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Não há justiça tributária no obscuro

A Receita Federal divulgou dados referentes à utilização do PERSE, e uma comoção tomou conta das redes sociais

A Receita Federal divulgou dados referentes à utilização do PERSE, e uma comoção tomou conta das redes sociais (Joédson Alves/Agência Brasil)
Maria Carolina Gontijo

Diretora de tributos da Moore Brasil

Publicado em 21 de novembro de 2024 às 13h39.

Em um sistema tributário confuso e complexo, a transparência fiscal é um objetivo quase nunca alcançado. Perdidos entre inúmeras regras e exceções, o próprio governo passava uma mensagem estranha ao criar uma espécie de declaração de incentivos, renúncias, benefícios e imunidades de natureza tributária (DIRBI). Afinal de contas, o Ministério da Fazenda já não teria essa informação, dentre as outras dezenas de declarações as quais os contribuintes estão sujeitos?

Entender o destino de cada real concedido em forma de benefícios fiscais não é apenas um direito do cidadão, mas também uma ferramenta crucial para garantir que esses incentivos realmente promovam desenvolvimento econômico, social e sustentável. Quando os governos oferecem isenções tributárias ou subsídios, eles deixam de arrecadar recursos que poderiam ser direcionados a serviços essenciais, como saúde, educação e infraestrutura. Por isso, monitorar e avaliar o impacto desses benefícios é fundamental para evitar abusos, reduzir desigualdades e assegurar que o dinheiro público seja utilizado de forma eficiente e transparente.

Instituído pela Lei nº 14.148/2021, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE) tinha como objetivo principal mitigar os impactos econômicos causados pela pandemia de COVID-19 ao setor de eventos, turismo e cultura, que sofreu duro impacto com o distanciamento social adotado entre os anos de 2020 e 2021. Entre seus principais benefícios, o PERSE oferece isenção de tributos federais por até cinco anos, incluindo IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. A medida buscava preservar empregos, estimular a retomada das atividades e garantir a sustentabilidade do setor no país. Desde o início a medida já era altamente questionável considerando critérios de elegibilidade e volume da renúncia fiscal.

No último dia 14 de novembro, a Receita Federal divulgou, pela primeira vez, dados referentes à utilização do PERSE. Uma comoção tomou conta das redes sociais a partir de então. Vários influenciadores e negócios digitais, que nenhum impacto sofreram na pandemia, receberam milhões de reais em isenções fiscais graças ao Programa.

Os benefícios fiscais frequentemente envolvem custos ocultos que superam suas vantagens aparentes. Em muitos casos, a redução na arrecadação decorrente destes programas não é compensada pelo aumento na atividade econômica prometida. Estudos mostram que, enquanto reduções nos impostos podem estimular investimentos em certos cenários, esses ganhos são geralmente modestos e, muitas vezes, compensados por cortes em outros serviços públicos cruciais para a população, como saúde e educação. Adicionalmente, a concentração de incentivos fiscais pode levar a desigualdades setoriais. Muitas vezes, como percebemos a partir da divulgação dos dados de utilização do PERSE, grandes corporações e personalidades do entretenimento bem estabelecidas figuram como os principais beneficiários, enquanto pequenas e médias empresas, recebem pouca ou nenhuma ajuda.

Quando as informações sobre o volume de isenções, os setores beneficiados e os resultados esperados e alcançados estão disponíveis, os cidadãos conseguem mensurar se essas medidas estão cumprindo seus objetivos, como fomentar o desenvolvimento econômico ou impulsionar negócios que realmente precisam. Além disso, a transparência coíbe o uso indevido de recursos, reduzindo o risco de favorecimento político ou econômico e permitindo que o debate público seja embasado por evidências. A falta de dados confiáveis e detalhados sobre os incentivos fiscais dificulta a fiscalização por parte da sociedade e órgãos de controle, prejudicando o equilíbrio entre renúncia de receita e benefícios gerados.

O episódio que envolve a utilização do PERSE por empresas ligadas a negócios digitais representa um importante passo na conscientização da importância da participação da sociedade no debate, participação esta que somente foi possível graças à transparência na divulgação dos dados.

A conscientização sobre a racionalização da instituição de benefícios fiscais é crucial para assegurar que esses mecanismos atendam de forma eficiente às necessidades da sociedade. Quando os incentivos são mal planejados ou excessivamente amplos, podem resultar em perdas significativas de receita pública sem os retornos econômicos e sociais esperados. Além disso, ao estimular o debate público sobre o custo-benefício dessas medidas, é possível aumentar a transparência e, por consequência, evitar distorções econômicas e desigualdades causadas por concessões desnecessárias ou ineficazes.

Não há dúvidas que o poder público poderia, sim, promover algum tipo de sustentação e incentivo a um setor que fora atingido como nenhum outro durante a pandemia. Contudo, assistir empresas e personalidades, que em nenhum momento foram impactadas pelo distanciamento social, usufruírem de milhões de reais em isenções provocam um misto de perplexidade e sensação única de injustiça tributária. Se há um lado bom em tudo isso, que possamos celebrar a transparência. Afinal, não há justiça tributária no obscuro.

