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Governo, igualdade e mobilidade econômica

"Elemento central da incapacidade estatal é o governo centralizado, não federativo", afirma o leitor Carlos A. Cinquetti

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Instituto Millenium

Publicado em 27 de novembro de 2018 às, 11h13.

* Por Carlos A. Cinquetti

Três traços marcantes do subdesenvolvimento no Brasil são alta desigualdade, baixa mobilidade econômica e Estado inoperante. Se olharmos para esses traços como condições, a conclusão é que desenvolvimento persistente supõe mais incentivos privados à mobilidade econômica, mais igualdade e um Estado operante para garantir ambas.

Examinemos melhor cada uma destas condições. Um elemento central da incapacidade estatal é o governo centralizado, não federativo. Nosso DNA colonial. Não fomos estruturados a partir de baixo, criando nossos espaços públicos a partir de municípios e Estados fortes. O último movimento Federalista, de 1932, foi esmagado por um ditador, quem implementou um Governo ultra centralizado e intensificou o protecionismo, aliando elites econômicas com elites políticas atrasadas.

Outro problema é o Estado patrimonialista: políticos e funcionalismo que o tratam como seu. Sob tal estrutura, democracia tende à políticas clientelistas, a qual é reforçada por pobreza e fragmentação étnica. Trata-se de dar emprego público, ou rendas a determinados grupos de eleitores, à expensa de investimentos em bens públicos de amplo alcance. Economicamente ineficiente, o clientelismo é motivado por rendas políticas. Traz votos, como prova o fome zero (com saneamento, escolaridade e segurança zero).

Quanto à desigualdade, a causa mais lembrada é a educação, onde já aparece o papel do Estado. O governo brasileiro ergueu grandes universidades, mas foi sofrível com o ensino primário e secundário de qualidade a todos brasileiros. Uma das razões está fora das escolas: ausência de saneamento básico prejudica de diversas maneiras o progresso na educação. Desigualdade econômica é também explicada por transportes e capacidade legal. Pobres são os que moram em regiões sem boas ruas e estradas, o que evita densidade econômica, assim como os que vivem expostos ao achaque de grupos criminosos, ou de poderosos dos sertões deste país.

Os bens públicos “educação, estradas e segurança” definem capacidade econômica social. O acesso mais amplo a essas dotações produtivas amplia a igualdade econômica e, com ela, o potencial produtivo da economia. Mas têm custos altos, daí que a forte pressão por eficiência. Como são bens públicos locais ou regionais, competem à governos municipais e estaduais. O contrário, oferta destes bens pelo Governo Federal, ou a partir de seus recursos, distante dos contribuintes abriu enorme espaço para corrupção.

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Quanto à baixa mobilidade econômica, sua origem mais remota é a colonização. A par da extorsão inter-étnica (escravização dos Africanos e expropriação dos indígenas), a colonização apoiou-se no monopólio da corte, que barrou acesso competitivo à terra e aos negócios. E assim prosseguimos após independência. Com governos autoritários que resguardavam as oportunidades de negócios para poucos, em nome dos interesses nacionais. A mesma lógica para montagem de empresas Estatais, cujo comando dá aos governantes poder extra de extrair rendas políticas.

Baixa mobilidade assenta-se tanto em processos seletivos não impessoais (competitivos), quanto num ambiente regulatório que não é ágil, nem seguro. São adversidades institucionais à ação empreendedora, que barram a ascensão dos de baixo e o impulso geral aos investimentos. A base destas adversidades. Mas é politicamente custoso enfrentar estas adversidades, ancoradas em privilégios de agentes públicos e de empresas. Já as políticas redistributivas clientelísticas, miram nas rendas e não nestas adversidades aos investidores que minam mobilidade econômica.

Desde o Diretas Já reforçamos os poderes de políticos, juízes e funcionalismo, mantivemos o governo centralizado e ficamos atrás na liberalização econômica mundial. A resultante queda nos investimentos foi maior no setor público, por conta das crescentes políticas clientelistas. Justo quando o mundo foi se liberalizando, tornando maior o peso de um país grande e heterogêneo. A razão desta infeliz história é que o Ancien Regime(partidos da ordem, sindicalistas e empresários de setores protegidos, etc.) liderou a redemocratização e nos governa até hoje. Lava Jato os atingiu duramente e expôs a extorsão patrimonialista em nossas empresas estatais.

Teoricamente a solução é simples. Normas menos adversas aos investidores trariam mais mobilidade econômica e investimentos. Governos mais próximos e menos abertos ao clientelismo trariam, por sua vez, mais investimento públicos em capacidade social, reduzindo desigualdades.

Noutra perspectiva, exclusividades econômicas, assim como governo centralizador com agentes superpoderosos não trazem nem igualdade nem mobilidade. Pelo contrário. Mas se os criamos e mantemos por acreditar que trocas não é um arranjo concebido e executado por agentes racionais, mas sim um produto anárquico e extorsivo do Capital, então não estamos preparados nem para a sociedade livre, nem para o desenvolvimento.

* Professor do Departamento de economia da UNESP. PhD (New School, NYC) e professor visitante nas Universidades do Colorado e Ottawa. 

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