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“O monopólio tende a gerar menos bem-estar do que concorrência”

Economista José Márcio Camargo analisa aumento no preço dos combustíveis e a greve dos caminhoneiros que paralisa serviços essenciais no país

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Instituto Millenium

Publicado em 24 de maio de 2018 às, 13h59.

O Brasil para diante da greve geral dos caminhoneiros, que completa quatro dias nesta quinta-feira (24) e já prejudica serviços como transporte, alimentação e até mesmo o abastecimento de água. Em meio à polêmica, a Petrobras anunciou uma nova redução no preço dos combustíveis, a terceira desde o início da paralisação, medida que fez as ações da empresa despencarem mais de 10%. Em entrevista ao Instituto Millenium, o economista José Márcio Camargo analisa o atual cenário e comenta os malefícios das intervenções governamentais na estatal que, mesmo atuando em um mercado aberto de refino, ainda detém o monopólio no Brasil. Ouça a entrevista abaixo!

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Reajustes quase diários no valor dos combustíveis começaram após a adoção de uma nova política de preços da empresa, que acompanha a cotação do petróleo no mercado internacional e a variação no câmbio. Em 10 meses, o preço do diesel subiu 56%, motivando os protestos nacionais. Diante da pressão, o governo anunciou um acordo com o Congresso para promover mudanças na carga tributária. A intenção é zerar a Cide, que incide sobre os combustíveis, na tentativa de baixar o preço do óleo diesel. A Associação Brasileira de Caminhoneiros, porém, pressiona o Congresso a aprovar projeto que elimina a cobrança de PIS/Cofins sobre o diesel até o fim do ano.

Embora haja uma preocupação geral em relação aos reajustes excessivos, a decisão de acompanhar o mercado global é positiva e vem devolvendo a confiança da estatal, que está se estruturando após a grave crise dos últimos anos e o excesso de intervenção do Estado. Para José Márcio Camargo, nesta realidade, a decisão de diminuir os tributos está equivocada. “Isso é algo complicado, pois essa medida está transferindo renda de pobre para rico. Ou seja, uma parte do dinheiro do imposto pago pelos brasileiros, incluindo os mais pobres, será usado para subsidiar o diesel, utilizado para transportar bens e serviços comprados pela parte da população com renda mais alta. É uma política redistributiva ao contrário”.

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O economista acredita que o governo está acertando ao dar mais independência à Petrobras, evitando interferências no setor. José Márcio lembra que, em gestões anteriores, o excesso de controle governamental trouxe um preço alto para a economia do país, sendo necessária a utilização de dinheiro público para evitar uma quebra na instituição. “O que vimos no passado é que a interferência no preço do petróleo e combustíveis acabou gerando uma dívida monumental na estatal. O governo Dilma praticamente faliu a empresa, que só não foi à falência pois era propriedade do Estado. Isso significa que a população brasileira como um todo estava financiando a Petrobras, o que é um escândalo”, lembra.

Há mais de 20 anos, o mercado de refino é aberto no Brasil, em contrapartida, a Petrobras é praticamente a única empresa responsável pelo serviço no país. O especialista explica que a presença constante do governo e o tamanho da estatal acabam afastando a entrada de novos investidores no mercado:

“Quem controla o preço do petróleo é uma empresa, chamada Petrobras. Você estaria na mão dela, ou seja, do governo. Não vale a pena”, ressaltando o quanto a situação é nociva em diferentes níveis, gerando uma grande perda social. “O que acontece é que ela não precisa ser competitiva, detém os poderes de formação de preços dentro do país… O monopólio tende a gerar menos bem-estar do que concorrência”.

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Sebastião Ventura é advogado e conselheiro do Imil

Com a palavra, Sebastião Ventura:
“A liberdade de manifestação consagrada na Constituição não permite que esta manifestação prejudique outras liberdades constitucionais. Então, toda vez que um direito constitucional é exercido de forma abusiva, ou seja, que prejudique a liberdade, direitos alheios de outra pessoa ou de empresas, ou que coloque em risco a própria continuidade ou manutenção da estabilidade econômica do país, é claro que esse tipo de manifestação é ilegal. A partir do momento que é constatada essa ilegalidade, cabe as autoridades públicas tomarem iniciativas justamente para recolocar essa manifestação que é legítima, pois os caminhoneiros têm todo o direito de questionar o preço, inclusive a carga tributária abusiva que recai sobre os combustíveis, mas isso não pode se dar de uma forma sem limites. O Brasil é uma República onde existem leis, ainda não viramos uma anarquia. Então, justamente para a retomada da normalidade, cabe as autoridades públicas brasileiras medidas que recoloquem essa manifestação legítima dos caminhoneiros em uma forma adequada e que respeite os demais direitos e liberdades consagrados na Constituição.”