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Menos hesitocracia, menos vidas perdidas

O início de 2024, treze anos depois do desastre de Fukushima na região nordeste do Japão, trouxe um castigo para o país

Tsunami no Japão: (Divulgação: MasaoTaira/Getty Images)
Claudio D. Shikida

Colunista - Instituto Millenium

Publicado em 3 de janeiro de 2024 às 12h57.

Última atualização em 4 de janeiro de 2024 às 09h42.

Em 2016, a Toho lançou Shin Godzilla (Novo Godzilla, em uma tradução literal), dirigido por Hideaki Anno e Shinji Higuchi. Vários críticos apontaram, à época, que um dos temas do filme seria a crítica à lenta burocracia japonesa que quase não conseguiu evitar uma catástrofe nuclear em Fukushima, no fatídico ano de 2011.

Sobre este tema, aliás, há o livro On the brink: the inside story of Fukushima Daiichi, de Ryusho Kadota, disponível em inglês (e, baseado neste livro, o polêmico Fukushima 50 , que está ou esteve nestas plataformas de filmes). Além disso, neste final de ano, Godzilla Minus One trouxe, como um dos temas, a inação do governo de ocupação no Japão pós-guerra e a necessidade de ação por parte dos próprios cidadãos para evitarem o fim de uma já destruída Tokyo pelo famoso monstro.

Esta coluna não trata de cultura, nem pretende fazer críticas de filmes, mas o leitor deve ter notado que a hesitocracia governamental é o tema comum dos três filmes nipônicos. Acredite, japoneses se queixam frequentemente da lentidão de seu governo. É verdade que, na última edição do índice de efetividade governamental , do Banco Mundial, o Japão ocupa a 20ªposição, em comparação com a 121ªposição, tristemente ocupada pelo Brasil. Note que efetividade de um governo é uma forma de medir a hesitocracia (no caso, quanto mais efetivo, menos hesitocrático).

O início de 2024, treze anos depois do desastre de Fukushima na região nordeste do Japão, trouxe um castigo para a parte ocidental do país, notadamente na prefeitura de Ishikawa. Houve um tsunami, embora não tão intenso quanto o de 2011 que inundou 100 hectares na região, segundo informa o canal público de notícias, NHK. Enquanto esta coluna é escrita, o número de vítimas ainda não teve sua contagem encerrada e 33 mil pessoas estão em centros de evacuação.

É justo dizer que terremotos acima do nível 6 na escala japonesa são desafios brutais para qualquer administração pública (o de 2011 e este recente foram classificados, respectivamente, com níveis 9 e 7) e por mais que se tenham comitês para previsão de terremotos e atualizações de procedimentos para minimizar danos, nem o governo menos hesitocrático do mundo escapará sem vítimas de desastres naturais como estes.

Ainda assim, a sociedade japonesa avançou bastante em alguns procedimentos para minimizar os danos destes desastres incentivando a sociedade a ser mais proativa em situações de emergência e promovendo acordos com o setor privado para ganhar agilidade na resposta às necessidades dos atingidos. Como dito acima, a proatividade dos indivíduos foi tema do último Godzilla, o que nos diz algo sobre a importância deste tema para os japoneses.

É famoso o vídeo em que um trecho de uma estrada japonesa com um imenso buraco causado por um terremoto é reparado em menos de uma semana. O governo japonês conseguiu ser bem ágil neste aspecto, com uso intensivo de tecnologia. Trata-se do sistema InfraDoctor (abreviatura de Infrastructure Doctor ) que envolve mapeamento digital, georreferenciamento e escaneamento a laser. O sistema foi desenvolvido por uma empresa privatizada em 2005, a Shutoko.

Apesar da preocupante situação fiscal do país, o governo japonês ainda é um dos mais eficazes do mundo. O uso de parcerias público-privadas ou o emprego de tecnologias não são aspectos distintivos: vários governos adotam estes princípios. Mais interessante é olhar para situações específicas como a manutenção de estradas ou a atuação governamental diante de terremotos ou tsunamis. Quando o terremoto do dia 01 de janeiro aconteceu, o canal público NHK, passou horas e horas repetindo o alerta e noticiando o fato. Não há muita tecnologia nisto, há?

Esta é a época do ano em que observamos, em algumas cidades brasileiras, deslizamentos de terra causados pelas chuvas. Não me lembro de ver os canais públicos - e eles são tantos no Brasil… - noticiarem fatos como estes, nem de alertarem a população na mesma intensidade. Também não vejo, por aqui, uma ágil manutenção de calçadas, ruas ou estradas. Ouço falar de inovação no governo, de incubadoras governamentais, mas o fato é que, como vimos, nosso governo é bem pouco ágil, apesar de onipresente na vida dos cidadãos.

