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Infraestrutura escolar ficará a cargo das PPPs, afirma Edgard Benozatti

Instituto Millenium entrevista Diretor-Presidente da Companhia Paulista de Parcerias (CPP)

Escola: Instituto Millenium entrevista Diretor-Presidente da Companhia Paulista de Parcerias (CPP) (Business Finland /Getty Images)
Escola: Instituto Millenium entrevista Diretor-Presidente da Companhia Paulista de Parcerias (CPP) (Business Finland /Getty Images)

O Instituto Millenium entrevistou Edgard Benozatti, Diretor-Presidente da Companhia Paulista de Parcerias (CPP), entidade responsável pela condução de estudos e projetos de Parceria Público-Privada (PPP) no governo do estado de São Paulo. Em pauta, o novo projeto de PPP para a construção e manutenção de 33 escolas públicas, um investimento de R$ 1,6 bilhão que promete criar 34.840 vagas na rede estadual de ensino. 

O projeto está dividido em dois lotes: o Lote Oeste, com leilão marcado para 25 de setembro, inclui 17 unidades de ensino, 462 salas de aula e 17.160 vagas em municípios como Araras, Campinas e Ribeirão Preto. O Lote Leste, com leilão previsto para 3 de outubro, abrange 16 unidades, 476 salas de aula e 17.680 vagas em cidades como Guarulhos, Sorocaba e São José dos Campos. Benozatti detalha como a iniciativa privada será responsável pela infraestrutura e manutenção, enquanto a Secretaria da Educação cuidará do ensino. 

Nesta entrevista exclusiva, Benozatti discute as expectativas de impacto positivo na eficiência administrativa e na qualidade da educação, além das lições aprendidas de PPPs anteriores. Convidamos nossos leitores a explorar esta conversa para entender como as PPPs podem transformar a educação em São Paulo e proporcionar um ambiente mais propício para o aprendizado dos alunos. 

Instituto Millenium: Para começar, poderia nos explicar em detalhes o projeto de parceria público-privada para a construção e manutenção de escolas públicas em São Paulo? Qual é a motivação e os principais objetivos dessa iniciativa? 

Edgard Benozatti: O objetivo do projeto Novas Escolas do Governo de São Paulo é a estruturação de duas parcerias público-privadas (PPP) destinadas à construção e operação de serviços não pedagógicos de 33 novas unidades escolares. Por serviços não pedagógicos estamos falando de toda a manutenção do prédio, limpeza, controle das utilidades (água, energia etc.), fornecimento de tecnologia, portaria, jardinagem, entre outros.  

A principal motivação é o diagnóstico de que hoje a diretoria da escola dedica enorme esforço de trabalho e tempo cuidando de cada um desses contratos de forma individual em detrimento às questões pedagógicas. É importante reforçar que atualmente a maioria desses serviços já são terceirizados pelo Poder Público.  

Então, o projeto visa, nessas novas escolas, tirar o fardo administrativo da direção escolar, de modo que eles possam focar no lado do ensino e, por consequência, melhorar o aprendizado dos alunos.   

IM: São Paulo já possui experiência com PPPs na área da saúde, onde a gestão administrativa de hospitais foi concedida a parceiros privados. Quais lições foram aprendidas dessa experiência e como elas estão sendo aplicadas neste novo projeto na educação? 

EB: A primeira grande lição que tivemos é do ponto de vista da política pública. O modelo de PPP “bata cinza”, em que a manutenção e os serviços de apoio são delegados à iniciativa privada, mas não a política pública finalística (que seria a “bata branca”, ou seja, área médica). Esse modelo é um sucesso inquestionável, pois ele alivia o fardo administrativo dos servidores públicos e permite o foco no que importa que é o cidadão. A segunda grande lição é que a iniciativa privada não é uma panaceia que irá resolver tudo. Para isso, é preciso um bom contrato, bem estruturado, com uma fiscalização forte e, preferencialmente, uma agência reguladora para cuidar que ambas as partes (público e privado) andem na linha em relação às suas obrigações. Quando essa junção de fatores acontece, o resultado é muito positivo. 

IM: Considerando a ampla rede estadual de ensino, qual será a escala inicial deste programa? Quantas escolas estão previstas para construção e quantos estudantes, em termos percentuais e absolutos, serão diretamente beneficiados? 

EB: Serão 33 escolas atendendo 34.840 alunos ano, sendo o Lote 1 – Oeste com 17 unidades e 17.160 vagas e o Lote 2 – Leste com 16 unidades e 17.680 vagas. É um número de escolas relativamente modesto em comparação com a rede total do Estado (cerca de 5.300 escolas), mas, ainda assim, se trata de um investimento de mais de R$ 2 bilhões que será majoritariamente executado nos próximos três anos. Metade dessas unidades escolares ficará pronta já em 2026, sem falar que em termos de CAPEX se trata da maior PPP educacional do Brasil. 