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Em um sistema tributário confuso e complexo, a transparência fiscal é um objetivo quase nunca alcançado. Perdidos entre inúmeras regras e exceções, o próprio governo passava uma mensagem estranha ao criar uma espécie de declaração de incentivos, renúncias, benefícios e imunidades de natureza tributária (DIRBI). Afinal de contas, o Ministério da Fazenda já não teria essa informação, dentre as outras dezenas de declarações as quais os contribuintes estão sujeitos?

Entender o destino de cada real concedido em forma de benefícios fiscais não é apenas um direito do cidadão, mas também uma ferramenta crucial para garantir que esses incentivos realmente promovam desenvolvimento econômico, social e sustentável. Quando os governos oferecem isenções tributárias ou subsídios, eles deixam de arrecadar recursos que poderiam ser direcionados a serviços essenciais, como saúde, educação e infraestrutura. Por isso, monitorar e avaliar o impacto desses benefícios é fundamental para evitar abusos, reduzir desigualdades e assegurar que o dinheiro público seja utilizado de forma eficiente e transparente.

Instituído pela Lei nº 14.148/2021, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE) tinha como objetivo principal mitigar os impactos econômicos causados pela pandemia de COVID-19 ao setor de eventos, turismo e cultura, que sofreu duro impacto com o distanciamento social adotado entre os anos de 2020 e 2021. Entre seus principais benefícios, o PERSE oferece isenção de tributos federais por até cinco anos, incluindo IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. A medida buscava preservar empregos, estimular a retomada das atividades e garantir a sustentabilidade do setor no país. Desde o início a medida já era altamente questionável considerando critérios de elegibilidade e volume da renúncia fiscal.

No último dia 14 de novembro, a Receita Federal divulgou, pela primeira vez, dados referentes à utilização do PERSE. Uma comoção tomou conta das redes sociais a partir de então. Vários influenciadores e negócios digitais, que nenhum impacto sofreram na pandemia, receberam milhões de reais em isenções fiscais graças ao Programa.

Os benefícios fiscais frequentemente envolvem custos ocultos que superam suas vantagens aparentes. Em muitos casos, a redução na arrecadação decorrente destes programas não é compensada pelo aumento na atividade econômica prometida. Estudos mostram que, enquanto reduções nos impostos podem estimular investimentos em certos cenários, esses ganhos são geralmente modestos e, muitas vezes, compensados por cortes em outros serviços públicos cruciais para a população, como saúde e educação. Adicionalmente, a concentração de incentivos fiscais pode levar a desigualdades setoriais. Muitas vezes, como percebemos a partir da divulgação dos dados de utilização do PERSE, grandes corporações e personalidades do entretenimento bem estabelecidas figuram como os principais beneficiários, enquanto pequenas e médias empresas, recebem pouca ou nenhuma ajuda.

Quando as informações sobre o volume de isenções, os setores beneficiados e os resultados esperados e alcançados estão disponíveis, os cidadãos conseguem mensurar se essas medidas estão cumprindo seus objetivos, como fomentar o desenvolvimento econômico ou impulsionar negócios que realmente precisam. Além disso, a transparência coíbe o uso indevido de recursos, reduzindo o risco de favorecimento político ou econômico e permitindo que o debate público seja embasado por evidências. A falta de dados confiáveis e detalhados sobre os incentivos fiscais dificulta a fiscalização por parte da sociedade e órgãos de controle, prejudicando o equilíbrio entre renúncia de receita e benefícios gerados.

O episódio que envolve a utilização do PERSE por empresas ligadas a negócios digitais representa um importante passo na conscientização da importância da participação da sociedade no debate, participação esta que somente foi possível graças à transparência na divulgação dos dados.

A conscientização sobre a racionalização da instituição de benefícios fiscais é crucial para assegurar que esses mecanismos atendam de forma eficiente às necessidades da sociedade. Quando os incentivos são mal planejados ou excessivamente amplos, podem resultar em perdas significativas de receita pública sem os retornos econômicos e sociais esperados. Além disso, ao estimular o debate público sobre o custo-benefício dessas medidas, é possível aumentar a transparência e, por consequência, evitar distorções econômicas e desigualdades causadas por concessões desnecessárias ou ineficazes.

Não há dúvidas que o poder público poderia, sim, promover algum tipo de sustentação e incentivo a um setor que fora atingido como nenhum outro durante a pandemia. Contudo, assistir empresas e personalidades, que em nenhum momento foram impactadas pelo distanciamento social, usufruírem de milhões de reais em isenções provocam um misto de perplexidade e sensação única de injustiça tributária. Se há um lado bom em tudo isso, que possamos celebrar a transparência. Afinal, não há justiça tributária no obscuro.

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