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Indústria e exportação

A China oferece vantagens para as grandes corporações se instalarem em suas Zonas Econômicas Especiais, algo que não acontece no Brasil

Rota Bioceânica: saindo do Porto de Santos, em São Paulo, com destino ao polo portuário do norte do Chile (Germano Lüders/Exame)
Rota Bioceânica: saindo do Porto de Santos, em São Paulo, com destino ao polo portuário do norte do Chile (Germano Lüders/Exame)

Por Adilson Luiz Gonçalves*

Na China, as vantagens oferecidas para as grandes corporações se instalarem em suas Zonas Econômicas Especiais (ZEEs) rapidamente reverteram em seu favor, com vantagens econômicas e sociais também favorecendo o consumo interno. A Índia vem seguindo o mesmo caminho bem-sucedido, o que não ocorre com os outros três países que compõem o BRICS: Brasil, Rússia e África do Sul. 

Segundo a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), em 2022 a participação da indústria de transformação nas exportações mundiais desses países foi de: China, 18,21% (incluindo Hong Kong, 16,8%); Índia, 2,43%; Brasil, 1,05%; Rússia, 2,1%; e África do Sul, 0,5%. O Brasil está atrás do México, nas Américas. 

Desde 2023, tanto o governo federal, como o estadual paulista propõem a reindustrialização e neoindustrialização, com foco em exportações. Cá entre nós, ser competitivo no mercado internacional, com a legislação tributária do Brasil, poderia ser considerado o 13º trabalho de Hércules. 

É importante destacar que produtos associados à propriedade intelectual são itens de exportação de alto valor agregado, em razão dos “royalties” decorrentes de patentes. A China passou rapidamente da “engenharia reversa” da reprodução não-autorizada, para se tornar a maior produtora de patentes da atualidade. Para tanto, continua investindo na formação e qualificação de pessoas, dentro e fora do país, reconhecendo méritos, e em recursos para o desenvolvimento de pesquisas científicas. 

A Reforma Tributária em processo acena com incentivos à indústria, no entanto, a disputa sobre a desoneração da folha de pagamento permanece, Brasil dos paradoxos. A indústria de transformação, no âmbito das exportações, dispõe de alguns incentivos, como os da Zona Franca de Manaus e, de forma mais ampla, do “draw back” e das Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs). 

A China adotou o modelo de Zonas Econômicas Especiais (ZEEs), similar ao de ZPEs, a partir do final da década de 1970, e hoje tem mais de 2.500, a maioria próxima a portos e aeroportos, com resultados extremamente positivos no desenvolvimento tecnológico e científico daquele país. A revisão do marco legal de ZPEs, de 2021, acrescentou importantes e necessárias alterações. 

Uma ZPE agora pode ser instalada em terrenos diferentes, desde que distem entre si de, no máximo, 30 km. Não há mais restrição quanto à exportação, ou seja, a produção pode ser totalmente direcionada ao mercado interno, mantida a regra geral. A proximidade de portos e aeroportos passou a ser explicitamente considerada como trunfo logístico. Outra novidade foi a possibilidade de uma ZPE ser autorizada a um ente privado. 

O que basicamente não mudou do marco legal anterior foi a burocracia. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) é protagonista no processo de industrialização/neoindustrialização do Brasil, também por ter em seu organograma o Conselho Nacional de Zonas de Processamento de Exportação (CZPE). O Ministério de Portos e Aeroportos (MPor) é evidentemente tão protagonista quanto o MDIC, o mesmo valendo para o Ministério dos Transportes, pois não há como dissociá-los. 

Por conta disso, entrei em contato com o MPor e com a Infra S.A., responsável pela elaboração dos Planos Mestres portuários e do Plano Nacional de Logística – 2035 (PNL), sugerindo que as revisões desses planos também incluam a análise de portos e aeroportos com potencial para a instalação de ZPEs em suas imediações, prospectando a tipologia de indústria mais adequada a ser nelas implantada. 

Já com relação ao CZPE, a sugestão foi o passo seguinte, ou seja, de posse do PNL 2035 assim elaborado, passar da condição de receptor de propostas, para a de fomentador. Explico: Uma vez tendo a definição de “locus” ideal para novas ZPEs, incluindo a tipologia de cargas a ser produzida em suas instalações, o CZPE poderia fazer Chamamentos Públicos, identificando interessados públicos e privados. Isso não impede que eventuais interessados procurem o CZPE, para obter informações. A reindustrialização não precisa nem pode ser “mais do mesmo”: é preciso diversificar e inovar! 

Seria o caso de um novo processo de substituição de importações, como ocorrido na época da Segunda Guerra Mundial? Bem, se vier associado à transferência de tecnologia, pode ser. A China fez isso, com suas ZEEs. Nossas Forças Armadas têm buscado esse tipo de solução, em parceria com empresas privadas nacionais e estrangeiras. Quais os nichos de mercado que o Brasil poderia concorrer e com quais produtos? Uma opção seria atrair empresas que produzem em ZEEs, para nossas ZPEs, incluindo produtos atualmente importados da China, que possam ser competitivos, no âmbito do Hemisfério Sul e Américas. 

Iniciativas de P&D podem gerar novos produtos, novas patentes e industrialização. Para tanto, também é preciso robustecer nosso sistema educacional e estimular atividades produtivas, geradoras de empregos. O desenvolvimento econômico é diretamente proporcional à redução do risco de tensões sociais, e o progresso é muito mais efetivo, nesse sentido, do que o progressismo proselitista. 

* Escritor, Engenheiro, Pesquisador Universitário e membro da Academia Santista de Letras