Lula e o peso do Estado
Excelente editorial do Estado de SP de hoje: “O presidente Lula voltou a defender a carga tributária imposta aos brasileiros, indispensável, segundo ele, para a manutenção de um Estado forte. A tributação brasileira é apontada em todas as comparações internacionais como grave desvantagem para o País, porque onera a produção, esfola o consumidor, torna as empresas menos competitivas e dificulta a criação de empregos. Mas para o presidente os impostos […] Leia mais
Publicado em 25 de dezembro de 2009 às, 00h17.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 12h34.
Excelente editorial do Estado de SP de hoje:
“O presidente Lula voltou a defender a carga tributária imposta aos brasileiros, indispensável, segundo ele, para a manutenção de um Estado forte. A tributação brasileira é apontada em todas as comparações internacionais como grave desvantagem para o País, porque onera a produção, esfola o consumidor, torna as empresas menos competitivas e dificulta a criação de empregos. Mas para o presidente os impostos e contribuições pagos no Brasil são razoáveis e adequados a um Estado “capaz de fazer alguma coisa”. “Vou deixar claro para vocês: não imaginem um país com carga tributária fraca”, disse ele a exportadores num encontro no Rio de Janeiro, na terça-feira. Horas depois, o Congresso aprovou uma lei orçamentária com novas bondades para o funcionalismo, novo aumento do Bolsa-Família, generosas emendas paroquiais – como sempre – e um acréscimo de R$ 7,3 bilhões à verba de R$ 22,5 bilhões prevista inicialmente para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Um dia antes do encontro com os exportadores, o presidente havia falado sobre a possível conversão de alguns incentivos setoriais em benefícios permanentes. Esses incentivos foram concedidos como parte da política antirrecessiva. Mas o governo não considera, como ficou claro no discurso de terça-feira, a hipótese de uma desoneração mais ampla e organizada, recomendada pelos especialistas em competitividade. Isto dá uma primeira ideia da equivocada concepção de Estado “forte” do presidente Lula. Um Estado não pode ser forte quando impõe à economia uma tributação irracional e restringe a expansão produtiva, a exportação e a criação de oportunidades.
O presidente confunde gordura e peso com força. A tributação brasileira equivaleu a cerca de 36% do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro semestre, apesar dos incentivos fiscais e da perda de arrecadação causada pela crise. Mesmo na recessão, o setor público arrecadou muito mais, proporcionalmente, do que a carga tributária dos demais países emergentes.
Essa tributação não se traduz em melhor educação e em serviços melhores que os de países com impostos mais leves. Cerca de 20% dos brasileiros com idade igual ou superior a 15 anos são analfabetos funcionais, isto é, incapazes de ler e entender uma mensagem ou uma instrução simples. Isso é apenas mais uma amostra de como os brasileiros pagam caro para receber muito pouco do setor público em serviços de educação, saúde, segurança e justiça.
Apesar da notória improdutividade do governo brasileiro, o gasto federal com a folha de pessoal aumentou 49% em sete anos, contados a partir do primeiro semestre de 2002. Esse foi um aumento real, isto é, acima da inflação. “Não faremos arrocho salarial”, disse o presidente Lula na segunda-feira, rejeitando a ideia de fixar para 2010 um objetivo fiscal superior a 3,3% de superávit primário. Essa meta mais ambiciosa poderia compensar o afrouxamento de 2009 e conter o endividamento público. Mas o presidente causaria enorme surpresa se aceitasse uma política mais austera, especialmente em ano de eleições. Quanto à palavra “arrocho”, foi certamente usada de forma imprópria, depois dos aumentos acumulados em vários anos. Esses aumentos foram concedidos abertamente ou embutidos em “reestruturações” nunca traduzidas em melhores serviços.
O próximo ano, disse também o presidente, será um período de investimentos liderados pelo setor público. Daí seu interesse em reforçar financeiramente os programas de obras. Mas investimentos governamentais não dependem apenas de palavras. Competência para elaborar projetos e para executá-los é um requisito indispensável. Essa competência não tem sido exibida pelo governo nem pela mãe do PAC, a ministra Dilma Rousseff. Neste ano, até 22 de dezembro, o Tesouro desembolsou apenas 53,7% do valor previsto para investimentos do governo federal, incluído o chamado PAC orçamentário. Esses desembolsos incluem restos a pagar de exercícios anteriores.
Só com muito otimismo se pode esperar para o próximo ano maior competência na execução das funções públicas federais. Mas pode-se apostar na manutenção – se não no aumento – da escorchante carga tributária, útil para manter o empreguismo e a ineficiente máquina estatal. Uma carga imensamente desproporcional, enfim, aos serviços oferecidos aos esfolados contribuintes.”