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Sobre a tragédia de Minas e a mentalidade anticapitalista

João Luiz Mauad: "País precisa é de uma justiça mais rápida e menos procrastinatória"

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institutomillenium

Publicado em 28 de janeiro de 2019 às 11h59.

PorJoão Luiz Mauad*

Para aqueles que, como eu, sempre lutaram para estabelecer uma mentalidade verdadeiramente capitalista em Pindorama, o segundo desastre da Vale, em apenas três anos, foi uma ducha de água fria.

Nossos adversários, rápidos como um raio, nem esperaram a contagem dos mortos para começar seu proselitismo anticapitalista e, principalmente, antiprivatista. A Sra. Gleisi Hoffman, por exemplo, ocupou uma rede social, no mesmo dia, para culpar as privatizações do Governo FHC pela tragédia. Pelo WhatsApp, recebi inúmeras mensagens de amigos culpando a ganância e a busca desenfreada pelo lucro como as causas do desastre. Uma frase boboca circulava a todo vapor e era repassada até mesmo por quem atualmente se diz "de direita": "Lucro acima de tudo. Lama acima de todos."

Ótimo, respondia eu ironicamente. Fechem a Vale, façam uma "Reforma Mineral" e entreguem a exploração a pequenas empresas sem fins lucrativos, de preferência comandadas pelos próprios empregados. Ou reestatizem a empresa e deixem os políticos e os burocratas cuidar da gestão de riscos. Tenho certeza que assim vai ficar bom pra todo mundo.

Ironias à parte, sempre que leio bobagens desse tipo, lembro da crise de 2009, quando a esquerda insistia em culpar a ganância empresarial pelas mazelas econômicas. Foi quando li uma frase do economista americano Lawrence White da qual nunca mais esqueci. "Culpar a ganância humana pelo problema é o mesmo que culpar a lei da gravidade pela queda de aviões". Em outras palavras, assim como a gravidade nos eventos de natureza física, a ganância humana estará sempre presente nas interações dos indivíduos no mercado, gostemos disso ou não.

Não obstante estas obviedades, aqueles de nós que defendem o capitalismo e o livre mercado não raro costumam enfrentar aquele tipo de argumento, segundo o qual a ganância de uns poucos privilegiados é responsável não apenas pelos mais diversos crimes, mas também pela pobreza atroz da humanidade e pelo aumento constante das desigualdades.

Leia mais de João Luiz Mauad
O comércio internacional é uma forma de tecnologia
A diferença entre empresa pública e privada numa imagem
Não há ganhadores nas guerras comerciais

Infelizmente, esta é a imagem que muitas pessoas têm do capitalismo liberal ao redor do mundo, um sistema que privilegia a ganância das grandes corporações em detrimento de todo resto. Um sistema que pretende tirar poderes do estado para facilitar a tirania do capital, custe o que custar.

Esquecem que o ser humano é por natureza imperfeito e que só contornamos as nossas imperfeições através dos incentivos certos. A busca pelo lucro (ou ganância, como preferem chamar alguns) é ela mesma um incentivo poderoso - a meu juízo muito mais para o bem que para o mal.

Não é sensato pensar que uma empresa do porte da Vale negligenciaria de forma consciente a segurança de uma barragem para economizar uns caraminguás, quando o potencial de dano financeiro de uma ocorrência como a da semana passada é imenso. Pelo mesmo motivo, companhias aéreas privadas não dão menos atenção à manutenção e ao treinamento do que as estatais, pelo simples fato de que qualquer acidente pode representar a ruína.

Acidentes acontecem, independentemente de se tratar de empresas privadas ou públicas (basta olhar a sinistralidade ambiental e humana de uma Petrobras, por exemplo, para comprovar isso). Estas, mesmo que não tenham tanto compromisso com resultados, têm outros incentivos, alguns bastante perversos, atuando sobre elas. O fato é que, apesar da ganância privada, eu ainda prefiro me tratar num hospital privado do que num público.

Mas mentalidade anticapitalista não parou por aí. Num verdadeiro clima de caça às bruxas, logo apareceram também os justiceiros de ocasião com sua sanha persecutória pedindo prisão sumária para toda a direção da Vale, antes mesmo de abertos os inquéritos para apuração de responsabilidades.

+ Helio Gurovitz: Quando saberemos prevenir?

Por favor, não me entendam mal. Não estou a dizer que nada deve ser apurado ou que a empresa não deva sofrer pesadas punições. Pelo contrário, conhecendo a lei dos incentivos como eu conheço, estou certo de que muita coisa precisa ser mudada.

O órgão mais sensível de qualquer empresa é o caixa, e, por extensão, seus lucros. Entendo que a lei deveria ser alterada para dar à justiça condições de impor às empresas pesadas multas e obrigação de indenizar, através de ritos sumários e muito mais rápidos do que ocorre hoje.

Isso não apenas representaria uma punição amarga para as empresas que dessem causa a tais tragédias, como de certa forma confortaria mais prontamente os prejudicados e/ou suas famílias. Tudo isso sem prejuízo de eventuais punições criminais, caso reste comprovado algum tipo de dolo de alguém ou alguns.

Enfim, o que o país precisa é de uma justiça mais rápida e menos procrastinatória. Só para se ter uma ideia, muitas indenizações por conta da tragédia de Mariana ainda estão para ser pagas, embora as empresas envolvidas já tenham bilhões de reais congelados para tal fim.

Propor estatizações, mais regras, mais regulamentações, mais fiscalização, mais burocracia num país já sobrecarregado delas é chover no molhado. Só atrasa a economia e resolve muito pouco ou quase nada.

