"Sociedade deve discutir a reforma política"
Especialista comenta pontos da reforma e critica adoção do distritão: "Votos menos politizados e mais caros"
Publicado em 10 de agosto de 2017 às, 16h15.
Última atualização em 15 de agosto de 2017 às, 11h16.
A reforma política começou a ser discutida na comissão especial da Câmara dos Deputados. Na madrugada de quinta-feira (10), os parlamentares aprovaram o texto-base do relator, o deputado Vicente Cândido, que pode trazer mudanças para o sistema eleitoral já no próximo pleito. O especialista do Instituto Millenium, Fernando Schuler, cientista político, professor e doutor em filosofia, explicou os principais pontos da proposta. Segundo ele, esse debate deveria envolver toda a sociedade na escolha de um novo sistema de governo.
Fundo Especial de Financiamento da Democracia
Uma das mudanças aprovadas na Comissão foi o voto favorável para a criação do Fundo Especial de Financiamento da Democracia. O chamado “fundão” destinaria, em 2018, R$ 3,6 bilhões do orçamento da União para os partidos políticos, a fim de financiar as campanhas. O modelo apareceu após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de acabar com o financiamento das empresas, aumentando a prática de caixa dois nas últimas eleições.
“O Brasil possui um sistema de voto em lista aberta, que proporciona eleições caras. Não é um fundo partidário que resolverá esse problema. O fundão é uma espécie de ‘bolsa candidato’, onde teríamos um gasto grande e não resolveríamos a questão. Essa proposta vem em um momento ruim para o país, quando o sistema político brasileiro se recusa a discutir uma mudança no sistema eleitoral, que reduziria o custo das campanhas. Quem deve financiar os partidos são os eleitores e cidadãos de acordo com suas preferências e convicções e não a partir de uma doação involuntária por meio dos impostos”, afirmou Schuler.
Distritão
A Comissão especial também aprovou uma emenda que estabelece o “distritão” nas eleições para deputados de 2018 e vereadores de 2020. No sistema, a eleição passaria a ser majoritária, sem quociente eleitoral ou voto em legenda. Dessa forma, os mais votados de cada município ou estado seriam eleitos, independente de partidos. A princípio, o “distritão” seria um modelo de transição para o distrital misto, que passaria a valer em 2022.
“O distritão é um sistema que favorece as estrelas, celebridades e máquinas eleitorais. Além do mais, você tem votos menos politizados e mais caros. Me parece que se cria uma legislação para inglês ver. Ao mesmo tempo que se aponta um bom modelo para o futuro, em curto prazo, é dada uma péssima solução, pois há conflito de interesse para preservação de poder”, disse o cientista político, que defende o voto distrital, onde os representantes são eleitos por maioria simples. Nesse modelo, os estados e municípios são divididos em distritos e cada um deles pode eleger apenas um deputado. “O voto distrital aproxima o eleitor de seu candidato e aumenta a politização da campanha. Além disso, há uma redução nos recursos empregados, pois ela aconteceria dentro de uma certa área, envolvendo algumas comunidades e não todo o estado”.
Plebiscito
Após aprovada na comissão, a proposta vai para o plenário da Câmara dos Deputados, onde necessita do voto favorável de, pelo menos, 308 deputados em cada turno de votação. Depois, a proposta é encaminhada ao Senado. Schuler, no entanto, acredita que a matéria deve ter uma discussão mais ampla, envolvendo toda a população.
“O Brasil poderia submeter à consulta popular o novo sistema de governo, abordando temas como parlamentarismo, processo eleitoral e, inclusive, o financiamento de campanhas. Não há clima para isso nesse momento, então defendo que, a curto prazo, as regras sejam mantidas. No entanto, a partir de 2019 e da nova legislatura, o país deve encarar com seriedade essa discussão, de maneira organizada e com ampla legitimidade”, finalizou.