O ano de 2024 é o ano do dragão no horóscopo sino-nipônico. É um ano no qual, pela crença, espera-se muitas mudanças, boas ou não. Bem poderíamos ter mudanças que tornassem o governo brasileiro menos hesitocrático…

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Em 2016, a Toho lançou Shin Godzilla (Novo Godzilla, em uma tradução literal), dirigido por Hideaki Anno e Shinji Higuchi. Vários críticos apontaram, à época, que um dos temas do filme seria a crítica à lenta burocracia japonesa que quase não conseguiu evitar uma catástrofe nuclear em Fukushima, no fatídico ano de 2011.

Sobre este tema, aliás, há o livro On the brink: the inside story of Fukushima Daiichi, de Ryusho Kadota, disponível em inglês (e, baseado neste livro, o polêmico Fukushima 50 , que está ou esteve nestas plataformas de filmes). Além disso, neste final de ano, Godzilla Minus One trouxe, como um dos temas, a inação do governo de ocupação no Japão pós-guerra e a necessidade de ação por parte dos próprios cidadãos para evitarem o fim de uma já destruída Tokyo pelo famoso monstro.

Esta coluna não trata de cultura, nem pretende fazer críticas de filmes, mas o leitor deve ter notado que a hesitocracia governamental é o tema comum dos três filmes nipônicos. Acredite, japoneses se queixam frequentemente da lentidão de seu governo. É verdade que, na última edição do índice de efetividade governamental , do Banco Mundial, o Japão ocupa a 20ªposição, em comparação com a 121ªposição, tristemente ocupada pelo Brasil. Note que efetividade de um governo é uma forma de medir a hesitocracia (no caso, quanto mais efetivo, menos hesitocrático).

O início de 2024, treze anos depois do desastre de Fukushima na região nordeste do Japão, trouxe um castigo para a parte ocidental do país, notadamente na prefeitura de Ishikawa. Houve um tsunami, embora não tão intenso quanto o de 2011 que inundou 100 hectares na região, segundo informa o canal público de notícias, NHK. Enquanto esta coluna é escrita, o número de vítimas ainda não teve sua contagem encerrada e 33 mil pessoas estão em centros de evacuação.

É justo dizer que terremotos acima do nível 6 na escala japonesa são desafios brutais para qualquer administração pública (o de 2011 e este recente foram classificados, respectivamente, com níveis 9 e 7) e por mais que se tenham comitês para previsão de terremotos e atualizações de procedimentos para minimizar danos, nem o governo menos hesitocrático do mundo escapará sem vítimas de desastres naturais como estes.

Ainda assim, a sociedade japonesa avançou bastante em alguns procedimentos para minimizar os danos destes desastres incentivando a sociedade a ser mais proativa em situações de emergência e promovendo acordos com o setor privado para ganhar agilidade na resposta às necessidades dos atingidos. Como dito acima, a proatividade dos indivíduos foi tema do último Godzilla, o que nos diz algo sobre a importância deste tema para os japoneses.

É famoso o vídeo em que um trecho de uma estrada japonesa com um imenso buraco causado por um terremoto é reparado em menos de uma semana. O governo japonês conseguiu ser bem ágil neste aspecto, com uso intensivo de tecnologia. Trata-se do sistema InfraDoctor (abreviatura de Infrastructure Doctor ) que envolve mapeamento digital, georreferenciamento e escaneamento a laser. O sistema foi desenvolvido por uma empresa privatizada em 2005, a Shutoko.

Apesar da preocupante situação fiscal do país, o governo japonês ainda é um dos mais eficazes do mundo. O uso de parcerias público-privadas ou o emprego de tecnologias não são aspectos distintivos: vários governos adotam estes princípios. Mais interessante é olhar para situações específicas como a manutenção de estradas ou a atuação governamental diante de terremotos ou tsunamis. Quando o terremoto do dia 01 de janeiro aconteceu, o canal público NHK, passou horas e horas repetindo o alerta e noticiando o fato. Não há muita tecnologia nisto, há?

Esta é a época do ano em que observamos, em algumas cidades brasileiras, deslizamentos de terra causados pelas chuvas. Não me lembro de ver os canais públicos - e eles são tantos no Brasil… - noticiarem fatos como estes, nem de alertarem a população na mesma intensidade. Também não vejo, por aqui, uma ágil manutenção de calçadas, ruas ou estradas. Ouço falar de inovação no governo, de incubadoras governamentais, mas o fato é que, como vimos, nosso governo é bem pouco ágil, apesar de onipresente na vida dos cidadãos.

O ano de 2024 é o ano do dragão no horóscopo sino-nipônico. É um ano no qual, pela crença, espera-se muitas mudanças, boas ou não. Bem poderíamos ter mudanças que tornassem o governo brasileiro menos hesitocrático…

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