melhor os recursos e providenciar as melhores e mais sistêmicas soluções tanto para o saneamento quanto para a preservação dos recursos hídricos”, defendeu.

Leia abaixo a entrevista completa:

Instituto Millenium: Diante dos resultados do Censo 2022, que apontam para milhões de brasileiros ainda sem acesso adequado a serviços de saneamento, quais áreas (como financiamento, tecnologia, governança) devem ser priorizadas pelos governos nos próximos anos para solucionar esse que é um dos desafios mais urgentes do Brasil?

Luana Pretto: O novo Censo expôs uma realidade infelizmente ainda precária. Apesar dos avanços nas últimas décadas, existe muito a ser feito para alcançarmos a universalização do saneamento, proposta pelo seu Novo Marco Legal, que define que todos os municípios do país devem garantir que 99% da população tenha acesso à água potável e 90% ao tratamento e a coleta de esgoto até o ano de 2033.

Os governos devem, sem dúvida, priorizar a inclusão do tema na agenda pública. Este é um ano eleitoral nos municípios e precisamos pressionar os candidatos para que incluam propostas e soluções de saneamento em seus planos de governo. Além disso, para alcançarmos a universalização no ritmo proposto, devemos ampliar – e muito – os investimentos. De acordo com os últimos dados

divulgados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), ano-base 2022, o total de investimentos no setor foi de R$22,5 bilhões no ano, aumento de 30% em relação aos R$ 17,3 bilhões de 2021, porém aquém dos R$44,8 bilhões anuais para atingirmos a universalização.

IM: Com a persistência de desigualdades regionais em acesso ao saneamento, poderia nos dar exemplos de políticas ou iniciativas nacionais ou internacionais bem-sucedidas que poderiam ser adaptadas ao Brasil para reduzir essas disparidades?

LP: Como reflexo do novo Marco, a criação dos blocos regionais para o endereçamento coletivo das soluções de saneamento é um mecanismo interessante. Resgata a tese dos incentivos cruzados, que auxiliam a viabilidade técnica, econômica e social de projetos e a consequente atração de investimentos para estes projetos. Por meio dos blocos, é possível racionalizar melhor os recursos e providenciar as melhores e mais sistêmicas soluções tanto para o saneamento quanto para a preservação dos recursos hídricos.

IM: Como você avalia a implementação do marco regulatório do saneamento nos municípios brasileiros, especialmente em termos de atingir as metas de universalização? Existem governos que têm se destacado ao adotar abordagens que tem permitido expandir o acesso ao saneamento com maior velocidade? E O novo marco regulatório do saneamento busca atrair mais investimentos privados para expandir o acesso ao saneamento básico no Brasil. No entanto, além da questão financeira, enfrentamos obstáculos como a demora em obter licenças ambientais, falta de capacidade técnica e escassez de capital humano para realizar as obras necessárias. Quais estratégias podemos adotar para superar esses desafios?

LP: O Marco colocou o saneamento com algum destaque no cenário nacional. Muito se falou de saneamento nos últimos anos e, quanto mais os governantes e a sociedade falarem do acesso a água e coleta e tratamento dos esgotos, melhor para que as soluções sejam implementadas.

Então do ponto de vista prático, o Marco reforçou o compromisso que o Brasil assumiu com os brasileiros, de universalização. Ou seja, até 2033, 99% da população tem de ter acesso à água limpa e ao menos 90% têm que ter coleta e tratamento de esgoto.

Esse movimento gerou, nos últimos três anos, também diversos projetos de saneamento no Amapá, no Rio de Janeiro, no Ceará e em Alagoas, que, juntos, somam cerca de 68 bilhões de reais em investimentos e alcançam 31 milhões de pessoas. Além disso, para o futuro existem ainda outros projetos sendo estruturados no país que podem alcançar quase 50 milhões de brasileiros nos próximos anos.

Portanto, embora o ritmo de evolução dos indicadores seja mais lento que o ideal, os investimentos que estão sendo conduzidos devem evidenciar avanços mais consistentes no médio prazo.

É importante que os municípios contemplem em seus instrumentos de gestão o saneamento básico, seja no Plano Diretor Municipal, no Plano Municipal de Saneamento Básico e outros documentos correlatos que ajudem no planejamento e endereçamento das soluções, acompanhando o crescimento dos municípios como organismos vivos e dinâmicos que são.

IM: Quais inovações tecnológicas ou institucionais você acredita que serão fundamentais para acelerar o progresso em direção à universalização do saneamento básico no Brasil nos próximos anos?

LP: O acesso contínuo às novas tecnologias de prestação dos serviços de saneamento, buscando por mais eficiência e eficácia, deve ser sempre um objetivo dos operadores de saneamento. Contudo, já há disponibilidade suficiente de soluções para levarmos saneamento básico às pessoas. O arranjo institucional para as soluções me parece um caminho mais crítico, no qual, aos poucos, vamos avançando. Reforçando, portanto, a visão já apresentada, é importante que os municípios contemplem em seus instrumentos de gestão o saneamento básico, seja no Plano Diretor municipal, no Plano Municipal de Saneamento Básico e outros documentos correlatos que ajudem no planejamento e endereçamento das soluções, acompanhando o crescimento dos municípios como organismos vivos e dinâmicos que são. É necessário priorizar o tema.

Então é preciso jogar luz a essa capacidade municipal a ser desenvolvida, por conta própria ou com apoio institucional dos demais entes federativos, em especial para os pequenos municípios, para a estruturação de projetos e soluções que envolvam o saneamento básico. A própria alternativa de criação dos blocos regionais é interessante, na medida em que auxilia a viabilidade de projetos ao unir uma maior quantidade de municípios com uma solução conjunta ao invés de soluções “individuais”.

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