*Administrador de empresas formado pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas (EBAP/FGV-RJ), João Luiz Mauad é articulista dos jornais “O Globo” e “Diário do Comércio”. Escreve regularmente para o site do Instituto Liberal.

PorJoão Luiz Mauad*

Para aqueles que, como eu, sempre lutaram para estabelecer uma mentalidade verdadeiramente capitalista em Pindorama, o segundo desastre da Vale, em apenas três anos, foi uma ducha de água fria.

Nossos adversários, rápidos como um raio, nem esperaram a contagem dos mortos para começar seu proselitismo anticapitalista e, principalmente, antiprivatista. A Sra. Gleisi Hoffman, por exemplo, ocupou uma rede social, no mesmo dia, para culpar as privatizações do Governo FHC pela tragédia. Pelo WhatsApp, recebi inúmeras mensagens de amigos culpando a ganância e a busca desenfreada pelo lucro como as causas do desastre. Uma frase boboca circulava a todo vapor e era repassada até mesmo por quem atualmente se diz "de direita": "Lucro acima de tudo. Lama acima de todos."

Ótimo, respondia eu ironicamente. Fechem a Vale, façam uma "Reforma Mineral" e entreguem a exploração a pequenas empresas sem fins lucrativos, de preferência comandadas pelos próprios empregados. Ou reestatizem a empresa e deixem os políticos e os burocratas cuidar da gestão de riscos. Tenho certeza que assim vai ficar bom pra todo mundo.

Ironias à parte, sempre que leio bobagens desse tipo, lembro da crise de 2009, quando a esquerda insistia em culpar a ganância empresarial pelas mazelas econômicas. Foi quando li uma frase do economista americano Lawrence White da qual nunca mais esqueci. "Culpar a ganância humana pelo problema é o mesmo que culpar a lei da gravidade pela queda de aviões". Em outras palavras, assim como a gravidade nos eventos de natureza física, a ganância humana estará sempre presente nas interações dos indivíduos no mercado, gostemos disso ou não.

Não obstante estas obviedades, aqueles de nós que defendem o capitalismo e o livre mercado não raro costumam enfrentar aquele tipo de argumento, segundo o qual a ganância de uns poucos privilegiados é responsável não apenas pelos mais diversos crimes, mas também pela pobreza atroz da humanidade e pelo aumento constante das desigualdades.

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Não há ganhadores nas guerras comerciais

Infelizmente, esta é a imagem que muitas pessoas têm do capitalismo liberal ao redor do mundo, um sistema que privilegia a ganância das grandes corporações em detrimento de todo resto. Um sistema que pretende tirar poderes do estado para facilitar a tirania do capital, custe o que custar.

Esquecem que o ser humano é por natureza imperfeito e que só contornamos as nossas imperfeições através dos incentivos certos. A busca pelo lucro (ou ganância, como preferem chamar alguns) é ela mesma um incentivo poderoso - a meu juízo muito mais para o bem que para o mal.

Não é sensato pensar que uma empresa do porte da Vale negligenciaria de forma consciente a segurança de uma barragem para economizar uns caraminguás, quando o potencial de dano financeiro de uma ocorrência como a da semana passada é imenso. Pelo mesmo motivo, companhias aéreas privadas não dão menos atenção à manutenção e ao treinamento do que as estatais, pelo simples fato de que qualquer acidente pode representar a ruína.

Acidentes acontecem, independentemente de se tratar de empresas privadas ou públicas (basta olhar a sinistralidade ambiental e humana de uma Petrobras, por exemplo, para comprovar isso). Estas, mesmo que não tenham tanto compromisso com resultados, têm outros incentivos, alguns bastante perversos, atuando sobre elas. O fato é que, apesar da ganância privada, eu ainda prefiro me tratar num hospital privado do que num público.

Mas mentalidade anticapitalista não parou por aí. Num verdadeiro clima de caça às bruxas, logo apareceram também os justiceiros de ocasião com sua sanha persecutória pedindo prisão sumária para toda a direção da Vale, antes mesmo de abertos os inquéritos para apuração de responsabilidades.

+ Helio Gurovitz: Quando saberemos prevenir?

Por favor, não me entendam mal. Não estou a dizer que nada deve ser apurado ou que a empresa não deva sofrer pesadas punições. Pelo contrário, conhecendo a lei dos incentivos como eu conheço, estou certo de que muita coisa precisa ser mudada.

O órgão mais sensível de qualquer empresa é o caixa, e, por extensão, seus lucros. Entendo que a lei deveria ser alterada para dar à justiça condições de impor às empresas pesadas multas e obrigação de indenizar, através de ritos sumários e muito mais rápidos do que ocorre hoje.

Isso não apenas representaria uma punição amarga para as empresas que dessem causa a tais tragédias, como de certa forma confortaria mais prontamente os prejudicados e/ou suas famílias. Tudo isso sem prejuízo de eventuais punições criminais, caso reste comprovado algum tipo de dolo de alguém ou alguns.

Enfim, o que o país precisa é de uma justiça mais rápida e menos procrastinatória. Só para se ter uma ideia, muitas indenizações por conta da tragédia de Mariana ainda estão para ser pagas, embora as empresas envolvidas já tenham bilhões de reais congelados para tal fim.

Propor estatizações, mais regras, mais regulamentações, mais fiscalização, mais burocracia num país já sobrecarregado delas é chover no molhado. Só atrasa a economia e resolve muito pouco ou quase nada.

*Administrador de empresas formado pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas (EBAP/FGV-RJ), João Luiz Mauad é articulista dos jornais “O Globo” e “Diário do Comércio”. Escreve regularmente para o site do Instituto Liberal.

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