É importante frisar que o número de escolas veio em função da demanda necessária avaliada pela Secretaria de Educação, neste momento, mas o que pretendemos é criar um modelo que poderá ser replicado a qualquer momento pelo Estado, caso seja necessária uma expansão da rede escolar (ou substituição de ativos). Paralelamente, estamos trabalhando em outra PPP escolar que irá realizar algo muito similar em termos de escopo (transferência de serviços não pedagógicos para um parceiro privado), porém, com escolas existentes. Esse novo projeto terá uma escala um pouco maior. Teremos novidades a respeito em breve. 

IM: Uma vez assinados os contratos, quem será responsável pela administração e fiscalização desses acordos? A Secretaria de Educação está preparada para gerenciar essa nova demanda? E que tipo de empresas vocês esperam atrair com este modelo de PPP? 

EB: Os contratos serão fiscalizados pela Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo), sendo a Secretaria de Educação o poder concedente. Isso significa que o dia a dia da gestão contratual e a maioria das demandas ficarão com a autarquia, que é a especialista nesse tipo de contrato e tem um corpo técnico muito qualificado. Além disso, a agência deve se tornar ainda mais forte com a aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 35/2024 das agências, apresentado pelo Governo de São Paulo e enviado recentemente à Assembleia Legislativa (Alesp). 

É importante esclarecer que o contrato conta com certificadores independentes para a avaliação da execução das obras e verificadores independentes para a avaliação dos serviços prestados, subsidiando o acompanhamento da Arsesp. 

IM: Quais são as expectativas de impacto dessa medida? Em termos financeiros, o estado espera economizar? E em termos de resultados, como a qualidade da educação será melhorada com essa iniciativa? 

EB: O Estado espera ser muito mais eficiente. Como se trata de escolas que hoje não existem, é impossível se falar de redução de custo. Porém, temos a clareza que se essas escolas fossem construídas e, posteriormente operadas pelo Estado, seria mais caro e ineficiente. Isso sem mencionar a questão de prazo de entrega de obras que em PPPs tendem a ser muito mais respeitados do que em contratações diretas pelo ente público, e o alinhamento de incentivos de ter o construtor operando o ativo posteriormente, o que o leva a fazer a melhor construção possível para não ter que ficar gastando na manutenção depois. 

Em relação à qualidade da educação, ela irá melhorar a partir do momento em que houver a mudança da distribuição do tempo do diretor da escola, ou seja, se antes ele gastava a maior parte do seu tempo com questões administrativas, cuidando da zeladoria (compra e troca de lâmpadas, vazamentos, mobiliários e materiais, etc.), agora ele poderá dedicar esse tempo para a parte pedagógica, ou seja, com o ensino dos alunos, pois todo o resto vai estar resolvido.  

Além disso, teremos escolas novas, bem cuidadas e com equipamentos de ponta, o ambiente estará muito mais propício para o ensino e esperamos que essas unidades tenham impacto nos alunos, em toda a comunidade escolar e nos entornos das mesmas. 

IM: Considerando a experiência de outras cidades com parcerias público-privadas, como no caso das creches em Belo Horizonte, quais são as principais vantagens observadas em termos de eficiência de construção e gestão de riscos comparado aos métodos tradicionais de contratação? E como esses benefícios influenciam a alocação de tempo dos gestores escolares entre atividades administrativas e pedagógicas? 

EB: Ao se analisar o caso da PPP de Creches de Belo Horizonte, constatou-se que o tempo de construção no modelo de PPP foi cerca de 45% inferior à média observada pela rota da contratação tradicional. Além disso, o modelo de PPP propicia melhores incentivos à gestão dos riscos de interface, sobretudo ao centralizar as responsabilidades associadas aos serviços de operação e manutenção da infraestrutura afeta aos serviços educacionais por todo o ciclo de vida do contrato, ao passo que, na rota da contratação tradicional, seriam necessárias diversas licitações para a mesma finalidade e o risco de descasamento entre esses contratos seria, inevitavelmente, retido no Poder Público. 

Além disso, há que se considerar que a abordagem da PPP resulta em economia de tempo por parte dos gestores escolares na realização de tarefas administrativas e de gestão de atividades de cunho não-pedagógico, o que aumenta a disponibilidade de tempo a ser alocada em tarefas pedagógicas. Há registro de que os diretores se queixam de não dispor de tempo para atividades pedagógicas em função da necessidade de realização de tarefas burocráticas. No caso da PPP de Creches de BH, constatou-se que a assunção das tarefas relativas à gestão de infraestrutura e serviços não pedagógicos desonera quantidade significativa de tempo dos gestores dedicada a isso. Em análise comparativa, constatou-se, inclusive, que os gestores das unidades tradicionais somente conseguem alocar 56% de seu tempo em atividades de natureza pedagógica contra 70% nas unidades geridas no modelo de PPP.