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‘Time’, o vexame

José Serra disse que Lula aparecer na lista dos mais influentes da “Time” é bom para o Brasil. Enganou-se redondamente. O mais novo outdoor emoldurando o presidente brasileiro é, sem meias-palavras, um vexame. É bem verdade que, na pressa da vida moderna, ninguém mais lê nada direito. Valem as manchetes. E são justamente a ignorância e a pressa que podem salvar o Brasil nesse caso da “Time”. Mas se der […] Leia mais

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Instituto Millenium

Publicado em 8 de maio de 2010 às, 12h57.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 11h55.

José Serra disse que Lula aparecer na lista dos mais influentes da “Time” é bom para o Brasil. Enganou-se redondamente. O mais novo outdoor emoldurando o presidente brasileiro é, sem meias-palavras, um vexame.

É bem verdade que, na pressa da vida moderna, ninguém mais lê nada direito. Valem as manchetes. E são justamente a ignorância e a pressa que podem salvar o Brasil nesse caso da “Time”.

Mas se der zebra e o pessoal desandar a ler o texto do cineasta Michael Moore – que justifica a exaltação a Lula –, nem uma junta com Duda Mendonça e Ivo Pitanguy dará jeito no estrago.

A razão do constrangimento “extraordinário” é singela e trágica: querendo fazer uma elegia politicamente correta aos pobres, Michael Moore acabou escrevendo um texto preconceituoso, etnocêntrico e reacionário.

Como se sabe, o referido cineasta ganha a vida bajulando os militantes do antiamericanismo, que compõem um mercado vasto e altamente lucrativo. É o surrado – mas sempre eficiente – número do americano gordo e branco esculhambando os americanos gordos e brancos. Um negócio da China.

Rodando seus panfletos contra George Bush – o emprego do século –, Michael Moore chegou a fazer carinho na al-Qaeda, no seu libelo sobre o 11 de setembro, irresponsavelmente classificado como documentário.

A “Time” avacalhou o Brasil ao escalar esse autor para exaltar Lula. O texto retórico e ignorante reforçará (para o bom entendedor) a imagem de um país longínquo e desimportante, que só aparece no centro do mundo como folclore – no caso, com um presidente transformado em bibelô da miséria.

Como sempre, Michael Moore ouviu o galo cantar e não sabe aonde. Mesmo cedendo aqui e ali ao sectarismo petista, a verdade é que Lula regeu um momento histórico de estabilidade política e conciliação nacional. Seguindo a linha do seu antecessor, soube esvaziar as crises paroquiais que desde sempre atolaram o país.

Como nada disso importa de verdade ao ranking mandrake da “Time”, o cineasta panfletário festejou Lula como um Indiana Jones da periferia contra os “barões ladrões”, pintando um quadro de cisão social e vingança popular. Só faltou celebrar os 50 anos da capital Caracas.

De sobremesa, o presidente brasileiro é envernizado pela revista americana e seu redator aloprado como exemplo mundial por seu programa Fome Zero – um conhecido e retumbante fracasso de propaganda populista. Vexame.

Com seu texto surrealista e preguiçoso, Michael Moore transmite (aos que não tiverem preguiça de lê-lo) uma única mensagem: não tem o menor respeito por Lula, pelos pobres ou pelo Brasil como nação. O que o comove de verdade é a sua indústria particular de heróis coitados.

Os brasileiros ainda tiveram que engolir a errata da “Time”: o primeiro lugar da lista não era de Lula, mas do texto de Moore. Durma-se com um orgulho desses.

(Publicado no blog de Guilherme Fiuza no site da revista “Época”)